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Euler Costa

Professor e doutor em Políticas Públicas e Formação Humana na UERJ

13 artigos

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Proteção X Fome: o dilema diário imposto aos pobres nas favelas e periferias.

Essas pessoas tem sofrido uma tortura diária, imposta principalmente pelo governo federal, que tem se movimentado como um paquiderme para liberar um auxílio mínimo de R$ 600,00

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Para entender do que vamos falar, é importante se ter uma ideia do que é morar em favela, subúrbio, ou periferia, como é mais bem entendido. 

Não bastasse o dilema terrível a que tem sido imposto aos moradores das favelas na cidade do Rio, como a todos que vivem em áreas pobres e de maior vulnerabilidade, de se proteger do vírus ou morrer de fome, frente à inércia dos poderes públicos, que se movem como “montanhas no deserto”, e, que tem levado pessoas que precisam se proteger, mas que devido sua necessidade, tem ido às ruas desesperadamente, tentar buscar o “pão de cada dia”. 

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Essas pessoas tem sofrido uma tortura diária, imposta principalmente pelo governo federal, que tem se movimentado como um paquiderme para liberar um auxílio mínimo de R$ 600,00 para as pessoas em situação de insegurança alimentar (valor que não chega a cem bilhões de reais em três meses), enquanto agiu como um leão para proteger os bancos, liberando 1,2 bilhões do recolhimento compulsório, para garantir a tão fundamental “liquidez” que o mercado precisa, mesmo sabendo que os bancos estão longe de correr algum risco neste momento.

Isso para não falar na PEC 10/2020 (orçamento de guerra) que se aprovada pelo senado, promoverá a farra dos bois no sistema financeiro, já que permitirá ao governo federal comprar os famosos “títulos podres”, para salvar os bancos... Os bancos, sempre eles e suas famílias oligárquicas.

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Faria muito mais sentido se todo esse esforço e energia fosse gasto na proteção econômica e social dos mais vulneráveis, tanto as pessoas físicas como as jurídicas, pois são estes que realmente movem a economia. São as pequenas e micro-empresas as responsáveis por empregar a maioria da população. Segundo o SEBRAE( Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), as MPEs respondem por 52% das vagas de carteira assinada do país, isso sem contar os 8 milhões de MEIs ( Micro Empreendedor Individual), que são uma espécie de trabalhador informal, mas formalizado. 

Ou seja, as linhas de combate, aos efeitos da pandemia, na economia brasileira deveriam ser: Primeiro a garantir a segurança alimentar dos mais pobres e vulneráveis, algo que só através do Cadastro Único e, o Cadastro do Bolsa Família já garantiria atingir algo em torno de 40 milhões de imediato; em segundo lugar, garantir a sobrevivência das MPEs e MEIs e dos empregos por eles gerados, bem como dos trabalhadores informais que só são enxergados na estatística, para não aumentar o índice de desemprego na economia.

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Mas a equipe econômica do governo federal parece estar vivendo outra realidade. O presidente do Banco Central, que não por acaso, é o neto de Robreto Campos (ministro do Planejamento de Castelo Branco no primeiro mandato dos militares pós-golpe de 1964), de mesmo nome, tem dito que a saída para a economia do Brasil não é “imprimir dinheiro”, porque isso aumentaria o endividamento do país. Porém, acredito, que caso seu avô ainda fosse vivo, discordaria dele, pois era um liberal moderado e entre seus feitos na história brasileira, ajudou a criar a Petrobras e o BNDES, portanto não rechaçava a atuação do Estado na economia. 

Os 98 bilhões de reais destinados a ajudar os mais pobres que, diga-se de passagem, só teve seu benefício aumentado para R$ 600,00 pela ação conjunta dos parlamentares da esquerda, não representa 1,5% do PIB.  

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Como é de conhecimento público, as maiores economias capitalista do ocidente, já adotaram a intervenção do Estado na economia, para salvar vidas e a economia concomitantemente. Até porque, mortos não produzem nem compram. O keneysianismo tão combatido pelos neoliberais está na moda outra vez. 

