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Waldeck Carneiro

Professor da UFF e deputado estadual (PT-RJ)

8 artigos

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Transporte aquaviário: o RJ não pode errar de novo

O fato de o Estado do Rio de Janeiro ter privatizado a CONERJ e concedido a operação do transporte aquaviário ao setor privado não deixa de fazer do governo estadual o principal responsável pela forma como esse serviço é prestado

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O serviço de transporte aquaviário é fundamental para trabalhadores do Estado do Rio de Janeiro: de Niterói, de São Gonçalo, da Cidade do Rio e da Baía da Ilha Grande. Porém, já caminhando para o final da segunda década do século XXI, pode-se afirmar que o transporte público, nos diferentes modais, ainda é um verdadeiro desafio cotidiano para milhões de fluminenses: longas esperas, desconforto, insegurança, acessibilidade sofrível e tarifas caras. Por isso, sigo considerando discutível que o transporte público, por configurar-se como serviço tão essencial, não seja diretamente gerido pelo Poder Público. No Estado do Rio de Janeiro, no que tange ao transporte aquaviário, essa possibilidade saiu de cena, no final dos anos 1990.

Com efeito, em 1998, no contexto do processo de desmontagem do Estado brasileiro, quando se multiplicavam as odes à privatização, tida como alternativa mais eficaz e mais econômica ao caráter "moroso" e "perdulário" do serviço público, ocorreu a venda da Companhia de Navegação do Estado do Rio de Janeiro (CONERJ). Contudo, o fato de o Estado do Rio de Janeiro ter privatizado a CONERJ e concedido a operação do transporte aquaviário ao setor privado não deixa de fazer do governo estadual o principal responsável pela forma como esse serviço é prestado, ou seja, pela forma como são tratados os usuários das barcas. Por isso, é muito importante, neste momento particularmente dramático da história do Rio de Janeiro, que a nova licitação do transporte aquaviário, em preparação pela Secretaria de Estado de Transportes (SETRANS), seja um exemplo de rigor, de lisura e de referência no interesse público. Sim, o governo estadual e a agência reguladora do setor devem adotar como principal parâmetro de sua conduta a perspectiva do usuário do serviço, do trabalhador, do cidadão.

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Chama a atenção o fato de que, com frequência, autoridades estaduais demonstram sensível preocupação com o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos e com a rentabilidade da concessionária, mas não fazem referência, com tanta ênfase, ao interesse público, ao interesse daquele a quem o serviço público privatizado se destina. Por exemplo, sempre causou espanto que o Estado do Rio de Janeiro tenha permanecido como principal responsável pelos investimentos na modernização do serviço de transporte aquaviário, mesmo depois da privatização do setor, como nos rumorosos processos de compra das embarcações chinesas. Ora, fez-se a privatização, mas o Estado do RJ continuou investindo recursos públicos no empreendimento (agora privado): por que então não se manteve o caráter estatal da operação?

Preocupa a pressa da SETRANS, assessorada pela Fundação Getúlio Vargas, em lançar o novo edital. Afinal, ainda há dúvidas a serem dirimidas e enganos a serem evitados. Por exemplo, antes de publicar o edital, é preciso que sejam esclarecidas as razões pelas quais a atual concessionária pleiteou a resilição do contrato, seis anos antes de sua expiração, prevista para 2023 (vigência de 25 anos, desde 1998). Contrato, alías, "herdado" em 2012 pela CCR Barcas (controlada por Andrade Gutierrez, Camargo Correa e Soares Penido), que não o conquistou por licitação. À época, o governo estadual, chefiado por Sergio Cabral, quis beneficiar a concessionária anterior (Empresa 1.001, do Grupo JCA), que, tendo assumido a concessão em 1998, também quis "abandonar o barco" antes do tempo. Para que a Empresa 1.001 pudesse se desvencilhar com rapidez do contrato, o governo estadual não preparou nova licitação: em manobra discutível, autorizou que a então concessionária passasse o contrato para a atual concessionária, sem certame, sem concorrência, sem transparência.

