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    Laira Vieira

    Economista, tradutora e crítica cultural

    13 artigos

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    Revelando o futuro distópico do sistema de saúde

    A representação distópica em Elysium ressoa com a realidade sombria do sistema de saúde privatizado

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    Bem-vindo ao futuro distópico de Elysium onde o abismo da sociedade entre os privilegiados e os desprivilegiados é gigantesco. Este filme instigante dirigido por Neill Blomkamp (Distrito 9, Chappie), usa a ficção científica para nos fazer refletir sobre questões sociais contemporâneas, e nos leva a uma viagem emocionante em um mundo dividido pela riqueza e acesso aos cuidados de saúde. À medida que exploramos a descrição do filme de uma sociedade em que saúde, hospitais e tratamentos são mercadorias reservadas apenas para os ricos, descobriremos como esse retrato não está tão longe de nossa própria realidade quanto poderíamos pensar.

    A trama - Em 2159, o mundo é dividido entre dois grupos: os ultra-ricos, que vivem na estação espacial Elysium; e os pobres, que habitam a Terra, repleta de pessoas e em grande decadência. De um lado, a secretária do governo Rhodes (Jodie Foster) que está disposta a fazer tudo para preservar o status quo, por outro, um pobre cidadão da Terra (Matt Damon) tenta um plano ousado para trazer de volta a igualdade entre as pessoas - depois de sofrer um acidente, cair na Terra e esbarrar na Frey (Alice Braga), que está desesperada para curar sua filha - e Spider (Wagner Moura), um rebelde em busca de justiça. 

    O filme apresenta uma trama original, realista, e envolvente com muitas metáforas político-sociais. 

    O avanço tecnológico elevou a expectativa de vida dos ricos, já os pobres estão à sua própria sorte. 

    Nas palavras de Karl Marx, "A história de todas as sociedades até agora existentes é a história das lutas de classes." As lutas de classes retratadas em Elysium e espelhadas em nossos próprios sistemas de saúde não são apenas ficção, mas reflexos dos desafios reais que enfrentamos na criação de um mundo justo e compassivo.

    Em uma entrevista Blomkamp disse “Somos inteligentes o suficiente para construir a tecnologia para criar um planeta globalizado, mas não somos inteligentes o suficiente para nos livrar do software antigo que nos governa. Esses dois combinados produzirão uma séria explosão de barril de pólvora que, na minha opinião, está chegando.”

    O sistema de saúde distópico - Apesar de ser uma potência econômica global, os Estados Unidos sofrem de uma das disparidades de saúde mais significativas do mundo. Milhões de americanos não têm acesso a planos e tratamentos de saúde adequados devido aos custos exorbitantes associados a um sistema de saúde privatizado. A situação chegou a tal ponto que muitos negam atendimento médico e ambulâncias devido aos valores que terão que pagar. 

    A representação distópica em Elysium ressoa com a realidade sombria do sistema de saúde privatizado. O filme retrata um mundo onde apenas a elite privilegiada residente em Elysium tem acesso à tecnologia médica que salva vidas, enquanto o resto da sociedade na Terra enfrenta uma luta constante pela sobrevivência com recursos limitados e instalações médicas desatualizadas. Essa divisão gritante levanta questões profundas sobre as consequências do capitalismo desenfreado e a erosão da empatia dentro da sociedade.

    Outra maneira de fazer as coisas - Países como Canadá e Dinamarca oferecem um vislumbre de esperança por meio de seu compromisso com a saúde universal. Nessas nações, a saúde é tratada como um direito fundamental acessível a todos os cidadãos, independentemente de sua condição socioeconômica. Este compromisso garante que os tratamentos médicos e o acesso ao hospital não sejam determinados pela situação financeira de cada um, criando uma sociedade mais saudável e igualitária.

    No Canadá, os cidadãos se beneficiam de um sistema de saúde gerenciado e financiado publicamente que cobre serviços médicos essenciais. O acesso a médicos, hospitais e tratamentos está disponível para todos sem o peso de custos exorbitantes. Da mesma forma, o sistema de saúde universal da Dinamarca, financiado por meio de impostos, enfatiza os cuidados preventivos e a intervenção precoce, promovendo o bem-estar geral de sua população. 

