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Washington Araújo

Mestre em Cinema, psicanalista, jornalista e conferencista, é autor de 19 livros publicados em diversos países. Professor de Comunicação, Sociologia, Geopolítica e Ética, tem mais de duas décadas de experiência na Secretaria-Geral da Mesa do Senado Federal. Especialista em IA, redes sociais e cultura global, atua na reflexão crítica sobre políticas públicas e direitos humanos. Produz o Podcast 1844 no Spotify e edita o site palavrafilmada.com.

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Projeto de lei da devastação passa a boiada no meio ambiente e desacredita a COP30 em Belém

O povo brasileiro deve impedir esse retrocesso, garantindo um planeta onde a natureza e os povos originários sejam respeitados

Projeto de lei da devastação passa a boiada no meio ambiente e desacredita a COP30 em Belém (Foto: Márcio Ferreira/Agência Pará)

Em 27 de maio de 2025, Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, enfrentou humilhações na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal. Convidada para discutir unidades de conservação marítimas no Amapá e a rodovia BR-319, ela sofreu ataques misóginos que chocaram o país.

O senador Plínio Valério (PSDB) disse respeitá-la “como mulher, mas não como ministra”. Marcos Rogério (PL), presidente da comissão, mandou-a “se pôr no seu lugar” e cortou seu microfone.

Marina, com altivez, retrucou: “submissa eu não sou.” Apenas a senadora Eliziane Gama, do Partido Social Democrático (PSD), a defendeu. A ministra deixou a sessão, denunciando a violência política de gênero no Congresso Nacional.

Esse desrespeito reflete a hostilidade à agenda ambiental. Em 2020, Ricardo Salles, ex-ministro, sugeriu “passar a boiada”, propondo flexibilizar normas ambientais. O Executivo não consolidou esse retrocesso, mas o Legislativo agora ameaça avançar.

Em 21 de maio de 2025, o Senado aprovou, por 54 a 13, o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA). Conhecido como “PL da Devastação”, o texto segue para a Câmara dos Deputados.

Se aprovado, o PL facilitará empreendimentos de alto impacto, ameaçando a Amazônia, o Pantanal e povos indígenas. A credibilidade do Brasil globalmente, já abalada, pode sofrer um golpe irreversível, comprometendo acordos comerciais vitais.

Pontos polêmicos do PL da devastação - O PL 2.159/2021 apresenta cinco pontos nocivos. O primeiro é a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), permitindo autodeclaração para 90% dos empreendimentos, sem análise técnica, segundo Suely Araújo, ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

A LAC abrange barragens como as de Mariana e Brumadinho, aumentando riscos de desastres. O segundo ponto é a dispensa de licenciamento para atividades agropecuárias, incentivando o desmatamento na Amazônia, essencial para a regulação climática.

Terceiro, o PL inclui mineração de grande porte, revertendo decisão da Câmara dos Deputados. Isso eleva a poluição de rios, segundo o Instituto Socioambiental (ISA). Quarto, a Licença Ambiental Especial, proposta por Davi Alcolumbre, do União Brasil, acelera projetos “prioritários”.

Essa priorização política ignora impactos ambientais. Quinto, a ausência de proteção para terras indígenas não homologadas facilita invasões, ameaçando povos originários e violando tratados internacionais, como a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

Retrocesso ambiental e perdas econômicas - A aprovação do PL causará retrocessos graves. O desmatamento na Amazônia, reduzido 30% entre 2022 e 2024, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), pode disparar. Em 2024, 11.088 km² foram desmatados, como sete cidades de São Paulo.

Essa perda, um machado cortando o pulmão do planeta, compromete a meta de carbono zero até 2050. O Observatório do Clima alerta que a LAC aumenta riscos de desastres, custando R$ 200 bilhões anuais, segundo o Banco Mundial.

As queimadas no Pantanal, em 2024, consumiram 1,5 milhão de hectares, equivalente a Sergipe, segundo o Inpe. Como um dragão cuspindo fogo, liberaram 18 milhões de toneladas de CO₂, intensificando as mudanças climáticas.

A biodiversidade, com 20% das espécies globais, segundo o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), é um ativo da bioeconomia, gerando R$ 1,5 trilhão até 2030, conforme a Universidade de São Paulo (USP).

A agricultura familiar, produzindo 70% dos alimentos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), depende de ecossistemas preservados. A polinização, valendo R$ 43 bilhões anuais, é ameaçada pela perda de biodiversidade.

A mineração desregulada pode poluir rios, afetando 30 milhões de brasileiros dependentes das águas amazônicas, segundo o WWF. No comércio internacional, a preservação é crucial para manter acordos e atrair investimentos.

A União Europeia (UE) cancelou o acordo com o Mercado Comum do Sul (Mercosul) em 2019, avaliado em 18 bilhões de euros, devido ao desmatamento. O Brasil perdeu R$ 20 bilhões em exportações, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A Noruega reteve US$ 33 milhões do Fundo Amazônia em 2023 por falta de garantias. Desde 2008, o fundo, apoiado por Noruega, Alemanha e Dinamarca, injetou US$ 1,3 bilhão em preservação.

A aprovação do PL pode extinguir esses recursos. Alemanha e Dinamarca sinalizam cortes, comprometendo a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) em Belém, em 2025, e isolando o Brasil.

A economia verde gerou 2,5 milhões de empregos em 2024, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). O PL, priorizando lucros imediatos, ameaça esse potencial, sacrificando a prosperidade sustentável de longo prazo.

Um futuro em jogo - O PL 2.159/2021 ameaça a qualidade de vida global. As mudanças climáticas intensificam desastres. Em 2024, o Rio Grande do Sul sofreu enchentes catastróficas, com 170 mortes, 580 mil desabrigados e 2,3 milhões de afetados, segundo a Defesa Civil.

As chuvas inundaram 90% de Porto Alegre, destruindo 400 mil casas e causando R$ 30 bilhões em prejuízos. Como um tsunami engolindo o estado, as enchentes mostram a urgência de políticas ambientais robustas.

A perda de biodiversidade agrava a saúde pública, com 7 milhões de mortes anuais por poluição, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O PL pode intensificar esses impactos, comprometendo a saúde global.

Os povos indígenas enfrentam um genocídio silencioso. Entre 2019 e 2024, 305 lideranças foram assassinadas, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT). O PL, facilitando invasões, acelera esse extermínio, violando tratados internacionais.

O Brasil, com sua megadiversidade, é central na luta climática. Ceder ao “liberou geral” é sacrificar o futuro. A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) promete R$ 500 bilhões em investimentos, mas ignora prejuízos duradouros.

Marina Silva defende a economia sustentável. O desrespeito à ministra reflete a resistência a um Brasil líder em sustentabilidade. A escolha na Câmara dos Deputados definirá o legado do país: devastação ou prosperidade.

Não podemos ceder ao canto de sereia do curto prazo. A preservação é sobrevivência. O povo brasileiro deve impedir esse retrocesso, garantindo um planeta onde a natureza e os povos originários sejam respeitados.

O futuro do Brasil é um coral vivo: se protegido, pulsa com cores e vida; se negligenciado, branqueia e morre. Que a sabedoria nos guie a preservar esse tesouro, não a ganância que o destrói.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.