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Também é preciso ouvir os trabalhadores do setor aquaviário, que atuam em embarcações, estações e estaleiros de reparos, pois eles certamente têm algo a dizer sobre o cotidiano da prestação do serviço em questão. E, obviamente, é indispensável dar voz aos cidadãos, em audiências públicas regionalizadas, para que possam subsidiar o próximo processo licitatório com suas experiências diárias como usuários. Não é possível promover novo certame, se o espírito for sinceramente o de superar problemas que se acumulam desde a privatização, sem apostar no protagonismo de trabalhadores e usuários, cotejando suas posições com aquelas manifestadas por especialistas, tecnocratas e empresas que atuam no setor.

Ademais, algumas demandas represadas devem ser atendidas, de uma vez por todas. É o caso da ligação aquaviária São Gonçalo-Praça XV, aguardada há vinte anos. Tal alternativa, absolutamente necessária e plausível frente à expressiva população gonçalense, a segunda maior de todo o Estado, também terá positiva repercussão sobre Niterói, com o alívio de suas principais artérias no sentido Norte-Centro, sempre repletas de coletivos que fazem o transporte de passageiros de São Gonçalo à estação Araribóia, no Centro. Sobre a linha São Gonçalo-Praça XV, a SETRANS afirma que incluirá no Edital a exigência de "estudos" sobre a sua viabilidade. Ora, o povo gonçalense, vinte anos depois da privatização da CONERJ, ainda vai ter que esperar por mais estudos? No edital da licitação, deve constar, isto sim, um prazo para a efetiva implantação da linha pela nova concessionária, pois é isso que impõem o bom senso e o interesse público.

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Há outro ponto fundamental: urge reconceituar a linha Charitas-Praça XV, que não pode seguir cobrando R$ 16,50 (dezesseis reais e cinquenta centavos) por viagem, enquanto a administração municipal niteroiense faz robustos investimentos para melhorar a mobilidade da Região Oceânica à Zona Sul de Niterói e ao Centro do Rio. Todo o complexo da Transoceânica e, em especial, o Túnel Charitas-Cafubá não produzirão o mesmo impacto, sem que a estação de Charitas seja reconfigurada, deixando de operar apenas a linha seletiva, inclusive porque as intervenções urbanas feitas pela Prefeitura de Niterói gerarão substanciosa ampliação da demanda naquela linha. Com o fito de contribuir nessa direção, alguns deputados estaduais, entre os quais me incluo, apresentaram Projeto de Lei que modifica a legislação em vigor, de modo a impedir que as tarifas das chamadas linhas seletivas sejam "livres", como ocorre hoje. Sem dúvida, o mais adequado é que a ALERJ dê celeridade à tramitação dessa proposição para que seja aprovada, antes do lançamento do edital.

A ampliação da grade de horários na estação de Cocotá, na Ilha do Governador, de modo que a população tenha mais alternativas e a demanda ali se consolide, é outro elemento que requer urgente equacionamento, levando-se em conta os problemas que se acumulam desde a inauguração daquela estação e a expressiva população daquele bairro insular, com cerca de 300.000 habitantes. A linha Paquetá-Praça XV também é particularmente sensível, sobretudo porque o transporte aquaviário, nesse caso, é a única forma de transporte coletivo para trabalhadores e moradores daquela ilha eternizada por Joaquim Manoel de Macedo. Nesses dois casos, Cocotá e Paquetá, linhas municipais, é desejável que governo estadual e Prefeitura da capital superem suas querelas, que já começam a aparecer na imprensa, antes da deflagração do novo processo licitatório.

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Por fim, uma questão de fundo: não caberia debater à exaustão, mas conclusivamente, a relevante questão do monopólio, antes da publicação do edital? Afinal de contas, é mesmo melhor para a população que todas as linhas das barcas sejam exploradas por uma única concessionária? A quem serve tal modelo? Por que a tão propalada "livre" concorrência, pedra de toque do modelo econômico e ideológico que dá lastro às privatizações, não é aplicada no caso da concessão do transporte aquaviário no Estado do Rio de Janeiro?

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