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Igor Corrêa Pereira

Igor Corrêa Pereira é técnico em assuntos educacionais e mestrando em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Membro da direção estadual da CTB do Rio Grande do Sul.

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Só o acaso estende os braços a quem procura abrigo e proteção

Pode ser que essa gerações, para existir, tenham que negar tudo o que fizemos. Mas de uma coisa, esses jovens não poderão fugir. Para continuar a grande tarefa humana, que é a reprodução de nossa espécie, terão que inventar uma sociabilidade capaz de reproduzir a vida

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Minha geração é a dos nascidos na segunda metade dos anos oitenta. Somos hoje adultos feitos. Florescemos em meio a oportunidades educacionais e democracia. Tenho amigos que se concursaram, fizeram pós-graduação. Eu trabalho e estudo numa universidade pública. Cheguei até aqui pelo resultado de políticas públicas. 

Atendo jovens das gerações seguintes a minha. Nascidos em noventa, dois mil. Eles não têm as mesmas oportunidades. Atualmente, até sair na rua lhes é difícil, que dirá ter oportunidades. Nos encontros que tenho com eles, percebo comumente casos de ansiedade, muitas vezes depressão. Uma música que embalou minha geração parece narrar a condição deles. Há tempos são os jovens que adoecem. Há tempos o encanto está ausente e há ferrugem nos sorrisos. E só o acaso estende os braços a quem procura abrigo e proteção. 

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Quando Renato Russo escreveu esses versos, com sua sensibilidade traduziu o espírito de uma época. O mundo vivia o ocaso do socialismo soviético e o triunfo do estilo de vida da sociedade estadunidense. De lá para cá vivemos sob a égide de um modo de pensar ditado por esses vencedores da Guerra Fria. Mesmo os governos de esquerda que se ergueram na América Latina, por mais que tenham trazido importantes avanços sociais, não conseguiram romper e apontar uma racionalidade diferente de uma sociedade baseada no individualismo. Em que cada um passe a se conduzir como o único responsável pelo seu sucesso ou fracasso. 

A dama de ferro do neoliberalismo Margareth Thatcher sabia o que tinha em mente quando disse que a economia era o método para mudar a alma. O culto ao indivíduo floresceu no Ocidente sem encontrar grande resistência. E contraditoriamente, quanto mais avança, mais esmaga e apequena os indivíduos. Quanto mais nos sobrecarregamos com o peso de vencer ou perder, mais nossas pernas se enterram no solo movediço, dificultando nosso movimento. 

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Nenhuma celebridade cultuada no mundo em qualquer área do conhecimento humano alcançou a condição do sucesso sozinha. No entanto, a propaganda neoliberal nos quer fazer acreditar que esses ícones lá estão somente por que se esforçaram, exclusivamente por seus talentos individuais. O peso dessa comparação só nos oprime mais e mais, e essas gerações que me sucedem parecem mais vulneráveis ao peso dessas absurdas e irreais comparações. 

Para que os indivíduos brilhem em suas potencialidades, precisamos de instituições coletivas. Todas  as virtudes humanas, a força e destreza física, a inteligência nas ciências, nas artes, o que faz cada um de nós único, só pode florescer num ambiente com instituições coletivas funcionando. Nenhuma potencialidade individual se desenvolve por si só, sem nenhuma ajuda. A propaganda neoliberal bombardeia diariamente que devemos competir uns com os outros em busca dos poucos lugares existentes. Essa batalha não terá vencedores. Enquanto aceitarmos a lógica vendida pelos Big Brothers das televisões de que só existe um vencedor, nenhum de nós poderá usufruir de uma vitória realmente compensadora, pois mesmo que vença, terá que viver se esquivando de todos aqueles que ficaram pelo caminho. 

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Precisamos ser capazes de sonhar algo diferente. Eu cresci ouvindo as vozes do Fórum Social Mundial, que dizia que um outro mundo é possível. Onde estão essas vozes? Precisamos ser capazes de renunciar essa competição entre indivíduos e anunciar a cooperação mútua. A humanidade chegou até aqui porque soube criar formas sociais em que humanos cooperaram coletivamente e assim criaram condições de existência. O humano é um animal político e a política é a arte de resolver problemas comuns alcançando consensos. Toda essa ideia está em perigo quando o indivíduo renuncia a política para tentar resolver por conta própria a sua situação, seja comprando uma arma para garantir sua defesa ou comprando saúde privada, educação privada, ou indo morar longe da sociedade com a ilusão de se refugiar do mal que dela emana. 

O planeta é um conjunto que para nós humanos não permite a noção de estar “fora”. As sociedades se espalharam pelo planeta, e hoje é impossível estar “fora” da sociedade. Portanto, ou resolvemos nossos problemas comuns coletivamente, ou não resolvemos. As soluções individuais são provisórias e frágeis. Quando converso com os jovens que atendo, insisto nisso. Que eles precisam cooperar para florescer. Cooperar uns com os outros enquanto colegas, cooperar com docentes, técnicos. E precisam lutar para que lhes sejam oferecidas condições para que continuem estudando. Em resumo, para que a Universidade continue sendo pública e responsável pela permanência. 

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Mas no fundo, sei que nem devo esperar que me ouçam. É parte da constituição das gerações emergirem negando aquelas que a antecederam. Pode ser que essa gerações, para existir, tenham que negar tudo o que fizemos. Mas de uma coisa, esses jovens não poderão fugir. Para continuar a grande tarefa humana, que é a reprodução de nossa espécie, terão que inventar uma sociabilidade capaz de reproduzir a vida. E em nenhum outro momento da história da humanidade, indivíduos isolados conseguirão êxito nessa tarefa. Portanto, inventar formas de cooperação social mútua será o grande desafio colocado para a continuidade da vida humana. 

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