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Pedro Maciel

Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

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“Religião e política não se misturam”, será?

A relação entre a Igreja Alemã e o nazismo foi complexa, com grupos que apoiavam o regime e outros que se opunham

Adolf Hitler, líder do nazismo (Foto: Reprodução)

"Minha poesia é cheia de imperfeições. Se eu fosse crítico, apontaria muitos defeitos. Não vou apontar. Deixo para os outros. Minha obra é pública."

(Carlos Drummond)

Após os dois artigos publicados aqui no 247: “As instituições humanas e a fé”[1] e “Pio XI e a coragem de enfrentar Hitler”[2] alguns amigos mandaram e-mails contendo diversos comentários sobre o conteúdo deles.

Um dos amigos, em tom de censura, me escreveu que eu estou “perdendo tempo” com a Igreja Católica e com as religiões em geral.

Pode ser que ele esteja certo, mas vou seguir a minha toada, pois, acredito que o que nos define são as nossas ações e porque a Igreja que eu acredito é aquela que o Concílio Vaticano II indicou como caminho a preferência pelos pobres; a minha Igreja é da Teologia da Libertação e das Comunidades Eclesiais de Base, as CEBs.

Trocamos alguns e-mails e ele, já mais agressivo, me disse: “então você é santo? Agora deu para falar de religião”, pensei: “ai meu Deus do céu!”.

Então respondi a ele que não sou santo, muito pelo contrário, sou, como tantos de nós, talvez a maioria de nós, cheio de erros e imperfeições. Aliás, a minha vida é como Carlos Drummond descreveu a sua poesia, cheia de imperfeições, mas pretendo vivê-la e da forma plena, buscando identificar e desculpar os meus erros, defeitos e imperfeições, tentando repará-los, tanto quanto possível.

Não estava falando de “religião”, mas de História e das possibilidades que as instituições e as pessoas têm para fazer o bem ou o mal.

Vejam o caso da CEBs, as quais, infelizmente, juntamente com as Pastorais Populares, foram atropeladas por trinta e quatro anos de pontificados conservadores (João Paulo II e Bento XVI).

Os trinta e quatro anos do pontificado de João Paulo II e Benedictus XVI, em nome da “volta à grande tradição da Igreja”, trouxe, de fora para dentro do Brasil, diversos Movimentos marcados por uma espiritualidade intimista, carismática, clericalista, desprovida de caráter social e de compromisso com a Opção pelos Pobres, uma das razões da perda de fiéis para as Igrejas Neopentecostais.

Outro amigo me disse que eu misturo politica com religião, que “pelo andar da carruagem você vai para o inferno”, ele afirmou, com perigosa certeza, que a Igreja não deve se misturar com política. E então eu perguntei a ele o que ele achava da Ku Klux Klan (KKK) ou Klan, ele não entendeu, tive que explicar.

A Klan (organização terrorista, fundada no Tennessee, EUA, no ultimo terço do século XIX, ela se pauta pelo supremacismo branco, que promovia e, em tese, ainda promove atos terroristas contra pessoas negras e simpatizantes dos direitos dos negros) é grandemente composta, como se sabe, por membros de igrejas protestantes daquele país, gente que que vai ao culto de manhã e queima negros à noite, ou seja, não sou apenas eu que misturo fé com ideologia.

E não é só.

A Alemanha nazista não era uma Alemanha ateísta ou pagã, a Alemanha cristã; ou seja, havia uma teologia cristã que deu sustentação ao nazismo; assim como havia um grupo de cristãos da “Igreja Confessante” que se colocava contra o nazismo; patrocinados e sustentados pela Igreja Confessante, Karl Barth e Bonhoeffer eram líderes da resistência; Bonhoeffer, inclusive, foi morto na prisão pelo nazismo, um cristão.

Existiu uma teologia que sustentava o nazismo, assim como existiu uma teologia que animava um Bonheeffer, curiosamente essas teologias decorrem da mesma Bíblia, como explicar isso?

Fato é que a relação entre a Igreja Alemã e o nazismo foi complexa, com grupos que apoiavam o regime e outros que se opunham. A maioria dos líderes cristãos apoiou a ascensão do nazismo em 1933, eles abraçaram muitos dos aspectos nacionalistas e raciais da ideologia nazista, o que foi duramente censurado pelo Papa PIO XI.

O Gleichschaltung, termo o Partido Nazista usava no sentido de “coordenação”, forçou as Igrejas Protestantes a entrarem para a Igreja Protestante do Reich e apoiar a ideologia Nazista.

Em oposição ao nazismo a Igreja Confessante, um movimento cristão minoritário de resistência ao Partido Nazista, fazia o que podia.

Dietrich Bonhoeffer, teólogo protestante alemão, foi executado no campo de concentração de Flossenbürg em 1945 por seu envolvimento na Operação Valquíria.

Há muitos outros tantos exemplos de “mistura” de religião e política, por isso a crítica não me incomoda, e mais, o ideal seria que todos pensassem sobre a realidade.

Peço ajuda ao Frei Beto e ao Frei Leonardo Boff, personalidades fundamentais e colaboradores do Brasil 247, para que me ajudem no argumento.

Essas são as reflexões.

[1] https://www.brasil247.com/blog/as-instituicoes-humanas-e-a-fe

[2] https://www.brasil247.com/authors/pedro-maciel

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.