Enquanto isso, aqui no Brasil, o presidente da república organiza carreatas com o lema no mínimo cínico: “O Brasil não pode parar”. Mas quem são as pessoas que participam destes atos? Nas poucas cidades aonde essas carreatas aconteceram, o que se viu foi uma elite em seus carros de luxo, bem protegidos pela distancia, tentando convencer que suas empresas devem voltar a funcionar. Mas o que eles mostraram foi outra coisa. Eles deixaram a burguesia nua em plena luz do dia, porque provaram da forma mais didática possível, que a riqueza não é produzida pelo capital, mais pelo trabalho. A elite e seus meios de produção, sem a exploração da força de trabalho, não são capazes de produzir riqueza. Marx estava certo! Daí as carreatas desesperadas. O que eles querem? Os braços, pernas e mentes dos trabalhadores para serem explorados e expostos ao vírus, garantindo sua riqueza, sem que se exponham ao risco.

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O povo pobre, negro, periférico e favelado é a principal massa de trabalhadores explorados por essa elite. Uma elite vendida e vira-lata, subalterna, entreguista e dependente. Uma gente que engole entreguismo e arrota patriotismo. Moralista sem moral. São imorais ao exigirem o sacrifício dos mais pobres, como disse o dono da rede de restaurantes Madero (Junior Durski), “mas o pais não pode parar porque vão morrer 5 ou 7 mil pessoas”. Outros fizeram coro como o empresário Roberto Justos – esse sobrenome nunca foi tão mal empregado – e o velho da Havan, que chegou a fazer um vídeo ameaçando demitir 22 mil empregados.

Pois é, na hora da guerra a elite brasileira mostrou sua cara, como na música do poeta Cazusa. E é uma cara feia e suja. Uma face horrenda da nossa sociedade escravista. Para eles, ainda estamos no século XIX e, seus escravos devem trabalhar, seja como for. Custe o que custar, desde que não sejam suas vidas e seu dinheiro.

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O que se viu até agora de socorro mais rápido e imediato aos mais vulneráveis, vem de redes de solidariedade que já existiam e, de outras tantas que estão surgindo, fruto de coletivos que já existiam e outros que estão surgindo, resultado da organização das próprias comunidades e da solidariedade dos pobres com eles mesmos.

Todas as esferas de governo devem agir de forma rápida e organizada. Por exemplo. Aqui na cidade do Rio as escolas públicas estão fechadas desde 16 de março. Passado quase um mês, nem o estado, nem as prefeituras, arrumaram uma forma de transferir o que economizam com a merenda, em alimento para as famílias destes alunos. A prefeitura do Rio de Janeiro possui mais de 650 mil alunos. E há todo o cadastro dessas famílias, o que possibilita uma ação rápida. Mas só no último domingo (12/04) a prefeitura do Rio começou a entregar cartões no valor de R$ 100,00 por família, o que deveria ser por aluno, uma vez que muitas famílias têm dois ou três alunos na rede. Eu fico imaginando como estão os alunos das prefeituras menores, de cidades mais pobres.

O mesmo não acontece no estado. Pois parece que não há pressa. A pressa é só de quem sente fome. E como você pede a quem sente forme para ficar em casa? Impossível. 

Uma boa ilustração da forma como tem sido conduzidas as políticas sociais em tempos de coronavírus, nos mostrou o secretário de educação do estado do Rio de Janeiro, que disse em uma live que, o governo Estadual não teria como pagar a ajuda de R$ 100,00 para todos os alunos, pois seria demasiado para os cofres do estado. Porém, o mesmo secretário informou que, em relação à EAD (Educação a distancia) implantada pelo próprio secretário, como ele mesmo reconhece a impossibilidade de que todos os alunos acessem a plataforma, adquirida junto à iniciativa privada pelo estado, ele havia conseguido a autorização do governador para a compra de “chips” de operadoras de celular, com pacotes de dados, neste caso, para “todos” os alunos da rede.

Ou seja, há prioridades para os governos. Mas a segurança alimentar dos mais pobres não é uma delas.

É verdade que existem estados e municípios no Brasil que já criaram formas de atender estas pessoas mais pobres. Vemos bons exemplos, principalmente nos estados e municípios do nordeste. Mas é imperativo que a questão da fome seja tratada com urgência por todas as esferas de governo, caso contrário será quase impossível que se consiga a quarentena necessária desta camada da população, que infelizmente voltou a crescer no Brasil a pós o golpe de 2016. 

