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Carlos Fraga

Jornalista e mestre em Educação

7 artigos

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Por uma frente ampla humanitária e um gabinete de crise paralelo

Fica evidente que, para proteger o povo das atrocidades impostas pelas oligarquias, responsável pela eleição de Bolsonaro e por sua manutenção no poder, o campo democrático e humanista da sociedade precisa abandonar a ilusão de que, deste governo, ainda poderá vir alguma medida racional e minimamente solidária para conter o avanço da pandemia. Não podemos mais insistir apenas na estratégia reivindicatória

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Por Carlos Fraga

É desnecessário listar os exemplos, farta e diariamente retratados nas mídias do País, de que o governo Bolsonaro atua, de forma planejada, para boicotar o combate ao novo coronavírus, contribuindo efetivamente para a dimensão épica da tragédia humanitária que vem atingindo o povo brasileiro.

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A perpetuação da pandemia e de suas consequências constitui um dos pilares de sustentação do atual governo e do seu projeto de reeleição. O caos em que o presidente mergulhou o País é utilizado como desculpa para todas as mazelas vividas pelo povo brasileiro. A fome, a miséria, o desemprego, a recessão, a inflação, a falta de condições básicas de saúde, a falta de investimento em infraestrutura, tudo isso é colocado na conta da crise sanitária por Bolsonaro, que tenta, assim, diante de seus seguidores fiéis, se eximir das responsabilidades e esconder que é um governo voltado para os interesses do grande capital financeiro e do imperialismo estadunidense. O presidente minimiza a pandemia exatamente para torná-la ainda mais grave.  

Além disso, a pandemia mantém nos espaços privados ou em pequenos espaços coletivos os setores progressistas e conscientes de sua gravidade e da importância do isolamento social, impedindo um movimento popular de oposição intenso, com grandes manifestações de rua, greves, desobediência civil.  Esse “encarceramento” das oposições tem garantido a Bolsonaro certo controle das instituições, sobretudo do Congresso Nacional e de algumas instâncias da Justiça e do Ministério Público.  

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A outra viga de sustentação de Bolsonaro, personificada em Paulo Guedes, é composta por todas as ações que vêm favorecendo o grande capital nacional e internacional e suas corporações, sobretudo o capital financeiro, mantendo o mercado dócil ao governo. 

Frente humanitária e gabinete de crise paralelo

Dito isso, fica evidente que, para proteger o povo das atrocidades impostas pelas oligarquias, responsáveis pela eleição de Bolsonaro e por sua manutenção no poder, o campo democrático e humanista da sociedade precisa abandonar a ilusão de que, deste governo, ainda poderá vir alguma medida racional e minimamente solidária para conter o avanço da pandemia.  Não podemos mais insistir apenas na estratégia reivindicatória.

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A reunião desta quarta-feira, 24/03, com chefes dos outros poderes e sete governadores alinhados com a política negacionista de Bolsonaro não passa de um embuste que visa apenas a diminuir a pressão sobre o governo no momento mais grave da pandemia e de colapso no sistema de saúde do País. A baixa representatividade de governadores e a declaração do próprio Bolsonaro após o encontro, reforçando o que ele chama de “tratamento precoce”, estratégia condenada pelos cientistas, e não dizendo uma palavra sobre a necessidade de lockdown, revela que não serão tomadas as medidas necessárias e urgentes para combater a pandemia.  Trata-se apenas de mais uma farsa desse governo para evitar o isolamento completo do presidente.

Nem mesmo o aumento do número de vacinas, caso venha a ocorrer agora, - sem o fechamento das cidades, com a manutenção apenas dos serviços essenciais por determinado período, e de uma ampla campanha de conscientização acompanhada de um auxílio emergencial minimamente digno - será suficiente para conter a transmissibilidade da doença e as possíveis mutações para versões mais perigosas e letais do vírus. 

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A urgência dramática da adoção de medidas concretas e coordenadas nacionalmente não permite a espera pelas eleições de 2022.  É para já a formação de uma Frente Ampla Humanitária e de um Gabinete de Crise Paralelo a fim de adotar duas linhas de ação com a mesma intensidade e premência:  a) exigir, por todos os canais jurídicos e políticos possíveis, a imediata interdição de Bolsonaro por sua flagrante atuação planejada e deliberada, com provas em profusão expostas diariamente na grande mídia, para manter e ampliar a calamidade humanitária, sem precedentes na História sanitária do País, provocada pela pandemia do novo coronavírus. Entre as alternativas, estão o impeachment por crime de responsabilidade, o julgamento pelo STF por crime comum (art. 86 da CF 88) e o oferecimento de denúncia por crime contra a saúde pública (art. 297 da CF 88); b) elaborar um plano de ação que seja capaz de implantar em todo o País todas as medidas necessárias para salvar a população.

