Rumo à doralização da economia
Optar pela conversibilidade significa fixar as taxas de câmbio, emitir dívida pública denominada em moedas estrangeiras e faz com que o Banco Central deixe a oferta monetária se regular livremente. Ao estabelecer um lastro cambial, o governo não consegue interferir, nem taxa básica de juros da economia, nem na quantidade de moeda circulante
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Uma das condições de soberania é a capacidade do Estado emitir moeda denominada na unidade por ele escolhida, sem qualquer garantia explícita de conversibilidade. É um poder fundamental diretamente associado a nações soberanas. Optar pela conversibilidade significa perder a capacidade de fixar as taxas de câmbio e de emitir dívida pública denominada em moedas estrangeiras.
Esse poder fundamental do Estado soberano está ligado à sua capacidade de impor tributos, o que o torna capaz de emitir moeda fiduciária, de definir a taxa de juros básica e de financiar seus gastos na aquisição de bens e serviços, mediante a criação de reservas bancárias, não sendo necessário que o Estado se endivide antes de gastar.
Nos últimos dias o governo Bolsonaro enviou ao Congresso duas mensagens que abrem caminho à dolarização da nossa economia:
1. A MP 897 que, entre outras providências, estabelece que a Cédula do Produtor Rural e os títulos do agronegócio possam ser emitidos com cláusula prevendo que se sejam referenciados em moeda estrangeira, além de estender a todo o mercado financeiro a possibilidade de acessar a equalização da taxa de juros (subsídios), antes restrita a bancos públicos federais, bancos cooperativos e confederações de cooperativas de crédito.
2. Projeto de lei que avança na conversibilidade do Real, desprezando os ensinamentos de experiências econômicas que deram errado no Chile, na ditadura militar de Pinochet com o experimento neoliberal dos “Chicago Boys”, e na Argentina na época da ditadura de 1976 até 1981 quando o Ministro da Economia era José Alfredo Martínez de Hoz e no período de 1991 a 2001, com Domingo Cavallo. O nosso "Chicago Old" sabe que o experimento na Argentina quadruplicou a dívida externa e prejudicou a indústria local. O programa econômico tinha como objetivo a integração da Argentina na nova divisão do trabalho da economia capitalista internacional, com base nas vantagens comparativas oferecidas por seu setor primário, agrícola e de mineração. Na prática o programa provocou uma grande transferência de capitais para o exterior e a perda de poder aquisitivo para as classes médias e baixas argentinas. Isso fez com que a indústria deixasse de ser o núcleo dinâmico da economia. Estimulou a conversão da dívida pública interna em dívida externa, sob a alegação de que se obteriam taxas de juros mais baixas e prazos de amortização mais longos. Considerava o investimento externo essencial para reduzir o custo social do processo de capitalização do país e acelerar sua taxa de crescimento, ao entrar nos setores agrícola e e de petróleo e mineração. Qualquer semelhança com o que está no plano do Ministro Guedes não é mera coincidência.
Optar pela conversibilidade significa fixar as taxas de câmbio, emitir dívida pública denominada em moedas estrangeiras e faz com que o Banco Central deixe a oferta monetária se regular livremente, através da entrada e saída de moeda no país. Ao estabelecer um lastro cambial, o governo não consegue interferir, nem taxa básica de juros da economia, nem na quantidade de moeda circulante.
Na melhor das hipóteses a conversibilidade promoverá uma entrada expressiva de capitais, acentuando a desnacionalização da economia. O primeiro efeito será a apreciação do real, com deterioração da balança de transações correntes. O outro será a formação de bolhas de ativos, dada a pequena expressão dos mercados financeiro e cambial nacional diante dos mercados internacionais, com grande probabilidade de ocorrência de crises. A opção de atrelar a nossa moeda ao dólar se insere no quadro da submissão da nossa política externa aos interesses dos Estados Unidos, abrindo mão de uma parcela da nossa soberania. O governo terá que tomar empréstimos em dólares ou obtê-los através do sistema tributário (em última instância, terá de vir de exportações), de forma a poder gastar. Finalmente, mas não menos importante, se em qualquer época seria um retrocesso a dolarização da nossa economia, no momento atual ela pode se transformar em um desastre, pois a economia internacional vive grande instabilidade, diante da guerra comercial entre os Estados Unidos e China, do processo do Brexit, da grande turbulência no Oriente Médio e, no nosso caso, da crise na Argentina, que afeta de modo bastante duro a nossa indústria.
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