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Paulo Moreira Leite

Colunista e comentarista na TV 247

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STF escreve errado a partir de linhas certas

"Invertendo o debate popular, o Supremo partiu de uma discussão correta sobre o foro privilegiado para construir um projeto que só aumenta a pressão contra os parlamentares e enfraquece a democracia, criando um ambiente para a eternização da Lava Jato", avalia Paulo Moreira Leite; lembrando que o projeto deixa de lado altos funcionários públicos, inclusive juízes, para concentrar-se em parlamentares, eleitos pelo povo, PML questiona: "alguém duvida que o alvo, lá no fim da linha, é punir o voto popular?"

"Invertendo o debate popular, o Supremo partiu de uma discussão correta sobre o foro privilegiado para construir um projeto que só aumenta a pressão contra os parlamentares e enfraquece a democracia, criando um ambiente para a eternização da Lava Jato", avalia Paulo Moreira Leite; lembrando que o projeto deixa de lado altos funcionários públicos, inclusive juízes, para concentrar-se em parlamentares, eleitos pelo povo, PML questiona: "alguém duvida que o alvo, lá no fim da linha, é punir o voto popular?" (Foto: Paulo Moreira Leite)
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Um velho refrão da sabedoria popular ensina que "Deus escreve certo por linhas tortas". É um pensamento de valor universal. Ajuda a explicar episódios históricos que chegam a um final feliz depois de um enredo de tumultos, erros e desvios que ameaçavam produzir um desastre. 

A própria essencia dos regimes democráticos é uma reprodução das linhas tortas que produzem enredos corretos. Seu cotidiano é uma desordem permanente, em função dos conflitos tremendas e divergências profundas que podem se expressar. Quando se pensa que o sistema vai produzir uma tragédia, a soberania popular encarrega-se de garantir o retorno a normalidade. 

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A votação do STF sobre o foro privilegiado para parlamentares é um caso inverso -- linhas corretas que produziram um enredo trágico. Quando escrevo, o placar se encontra em 10 a 0 a favor de criar restrições. Poderia ser motivo de comemoração mas é preocupante.

Ninguém é a favor de regras de proteção a autoridades que sejam um estimulo a impunidade e ajudem a acobertar crimes de toda natureza.   

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Mas, em todo país onde vigora um sistema de democracia representativa, é preciso que autoridades eleitas pelo povo, que expressam a soberania popular, desfrutem de uma proteção especial para bem executar seu trabalho. Sem isso, um deputado que for até a porta de uma fábrica defender operários que estão sendo espancados pela polícia corre o risco de apanhar junto sem reclamar. Sei que os casos nem sempre são tão nobres  como este meu exemplo mas você entendeu o espírito de uma lei que deve funcionar para todos.  

Quando se recorda que, no Brasil,  parcelas do aparelho policial, setores da  Receita e do próprio judiciário costumam ser manipulados para atingir alvos políticos, a preocupação em defender representantes do eleitorado é ainda mais justificada. Envolve a proteção de garantias indispensáveis ao regime democrático.

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No debate travado no Supremo, surgiram duas propostas. Uma delas, defende que os parlamentares tenham direito a foro privilegiado em função de crimes cometidos durante o mandato. É uma regra objetiva, neutra. Todo mundo sabe quando começa e quando termina o mandato de um parlamentar.

O perigo se encontra na versão seguinte. Nessa opção, o foro especial só pode ser aplicado em duas condições. Quando o crime for cometido durante o mandato e em razão dele. 

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A subjetividade reside aqui, em definir o que se faz e o que não se faz "em razão do mandato". Por exemplo: entre a Ação Penal 470 e a Lava Jato, ao longo de dez anos firmou-se a noção de que as verbas de campanha que antes eram consideradas "contribuições eleitorais" e "caixa 2" agora são classificadas como "propinas", ainda que tenham sido contabilizadas formalmente e declaradas ao fisco.

Se você examinar o debate à luz da conjuntura atual, de risco de formação de uma ditadura judicial, o quadro se mostra mais grave e urgente. A ampliação das oportunidades de investigação e punição no interior sistema político, já alvejado por uma das operações mais severas do planeta, só irá contribuir para o enfraquecimento da democracia representativa. É uma janela para a perpetuação da Lava Jato e suas ramificações, que deixa de ser uma investigação para se tornar uma inquisição.

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Um detalhe torna o debate ainda mais constrangedor. O projeto em exame coloca em questão, exclusivamente, o foro privilegiado para parlamentares. Isso quer dizer que os juízes brasileiros -- inclusive os 11 integrantes do Supremo -- seguirão usufruindo do Foro Privilegiado de sempre, enquanto os parlamentares entram numa área de maior exposição e risco. Favorável a versão mais branda da mudança, Ricardo Lewandowski disse em plenário que a proposta apoiada pela maioria instituirá "um privilégio dentro do privilégio".

Um aspecto didático: como acontecia no mundo totalitário descrito em 1984, clássico da ficção política de George Orwell, alguns privilegiados são mais privilegiados do que outros.

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No caso, os juízes, que não tem votos, passam a dispor de mais garantias do que os parlamentares que, bem ou mal, são eleitos pelo povo.

Pergunta que não quer calar: alguém duvida que o alvo, lá no fim da linha torta, após idas, voltas e descaminhos é punir o voto popular?

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