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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor do livro "Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil". Editor da newsletter "Noticiário Comentado" (paulohenriquearantes.substack.com)

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Rememorando a era FHC, deus da mídia & mercado

Um refresco na memória é necessário

Fernando Henrique Cardoso (Foto: NACHO DOCE / REUTERS)

O PSDB praticamente acabou, como se sabe. O que um dia, sob a batuta de Franco Montoro e Mário Covas, foi uma voz social-democrata a tentar ser ouvida no Brasil, na verdade começou a ser ideologicamente enterrado quando chegou à Presidência da República: Fernando Henrique Cardoso realizou um governo neoliberal.

Há muitos tucanos ainda hoje na imprensa brasileira. Andavam meio acabrunhados, é verdade, por razões óbvias. No momento em que “o mercado” abre guerra franca contra o governo Lula, coopta o Banco Central, especula com o câmbio e convence a opinião pública de que nada é mais profícuo do que a austeridade fiscal, editorialistas exaltam a era FHC. Alguns chegam a sugerir a Lula que se inspire no presidente tucano - e até no austericida Michel Temer - ao conduzir economia, esquecendo-se de que o petista, ao fim do seu segundo mandato, tinha 85% de aprovação popular.

Um refresco na memória é necessário.

Quando FHC assumiu a Presidência da República, em 1995, a dívida pública era de R$ 153,4 bilhões. Em abril de 2002, no fim do seu governo, era de R$ 684,6 bilhões - um aumento de 346%. Nada mal para quem lucra com ela.

Durante os governos do neoliberal Fernando Henrique Cardoso, a média de crescimento do PIB foi de 2%. A falta de investimento em infraestrutura acarretou um monumental apagão elétrico. Para compensar os prejuízos às empresas, o governo baixou uma Medida Provisória transferindo a conta do racionamento de energia aos consumidores, que foram obrigados a pagar duas novas tarifas na conta de luz.

Sob o argumento de impedir quebradeira e evitar o colapso do sistema financeiro, FHC criou o Proer e socorreu os bancos. À época, o presidente disse que o custo da filantropia era de 1% do PIB. Posteriormente, os ex-presidentes do Banco Central Gustavo Loyola e Gustavo Franco estimaram a ajuda em 3% do PIB. Já economistas da Cepal apontaram 12,3% do PIB como o custo da benemerência, algo em torno de R$ 111 bilhões.

A privatização do Sistema Telebrás foi um capítulo especial da era FHC. Grampos no BNDES flagraram conversas do seu presidente, André Lara Resende, com o então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros. A dupla articulava apoio da Previ - o fundo de pensão do Banco do Brasil - ao consórcio liderado pelo banco Opoportunity, que tinha Pérsio Arida, amigo de ambos, como sócio. Deu em nada.

Fernando Henrique Cardoso, transmutado de Príncipe dos Sociólogos para Deus da Mídia & Mercado, reelegeu-se em 1998 após segurar a paridade real-dólar. Eleição ganha, foi obrigado a desvalorizar a moeda brasileira. Houve indícios de vazamento de informações pelo Banco Central: o então deputado Aloizio Mercadante, do PT, divulgou uma lista com o nome de 24 bancos que obtiveram enormes lucros com a mudança cambial e outros quatro que registraram movimentação especulativa suspeita às vésperas do anúncio da medida.

Na mesma época, os bancos Marka e FonteCindam receberam do BC socorro de R$ 1,6 bilhão, mediante alegação de que, quebrados, constituiriam risco sistêmico para a economia. Chico Lopes, presidente do Banco Central, e Salvatore Cacciola, Dono do Marka, este depois de um período de passeio pela Itália, foram presos. 

Vale a ênfase: naquela época, o Banco Central não era “independente” como é hoje.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.