Em 1990, após a eleição de Collor, o PT instituiu um governo paralelo para mostrar à população que medidas tomaria em cada caso concreto da vida nacional. Pretendia demonstrar ainda que, além empunhar bandeiras políticas e sociais, também era capaz de apresentar soluções efetivas para os problemas do País e que, portanto, tinha plenas condições de governar.

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No caso atual, o Gabinete de Crise Paralelo, mais do que mostrar condições de liderar um hipotético futuro governo, teria a tarefa de reunir as forças vivas do País, nas diversas instâncias do Estado e da sociedade civil, para salvar o povo da morte com ações concretas e imediatas. A formação desse gabinete de crise, uma das medidas que Lula, em seu recente discurso, disse que tomaria caso fosse o atual presidente do País, não deve e não pode esperar por uma eventual eleição dele próprio ou de um nome progressista em 2022. É tarefa para ontem! É preciso interromper já o processo de transformação do Brasil em celeiro de mutações do novo coronavírus.

O Gabinete de Crise formado pela Frente Ampla Humanitária deve reunir todos os governadores e prefeitos, a começar pelos que vêm tentando encontrar alternativas de controle da pandemia e se posicionando a favor da vida, deputados, senadores, vereadores, além de nomes de grande expressão entre cientistas, pesquisadores, infectologistas, médicos, enfermeiros, intelectuais, ativistas, influenciadores digitais, artistas, lideranças políticas, partidos, organizações da sociedade civil como OAB, CNBB, ABI, SBPC, Comissão Arns, ABJD, movimentos negros, de mulheres, LGBTQI +, centrais sindicais, associações, líderes de todas as religiões, organizações internacionais (científicas, de direitos humanos etc.). Enfim, todos e todas que estejam dispostos a salvar o Brasil desta tragédia.

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O Gabinete de Crise Paralelo deve não apenas mostrar o que faria caso estivesse no governo, mas fazer tudo o que este governo não está fazendo para garantir o controle da pandemia e a vida, se não em todos os estados da federação, pelo menos, na maioria deles. Essas ações devem ser estruturadas sob uma unidade e uma racionalidade nacional.

O plano de ação deve conter medidas urgentes e de grande alcance, tais como: a) a partir das condições financeiras de cada ente federativo integrante do Gabinete de Crise Paralelo e de contribuições internacionais, formar um fundo de combate à pandemia que seja capaz de fornecer auxílio emergencial de cerca de R$600,00 para as populações de baixa renda até o fim ou o controle completo da crise; auxílio às micro e pequenas empresas para que não quebrem durante esse período; material e insumo hospitalar, medicamentos, oxigênio, kit intubação etc. para a rede pública dos estados e municípios; b) a partir das orientações dos especialistas em saúde pública (sanitaristas, infectologistas, epidemiologistas etc.), decretar lockdown total nos estados e cidades-membro pelo tempo que for necessário; c) a exemplo do que o ex-presidente Lula já começou a fazer, realizar uma campanha internacional para a compra imediata de vacinas suficientes para imunizar toda população no menor espaço de tempo possível, com gestões junto a países diversos, a órgãos como ONU, OMS, OEA e a fóruns como G20, G8, BRICS etc.; d) de posse dos imunizantes, elaborar e implementar um criterioso calendário de vacinação que corresponda à capacidade logística já existente no SUS, que permite a aplicação de cerca de três milhões de doses diárias;  e) com a ajuda dos melhores nomes da publicidade e de artistas e o apoio de órgãos de comunicação de massa, elaborar e difundir uma grande campanha de conscientização sobre a gravidade da situação, sobre o estrago já feito, sobre como esse estrago pode ser ainda muito pior se não forem tomadas as medidas corretas, baseadas na ciência, e sobre a importância do lockdown, do afastamento social e de outras medidas preventivas.

O papel de Lula

Os poucos dias que se sucedem ao resgate do direito a se candidatar em 2022 pelo ex-presidente Lula têm sacudido o ambiente político e social com uma intensidade inédita desde o golpe contra Dilma, em 2016.  Até então, vivíamos em uma areia movediça em que nos afundávamos cada vez mais sem que pudéssemos avistar um fio de esperança. A esquerda fora interditada pela mídia hegemônica e isolada pela pandemia, e o povo assistia, à beira do abismo pandêmico, de forma passiva, à disputa para ver qual facção das oligarquias ficará com a maior fatia dos recursos públicos, das instituições do Estado, de suas empresas lucrativas e estratégicas para a soberania nacional e obterá mais vantagens da eliminação de direitos sociais e políticos que haviam sido conquistados em décadas de muita luta.