Depois de ter saído do mapa da fome da ONU, o Brasil tem, segundo relatório do IBGE de 2018, mais de 50 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza (pessoas com renda menor que um dólar por dia). A concentração de renda que caia até 2015, voltou a crescer depois do golpe. Segundo o IBGE, enquanto a renda dos 10% mais ricos cresceu cerca de 4% em 2018, a renda dos 40% mais pobres caiu 1% no mesmo ano. E essa é a tendência. 

O que tem sido repetido como um mantra pelas autoridades mundiais é que a forma mais eficaz de combate ao vírus é o isolamento social e, a forma mais adequada para combater a crise econômica durante e pós-pandemia é a intervenção do Estado, injetando recursos na economia, comprometendo percentuais consideráveis do PIB, mesmo que para isso seja necessário aumentar o nível e endividamento do país. E vejam, essa receita antiga, é capitalista, do teórico orgânico do capital John Maynard Keynes, que provou a incapacidade do mercado de se auto-regular como ainda acreditam os neoliberais fanáticos.

Mas no Brasil, o povo das favelas e da periferia tem obstáculos maiores. Por um lado sofrem com orientações totalmente equivocadas, daqueles que buscam na fé, através de pastores, que atuam nessas comunidades, mas muitos deles oferecem curas, ignorando a ciência. E o que é pior, a ação predatória de grandes corporações e empreendimentos religiosos, que vendem aos seus fieis a ilusão de uma normalidade ou proteção divina

Junte a isso, os atos de um presidente irresponsável que aparece a todo o momento nas redes de TV, desrespeitando as orientações do ministério da saúde e de 99,99% de todos os especialistas do mundo, além da OMS, a qual o Brasil é signatário.

Além disso, essa população mais vulnerável, ainda enfrenta o cinismo de uma elite suja que tem a cara de pau fazer manifestações, na segurança dos seus carros de luxo, pedindo a volta dos trabalhadores, pois sabem que sem a exploração dos seus “escravos” não conseguem realizar seu tão precioso lucro. Some a isso, uma política economia tocada por um ministro da economia totalmente agarrado as suas ideias já ultrapassadas até mesmo para seus pares neoliberais, que protege com unhas e dentes o mercado financeiro, mas retarda ao máximo o socorro dos mais pobres e das micro e pequenas empresas que, como já dito, respondem por mais de 50% das vagas de emprego do país.

Infelizmente o prognóstico que fazemos não é nada animador. A seguir desta forma, veremos em um futuro quase imediato, a população que não trouxe o vírus para o país, ser a mais atingida e, aonde ocorrerão a maior quantidade de perdas humanas. A população das favelas e periferia tem vários inimigos piores que o próprio COVID-19. Eles enfrentam a desinformação; a doutrinação equivocada por ignorância ou interesses de corporações da fé; o descaso e abandono do Estado; o preconceito daqueles que os acham imunes a tudo pelo fato de já enfrentarem a miséria diária; a falta de estrutura sanitária que lhes é negada há décadas; a insegurança alimentar; e, neste momento em específico, um presidente que, ao menos em suas ações, demonstra total incapacidade e certo grau de insanidade para liderar o país nesta guerra; além de uma equipe econômica liderada pelo que há de mais atrasado e arcaico na visão do capitalismo atual.

A eles, restam a si próprios, que tem demonstrado um alto nível de organização interna, principalmente nos maiores complexos, além da solidariedade que, como sempre, vem principalmente dos pobres e da classe média baixa, do que de outros extratos da sociedade. 

Mas a rede de solidariedade vem crescendo e tem sido um efeito colateral muito bom desta pandemia. Se há algo de bom que podemos tirar e, provavelmente, será o que salvará mais vidas nesta guerra moderna, causada mais uma vez pelo modo de produção capitalista e, a forma pela qual nos impõe a vida, será a solidariedade, o pensamento coletivo, a quebra do paradigma capitalista do individualismo consumista. 

As pessoas começam a se ver não mais como um ser único, com suas prioridades e metas de vida a serem conquistadas, no ciclo nefasto que o capitalismo lhes impõe de: trabalhar – produzir - consumir, mas passam a se ver como muitos e, a entender que a única saída deste isolamento é mesmo assim, se estivermos todos juntos, ajudando uns aos outros de alguma forma. E a aqueles privilegiados como eu, nos cabe ajudar como pudermos, principalmente ficando em casa.

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