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André Leão

Pesquisador do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) e doutor em Ciência Política

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Quais são as consequências das sanções ao petróleo russo?

Sanções têm tido como consequência uma aproximação significativa dos países do BRICS+ no setor

Um modelo de bomba de extração de petróleo é visto em frente às bandeiras dos EUA e da Rússia, nesta ilustração tirada em 8 de outubro de 2023 (Foto: REUTERS/Dado Ruvic/Ilustração/Foto de Arquivo)

Em fevereiro de 2025, a União Europeia (UE) anunciou a imposição de sanções contra a Rússia pela 16ª vez. Esse movimento já tinha sido acompanhado pelo governo dos Estados Unidos (EUA), que, em janeiro - ainda sob a administração de Joe Biden - também intensificou as sanções. Embora o atual presidente dos EUA, Donald Trump, já tenha manifestado ceticismo em relação à aplicação desse tipo de medida, ele afirmou que pode seguir impondo sanções caso o presidente russo, Vladimir Putin, se recuse a negociar o processo de paz no conflito contra a Ucrânia. Ressalta-se que o objetivo das sanções é minar continuamente a capacidade russa de seguir financiando suas ações de guerra, exercendo pressão especialmente sobre o setor petrolífero. Diante desse cenário, é preciso analisar quais são os desdobramentos dessa empreitada no âmbito geopolítico.

Busca-se, com a imposição de sanções econômicas, limitar a renda advinda da atividade de exportação de petróleo e de seus produtos derivados. Até o momento, a Rússia tem contornado as sanções ao escoar a produção para países do Sul Global, sobretudo Brasil, Índia e China – integrantes do BRICS+, grupo de cooperação entre países de economias emergentes –, que têm absorvido grande parte do petróleo e do óleo diesel. Nesse sentido, o reforço das ações promovidas pela UE e pelos EUA pretende combater uma certa ineficácia na tentativa de estrangular as exportações russas de combustíveis fósseis. Por um lado, os pacotes de sanções alijam a presença russa na Europa e fortalecem a posição estadunidense no continente; por outro, também podem atentar para a necessidade de cooperação energética entre os aliados do BRICS+, culminando em um estreitamento ainda maior das relações e, consequentemente, em um contraponto à parceria entre UE e EUA.

Desde o fim de 2022, quando eclodiu a Guerra entre Ucrânia e Rússia, o bloco europeu já havia proibido a entrada de petróleo cru russo. A partir de fevereiro de 2023, os produtos derivados, como o diesel, também tiveram seu ingresso vetado na Europa. Em um movimento coordenado no âmbito do G7, a UE, em dezembro de 2024, e os EUA, em janeiro de 2025, escolheram como alvo das sanções os navios de petróleo e produtos derivados, tendo como meta o encarecimento dos custos logísticos e de transporte, bem como a manutenção do sistema de price cap, que estabelece um teto para os preços dos combustíveis russos. 

A restrição às exportações russas não atende apenas ao objetivo de restringir o financiamento das atividades de guerra. Do ponto de vista estratégico, os EUA afastam a influência da Rússia no continente europeu ao contribuir para a redução da dependência europeia de fontes energéticas russas. Desse modo, não só debilita sua condição de potência energética – porque a energia perde força como recurso de poder que pode ser utilizado como instrumento de pressão russa na Europa – como também abre espaço à entrada de produtos de empresas estadunidenses no mercado europeu. Devido aos impedimentos à Rússia, segundo dados da U.S. Energy Information Administration (EIA), a Europa tornou-se o principal destino das exportações de petróleo dos EUA a partir de dezembro de 2022. E Trump já declarou que pretende aprofundar essa relação comercial com a UE.

Paralelamente à estratégia dos EUA, a Rússia tem estreitado laços com seus parceiros de BRICS+, ao ampliar as exportações para a China, a Índia e o Brasil. Em 2024, do volume total de petróleo importado pela Índia, 36% tiveram como origem a Rússia. No caso da China, esse percentual foi de quase 20%. Em 2023, o governo de Putin declarou que aproximadamente 90% do petróleo havia sido exportado para ambos os países. O caso indiano é emblemático, tendo em vista que o país serve como rota de “fuga” para que o combustível russo volte a ser inserido na Europa, cuja operação envolve a compra de petróleo cru e sua reexportação em forma de produtos derivados após ser refinado, escapando do sistema de price cap. O Brasil também aparece como um destino importante para a absorção de derivados russos, especialmente o diesel.

Nos últimos anos, de acordo com dados publicados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), as importações de diesel pelo Brasil têm se mantido em níveis elevados, tanto nos valores quanto nos volumes. De 2021 para 2022, o valor total praticamente dobrou. Houve um salto de US$ 7,07 bilhões para 13,95 bilhões. Embora esses valores tenham diminuído em 2023 e 2024, correspondendo, respectivamente, a US$ 9,6 bilhões e US$ 8,3 bilhões, deve-se destacar a alta representatividade da fatia russa de diesel nesses montantes. 

Nos anos de 2021 e 2022, o percentual de participação do diesel russo no volume total de importações brasileiras do combustível era ínfimo. Em 2021, as importações do combustível alcançaram apenas US$ 16 milhões (0,22% do total), aumentando para US$ 95 milhões em 2022 (0,67%). De 2023 em diante, o aumento foi muito expressivo. Nesse ano, a entrada de diesel russo em solo brasileiro atingiu o valor de US$ 4,5 bilhões, o que representou quase metade do total importado (46,7%). Em 2024, houve um novo incremento considerável, passando a US$ 5,4 bilhões, ampliando a participação do diesel russo para 64%. 

No caso dos volumes de diesel importados, também se observa uma curva ascendente. Em 2021, foram importadas somente 25 mil toneladas; no ano seguinte, houve um salto para 102 mil toneladas; em 2023, o crescimento foi ainda maior, perfazendo 6,1 milhões de toneladas; e, em 2024, o volume totalizou 7,8 milhões de toneladas. 

Embora as últimas sanções econômicas impostas pela UE e pelos EUA possam reduzir a demanda da Índia e da China por petróleo, levando em consideração a elevação dos preços de transporte e frete marítimo, é preciso relativizar os efeitos de sua implementação. Se, por um lado, têm sido eficazes em conter a influência russa no setor energético europeu e ampliado a parceria entre UE e EUA, por outro, têm tido como consequência uma aproximação significativa dos países do BRICS+ no setor, o que ajuda a compensar a perda de espaço da Rússia na Europa. Com a ampliação do grupo de países emergentes, vislumbra-se um futuro em que a cooperação energética pode ser aprofundada, de modo a fazer frente à aliança entre UE e EUA.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.