O retorno de Lula ao jogo político representa a corda salvadora a nos tirar da areia movediça não porque o ex-presidente seja um salvador da pátria, mas porque ele, na atual correlação de forças e no contexto de crise extrema, é a materialização da força popular para mudar o atual estado de coisas. É por meio de Lula, do que ele representa e simboliza, das forças que é capaz de aglutinar, do que ele já realizou em seus governos, por menor que tenha sido o alcance de suas políticas em face do que era possível realizar, que o povo, diante de tantas limitações impostas pelo Estado opressor, consegue se expressar, se manifestar, canalizar sua energia e esperança em direção à retomada da democracia, das conquistas históricas dos trabalhadores e do direito fundamental à vida nessa guerra contra o novo coronavírus. 

Por isso, com um único discurso, Lula é capaz de provocar um tsunami na política, pânico em seus adversários, nas oligarquias predatórias e golpistas. Quando Lula fala é como se o povo inteiro estivesse falando, é como se todo o povo sofrido, humilhado, explorado estivesse sintetizado nele. E os poderosos têm medo de povo. Ainda mais do povo de posse de uma arma política. Lula, hoje, é essa arma política. E essa arma será mais poderosa ainda se o povo puder exercer seu direito ao voto livre.

Além de encarnar a única chance de vencermos, a curto prazo, a barbárie, aglutinando grande parte das forças democráticas e progressistas com vistas às próximas eleições, Lula talvez seja a única liderança em condições de promover a articulação de uma Frente Ampla Humanitária e de um Gabinete de Crise Paralelo, com vistas a ações concretas e imediatas capazes de salvar o povo do projeto devastador do governo Bolsonaro. 

É necessário e urgente ocupar, não o vazio de poder, mas o vazio premeditado de ações a favor do povo e da vida que o poder de Bolsonaro criou para mergulhar o País no caos como única forma de se manter no poder. A frente e o gabinete paralelo seriam um desdobramento natural do que Lula já vem fazendo desde janeiro, quando ajudou decisivamente a viabilizar a compra de 30 milhões de doses da vacina Sputnik V, da Rússia, e a vinda dos insumos necessários à fabricação da chinesa Coronavac para os estados do Nordeste e, quando, em entrevista a órgãos de imprensa internacionais, faz o chamamento para que lideranças mundiais, como Biden, Putin e Macron, convoquem uma reunião do G 20 tendo como única pauta a busca de soluções para a produção e distribuição imediata de vacinas contra a covid-19 para o mundo todo, em particular para os países pobres e os que enfrentam escassez de imunizantes pela falta de recursos ou pela irresponsabilidade de seus governantes. 

Lula, no entanto, não precisa ser o gestor deste gabinete, que pode ser liderado por uma comissão de governadores e epidemiologistas, tendo à frente, como porta-voz, qualquer outro nome de expressão no cenário nacional. Neste momento, há que se dividir o protagonismo, sem perda de foco. É hora de unir forças, de cada um assumir a sua responsabilidade, de contribuir com o que pode, sob uma coordenação nacional, com papéis bem definidos.

O importante e inadiável é a formação dessa Frente Ampla Humanitária e do Gabinete de Crise Paralelo para salvar o povo da morte, seja pelo novo coronavírus seja pela fome! 

Se bem-sucedido, o Gabinete de Crise Paralelo, além de controlar a pandemia, provocaria também o esvaziamento completo do governo Bolsonaro, salvando o povo dele também. 

Mas para entendermos melhor as condições para a formação dessa frente, é preciso levarmos em conta o cenário político-jurídico em que estamos.

No âmbito da opinião pública, a reação autoritária de Bolsonaro às manifestações, individuais e coletivas, que lhe têm atribuído a qualidade de genocida revela duas coisas: a) ao se incomodar tanto com a pecha, acaba vestindo a carapuça e reforçando, na população, a percepção que pretende coibir; b) seu governo está entrando em um beco sem saída, perdendo aliados, popularidade e prestes a se transformar em uma unanimidade negativa, tirando os cerca de 20% de apoiadores fanáticos e fundamentalistas. As prisões e tentativas de enquadramento na Lei de Segurança Nacional de manifestantes e personalidades são comparáveis ao ataque de um rato quando se vê encurralado e não tem mais para onde fugir. Em situações assim, um rato pode até conseguir avançar e morder uns dois ou três, mas nunca atingirá todos que o cercam e acabará sendo pego.

