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Breno Altman

Breno Altman é diretor do site Opera Mundi e da revista Samuel

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Sobre Lula e a democracia relativa

"Universalização do conceito de democracia é aleijão histórico, situado entre arsenal da hegemonia burguesa e rendição ao pensamento liberal", diz Breno Altman

Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
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(Publicado no Opera Mundi)

A declaração do presidente Lula, sobre a relatividade da democracia, provocou urticárias entre liberais de direita e de esquerda.

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Se fosse absoluta, a democracia seria um regime modelar. Ou seja, haveria um modelo padrão - a democracia ocidental e liberal - que serviria de métrica para todas as nações. Todos os sistemas políticos estranhos a esse modelo seriam, por óbvio, antidemocráticos.

Mas essa universalização do conceito de democracia é somente um aleijão histórico, situado entre o arsenal ideológico da hegemonia burguesa e a rendição teórica de setores da esquerda à pressão exercida pelo pensamento liberal.

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Não se trata apenas de situar a democracia no terreno da luta de classes, o que pressupõe qualificá-la como burguesa ou socialista, para identificar a quais objetivos e interesses serve determinado regime político.

Tampouco é suficiente contextualizar os diferentes sistemas, para diferir os que estão integrados ao sistema imperialista, livres de ameaças e sanções externas, daqueles que estão submetidos a toda sorte de agressões e bloqueios.

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O truque principal do discurso liberal é a confusão proposital entre democracia e liberdade, como se a essência da questão democrática estivesse nos direitos políticos formais.

Liberdade e democracia - Democracia é o poder do povo. Diz respeito às condições econômicas, sociais, educacionais e organizacionais para que a maioria possa governar uma nação. Quanto maiores as liberdades que esse sistema puder usufruir, melhor. Mas não é a dimensão da liberdade que determina a existência ou não de um regime substantivamente democrático.

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Provavelmente não há país que goze de maiores liberdades formais que os Estados Unidos, a meca da democracia burguesa. Todo mundo, por exemplo, tem direito de formar partidos para disputar o governo ou de fundar meios de comunicação para influenciar a opinião pública. Mas não passa de uma garantia formal: apenas quem acumula enormes recursos financeiros é capaz de exercer efetivamente esse direito.

Embora ainda persista uma certa cultura comunitária, de participação social nas pequenas e médias cidades, a política norte-americana é essencialmente determinada pela plutocracia, isso é, a ditadura do dinheiro. Está circunscrita a instituições controladas pelo capital, como o parlamento e o Poder Executivo, com a imensa maioria da população excluída de qualquer processo decisório. A política é quase totalmente profissionalizada, com bilhões de dólares sendo necessários para realmente lutar pela direção do Estado.

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Não é diferente a situação na Europa ou na América Latina, incluindo o Brasil. A democracia liberal oferece praticamente todos os direitos formais, em condições normais, mas apenas a burguesia pode integralmente acessá-los.

Ainda por cima, nenhum desses Estados burgueses é ameaçado, desde fora, por punições e sabotagens caso insistam em manter sistemas plutocráticos.

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Olhemos agora para Cuba, apenas como exemplo. Não há qualquer dúvida, em uma leitura honesta, que há menos liberdade na ilha socialista do que no gigantesco vizinho imperialista. Até porque o bloqueio estabelecido pelos EUA, a interferência estrangeira e o risco de agressão obrigam a um permanente estado de guerra, no qual obviamente liberdades são suprimidas ou controladas.

Cuba é uma ditadura? - Os cubanos tomam decisões coletivas sobre os rumos do país de forma permanente, através dos instrumentos de poder popular, que vão dos quarteirões ao âmbito nacional, em debates e votações que chegam a envolver, diretamente, mais de metade da população, como foram os casos da reforma constitucional e do novo código de família.

Não se trata de uma participação limitada ao voto em referendos, mas de discussões bairro-a-bairro, protegidas de qualquer influência organizada por lobbies financeiros, nas quais milhões de pessoas estão envolvidas com o objetivo de apresentar propostas e emendas antes que determinado projeto vá à votação popular.

Esse método reflete-se também sobre a parte representativa da democracia: a esmagadora maioria dos parlamentares exerce suas funções sem remuneração, as candidaturas são definidas pelas organizações sociais (e não pelo partido comunista) e as disputas são realizadas em absoluta igualdade de armas, pois somente podem ser usados os espaços estabelecidos pelo Estado.

A democracia cubana não é liberal. Tampouco a chinesa ou a vietnamita. Sua coluna vertebral é a soberania popular, exercida de forma igualitária pelos cidadãos e através de instrumentos preponderantemente diretos. Os direitos políticos formais têm menos importância do que nos países capitalistas. Um dos motivos é porque revoluções vitoriosas não costumam oferecer, mesmo que hipocritamente, possibilidades de restauração do poder das classes derrotadas, mas que ainda possuem muitos recursos econômicos e aliados internacionais dispostos a tudo.

A democracia norte-americana, por sua vez, é o mito fundacional da república liberal. Quase todos os direitos políticos formais estão garantidos. Mas isso não tem qualquer relevância para a ditadura do capital, que controla todas as esferas da sociedade e do Estado, legitimada por eleições que dependem de fortunas incalculáveis, em um sistema no qual o dinheiro é a força motriz e excludente, condenando a maioria do povo a um papel passivo, dominado.

Não restam dúvidas de que o presidente Lula tem razão: a democracia é mesmo relativa.

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