Quem tem medo de Eliziane?
O machismo revela o medo dos homens das mulheres sem medo
Já se foi o tempo em que a bancada da bala, da bíblia e do boi ditavam regras e dominavam o cenário político brasileiro. Ainda têm representantes: na CPI do MST, o relator, a quem agradava passar a boiada; no belicismo bolsonarista, além dos filhos, os delegados como o deputado Bilynskyj, aficionado das armas de fogo nas discussões congressuais; finalmente, na bancada da Bíblia, o pastor Feliciano, saudoso dos tempos de grande prestígio, relegado a um plano secundário. O sucesso do presente governo trouxe pautas novas para as manchetes, de cunho humanista e social, como se verifica nas comissões de maior substância, entre as quais a CPMI do 8 de janeiro. Pois justamente ali, a relatora Eliziane Gama, dentro das funções que ocupa, ao lado do Presidente Arthur Maia, em parte pela firmeza das suas posições, mas igualmente pela liderança, não escapa a animosidades de opositores misóginos. Por causa disso, em paralelo a delineamentos de ordem política, explodiram discordâncias de traço religioso, resvalando para o pessoal, de parte a parte.
Religião e política se misturaram, com implicâncias e antipatias nas quais se escondiam em acréscimo visões atrasadas frente a ambições progressistas. O irritadiço pastor, virou suas baterias para todas as direções onde se colocavam parlamentares do gênero feminino, incluindo deputadas e senadoras. O pano de fundo, como se imagina, se concentrava nos episódios do 8 de janeiro e no vandalismo, os autores desejando empurrar para as vítimas pelo menos parte dos crimes praticados. Concluída a contenda, os ânimos não se acalmaram porque permaneciam resíduos de machismo da parte do religioso, cada vez mais isolado na sua perspectiva. Com as suas atitudes, para além da veemência da adversária, alvo do ódio de gênero, pesou-lhe um clima de reacionarismo com sais de atraso retrógrado indesculpável, com ou sem adesões dos adeptos de suas colorações conservadoras. Aquela animosidade simulava, de fato, pensamentos de cunho moral, para além de seus alinhamentos bolsonaristas. Como assinalava Galeano, o machismo revela o medo dos homens das mulheres sem medo. No confronto, Eliziane não se intimidou. Sentia-se no lado certo da História. Com dois ou três traços, destruiu o adversário como se esmagasse pouco mais do que um inseto. Ele ainda se debatia, pedindo socorro aos filiados de sua causa, atrás de um adjetivo que a definisse pejorativamente. Mas sem sucesso.
A discussão, afinal, não podia se limitar a religião. Havia bem mais em torno dela. Com efeito, a Terra gira. Os que manifestam a intenção de lhe interromper o movimento caminham para a rabeira dos acontecimentos. Logo dobrarão as costas, com o peso de um caminhão de retrocessos, pesando-lhe nas pernas. Eliziane não precisa se abater. Nos confrontos, se situa na linha do horizonte. Entre os arrogantes, coloca-se junto aos desvalidos. Cada vez mais, ela se afirmará. Ele, temerá.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