Retomada da democracia e combate efetivo à pandemia

No âmbito institucional, no entanto, Bolsonaro ainda tem balas no cartucho que podem lhe render alguma sobrevida. A que atendia pelo nome de Kássio Nunes Marques foi queimada na sessão da 2ª Turma do STF que declarou a parcialidade de Moro no processo do triplex contra Lula. Marques tentou dar a Bolsonaro, seu padrinho, uma arma contra a democracia ao apontá-la para Lula, que é a única liderança em condições reais de derrotar o projeto fascista nas eleições de 2022. Foi massacrado e humilhado por Gilmar Mendes e afundou-se na lama junto com seu chefe.

Outra bala de Bolsonaro é Fachin e a maioria do plenário do STF. Esta ainda está no cartucho e o tiro pode ser disparado em breve. Fachin não decidiu pela incompetência de Moro para julgar os processos contra Lula porque, de uma hora para outra, resolveu exercer o seu papel de garantidor da Constituição de 88.  Como até o mundo mineral sabe e já foi amplamente elucidado por diversos juristas, jornalistas e políticos do campo progressista, Fachin tentou salvar a pele de Moro e dos procuradores da quadrilha chamada Lava Jato, não só do ponto de vista moral como também do ponto de vista jurídico. 

A suspeição de um juiz, não admitida por ele, mas confirmada pela Suprema Corte, caracteriza diversos crimes e produz consequências jurídicas muito mais graves do que o reconhecimento de sua incompetência como juiz natural de uma causa. E, paralelamente, com sua artimanha politiqueira, Fachin tentou, no mínimo, impedir, na 2ª turma do STF, que Lula retornasse ao jogo político com todas as forças que lhe seriam conferidas pelo reconhecimento da parcialidade do ex-juiz.  A declaração da parcialidade caracteriza perseguição política, deixando muito mais evidente a inocência de Lula do que a mera incompetência da jurisdição.

Contudo, o cálculo político de Fachin vai ainda mais longe. Sabendo da óbvia reação da PGR por meio de um recurso que, de fato, acabou sendo apresentado, o ministro contava com o julgamento de sua decisão pelo pleno do STF, instância em que a sua decisão tem grandes chances de ser derrubada pelo histórico lavajatista da maioria dos ministros. A estratégia é muito semelhante à utilizada por Bolsonaro no caso das dívidas das igrejas. O presidente vetou o perdão das dívidas para não incorrer em improbidade administrativa, sabendo que o Congresso derrubaria o veto. E mais, Bolsonaro praticamente pediu aos deputados que o fizessem. Para completar o quadro, o grupo de lavajatistas do STF recebeu uma adesão surpreendente após os últimos acontecimentos na corte. Marco Aurélio de Mello, um crítico feroz de Moro e dos procuradores de Curitiba, deu um cavalo de pau e mudou seu discurso radicalmente. É, agora, um grande defensor do ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro. Em entrevistas recentes, chamou Moro de herói nacional.

Temos um quadro, portanto, de grande perigo para as forças democráticas e progressistas. O STF pode, a qualquer momento, derrubar a decisão de Fachin, revertendo a anulação do processo que envolve o sítio de Atibaia, já tramitado em 2ª instância. Assim, o ex-presidente Lula voltaria a ficar inelegível pela lei da ficha limpa, deixando a grande maioria do povo brasileiro sem a principal arma de que dispõe nesse quadrante da História para sair do caos em que se encontra, o voto livre. 

Com uma nova perda dos direitos políticos, Lula continuaria forte, em condições até de contribuir para eleger o próximo presidente, mas diminuiria sua capacidade para uma articulação da envergadura de uma Frente Ampla Humanitária e de um Gabinete de Crise Paralelo. 

Disso decorre a importância de percebermos a relação intrínseca entre a garantia do retorno da democracia, via manutenção dos direitos políticos de Lula, com o efetivo e urgente combate à pandemia. A cassação do direito de Lula concorrer nas próximas eleições presidenciais significa o enfraquecimento da esperança do povo e do papel decisivo que o ex-presidente pode desempenhar agora no enfrentamento à tragédia sanitária.

Lutar contra mais um golpe contra Lula, que se desenha novamente por meio da corrupção da Justiça, é também lutar pela democracia e pela vida do povo brasileiro. 

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