    Entre as nações que defendem a saúde universal, o Sistema Único de Saúde (SUS), o Brasil se destaca como um modelo exemplar. Criado em 1990, o SUS é um sistema público de saúde destinado a oferecer assistência integral à saúde de todos os cidadãos brasileiros. Este sistema notável oferece uma ampla gama de serviços médicos, incluindo cuidados preventivos, cirurgias e tratamentos de emergência, com pouco ou nenhum custo.

    O princípio fundador do SUS é baseado na solidariedade, na justiça social e na dignidade da pessoa humana. Abrange tudo, desde vacinas até cirurgias complexas e transplantes de órgãos. Ao longo dos anos, o SUS tornou-se uma tábua de salvação para milhões de brasileiros, especialmente aqueles que vivem na pobreza ou em áreas remotas, que de outra forma seriam excluídos dos serviços essenciais de saúde. 

    Embora o SUS ainda precise melhorar - e muito - e  enfrente desafios, incluindo subfinanciamento e obstáculos burocráticos, ele continua sendo um exemplo brilhante de como uma nação pode priorizar a saúde e o bem-estar de seus cidadãos, mesmo diante de dificuldades econômicas e sociais.

    Os constantes avisos  - Thomas Piketty, autor de O Capital no Século XXI, alerta sobre as consequências perigosas do capitalismo desenfreado, onde a concentração de riqueza leva a uma desigualdade cada vez maior. O futuro distópico retratado em Elysium serve como uma metáfora visual do futuro contra o qual Piketty adverte se falharmos em lidar com as disparidades de riqueza.

    A pesquisa inovadora de Piketty demonstra como, ao longo do tempo, a riqueza se acumula desproporcionalmente entre os mais ricos, resultando em uma lacuna crescente entre a elite privilegiada e a classe trabalhadora. Como o filme retrata apropriadamente, tais disparidades podem se manifestar em acesso desigual aos cuidados de saúde e avanços médicos que salvam vidas.

    O prêmio Nobel Joseph Stiglitz, em O Preço da Desigualdade, destaca a correlação entre desigualdade de renda e acesso reduzido a serviços essenciais, incluindo saúde. Enquanto os ricos acumulam recursos, os menos afortunados ficam lutando pela sobrevivência. Esse paralelo entre Elysium e as disparidades de saúde do mundo real exige reformas urgentes para preencher a lacuna.

    Os insights de Stiglitz sobre os efeitos prejudiciais da desigualdade de renda lançam luz sobre como as disparidades econômicas perpetuam um sistema de saúde injusto. Abordar essas desigualdades torna-se crucial na construção de uma sociedade que valorize a saúde e o bem-estar para todos, independentemente de sua situação econômica.

    A urgência da mudança - Elysium é mais do que apenas um thriller de ficção científica cativante; serve como um lembrete claro das consequências de perpetuar um sistema capitalista que prioriza o lucro sobre o bem-estar de todos os cidadãos. Como muitas obras cinematográficas, este filme atua como um prenúncio de futuros potenciais, incitando-nos a confrontar questões prementes antes que se tornem nossa realidade.

    Com base nas lições do cinema, da literatura, da economia, e de nossas observações sobre a sociedade na qual estamos inseridos, devemos lutar por uma sociedade que valorize a empatia, a igualdade e o acesso universal à saúde. O filme serve como um apelo à ação convincente, lembrando-nos que o acesso a cuidados de saúde de qualidade não deve ser determinado pela situação financeira de uma pessoa, mas deve ser reconhecido como um direito humano básico.

    Atendamos aos alertas do cinema, da literatura e de renomados economistas e trabalhemos juntos para construir um futuro onde a saúde seja acessível a todos, independentemente de sua condição social ou econômica. Somente por meio da ação coletiva e de um compromisso compartilhado com a mudança podemos construir uma sociedade onde Elysium continue sendo um conto de advertência e não um vislumbre ameaçador de nossa realidade.

    Elysium nos leva a olhar criticamente para o nosso mundo e vislumbrar um futuro mais humano e inclusivo. Ao enfrentarmos os enormes desafios do presente, podemos ser inspirados a lutar por uma sociedade que valorize a saúde e o bem-estar de cada indivíduo, garantindo que a saúde não seja apenas um privilégio para os privilegiados, mas um direito fundamental para todos.

    Defenda o SUS!

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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