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Bia Willcox

Empresária que escreve sobre relações de afeto, editora que fez Direito na UERJ, professora que dá palestras, mãe que produz conteúdos

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Um brinde à indiferença nas redes sociais, o melhor para 2018

As redes sociais são a Criatura que superou o Criador. Elas são os grandes vilões nascidos de algoritmos  que abriram as porteiras de nossas almas  para que vomitemos  ali todo o nosso ódio cultivado e, pasmem, sentindo um enorme prazer nisso

Aplicativo do Facebook em tela de celular 3/08/2017 REUTERS/Thomas White (Foto: Bia Willcox)
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Vivemos um lugar comum quando se trata de emoções: o amor e o ódio caminhando cada vez mais juntos, deixando de lado a indiferença ou qualquer outra ausência racional. Amor x ódio -  o que explica sentimentos opostos serem, ao mesmo tempo, siameses? O que explica, em algumas circunstâncias, odiarmos amar e amarmos odiar?

 A ciência vem chegando perto de descobrir algo que nos explique esse paradoxo: as áreas do putâmen e ínsula ativadas no cérebro pelo ódio são as mesmas das do amor romântico. Essa ligação pode explicar porque amor e ódio estão tão intimamente relacionados nas pessoas.

Sendo assim, não creio que  sentimentos siameses vão se neutralizar com a presença um do outro. Há que haver outro antídoto para tais sentimentos pouco razoáveis. E há: a famosa e difícil indiferença, atitude para os emocionalmente mais inteligentes.

Pensemos no amor apaixonado, em tese o polo positivo do sentimento antagônico que sentimos. Paixão é aquilo que nos faz raciocinar menos e sentir mais. Produzimos substâncias viciantes e desejamos que elas se envernizem em nossa corrente sanguínea. É sempre sobre  aquela pessoa, aquela causa  ou  aquele  hábito  que fazem você largar tudo, acordar cedo, sair cansado, acumular, se arriscar, dormir tarde, vibrar, sorrir e até chorar de emoção. É aquele momento  onde ficamos  enebriados com a droga do amor. Amar assim nos faz felizes. Nos faz viver um bem estar que poucas drogas farmacêuticas conseguem substituir.

 É o amor ardente, a nossa paixão positiva, que  nos dá contentamento e vontade de prosseguir. É a paixão que, se bem educada e com pepinos torcidos, torna o ser humano verdadeiramente humano e empático. Ela pode nos levar a vivenciar o amor universal, sentimento raro e quase utópico.
 
O grande perigo  é  quando desenvolvemos paixões  por ódios. É isso mesmo.Trata-se uma adicção qualquer em que  você precisa ler, saber, buscar, "stalkear"  quem você não gosta por cultivo do  ódio. É quando amamos odiar com todas as nossas forças. A paixão pelo ódio. Uma verdadeira ode ao ódio. Por que tanto ultimamente?

O ser humano vem sendo remodelado desde a última revolução industrial. Não que ele fosse essencialmente diferente do que é hoje, mas ele vem sendo treinado 24/7 a desenvolver estas paixões menos românticas do que gostaríamos e mais bélicas do que suporíamos.

O ser humano vem sendo modulado pelas ferramentas das quais ele passou a utilizar como extensão do próprio corpo - os aparatos tecnológicos que o contectam à grande rede. Em outras palavras, nós Humanos  hoje temos uma configuração corporal nova onde na ponta de nossos dedos, estende-se o teclado do celular ou de qualquer outro computador Como continuação de nossos corpos. Acredito até que em menos tempo do que se pensa, nem precisaremos de tantos aparatos - teremos chips e projeções na pele. Nosso corpo e configuração já vem mudando. Acreditem. Não sou uma aficionada por filmes futuristas de sci-fi. Falo da nossa grande revolução e isso é real e agora.

O ser humano hoje emite todas as opiniões possíveis sofrendo um número absurdo de influencias nas redes sobre uma infindável gama de informações a que é exposto. Portanto, ele segue, venera, idealiza, rejeita e é rejeitado, insulta e é insultado, humilha e é humilhado e, sobretudo,  odeia com toda a paixão possível.

As redes sociais são a Criatura que superou o Criador. Elas são os grandes vilões nascidos de algoritmos  que abriram as porteiras de nossas almas  para que vomitemos  ali todo o nosso ódio cultivado e, pasmem, sentindo um enorme prazer nisso. É quase inconsciente. Faz parte do processo.

Ou seja, redes sociais podem produzir nos humanos as mesmas endorfinas e serotoninas que um beijo apaixonado. Para os românticos isso é, no mínimo, estranho. Mas quem já se viciou no cultivo de ódio não sente assim: é um game onde se quer mais e mais odiar. É uma adicção de paixão: "me deixem com meus ódios, eu os injeto na veia a cada Facebook ou Twitter que abro ao longo do dia."

Não há mais a inibição, a censura ou os limites do razoável e da educação: as pessoas entram nas redes, xingam e ofendem sem qualquer cuidado, vergonha ou um mínimo de empatia. A classe e a elegância se foram com o exercício do ódio.
 
Entendendo bem o que se passa hoje com nossos cérebros (ou nossas almas, como preferir) ficará mais fácil   entender que 2018 não será um ano fácil no Brasil.

Se, como diz o ditado popular, a paixão cega, seja lá  a quem, imaginem num contexto de país onde muito mais de metade da população têm baixo grau de instrução, ou seja, menos chances de avaliar, analisar, buscar referências históricas, ou perceber as manipulações. Se até a "nata" da sociedade se seduz pelo ódio alheio, assimilando o que escuta sem digerir e caindo nas ciladas "como um pato", que dirá a grande parcela que teve poucas chances de aprender a discernir ou de adquirir aquela malícia académica de ler o hipertexto, de entender onde se quer chegar, de identificar o sujeito e a ideologia do discurso.

Por isso, todo o cuidado é pouco em 2018: eleições, polarizações, paixões à flor da pele e algo muito sério e sombrio que funcionará como rastilho de pólvora: as fake news.

Os perfis de gente que não existe (os famosos cyborgs ou personas) entrarão em nossas vidas falando mentiras e destilando veneno pra provocar ódio alheio, mantendo o nível de paixão e cegueira altos.

Haverá manipulação de fatos, edição de áudios e imagens e livres invenções para ludibriar. É o momento em que a Criatura vai desestabilizar os seus Criadores com muita sedução. Afinal, somos fascinados pelas redes da hora que acordamos à hora que vamos nos deitar.

O que posso desejar em 2018 é que busquemos a fonte da lucidez (pode ser em cápsulas ou xarope) e tentemos nos blindar das ciladas que nos manipulam e nos jogam na sargento da humanidade, expondo o que há de pior em nossa natureza deogada de paixão pelo ódio.

Se não cabe a paixão romântica e inofensiva aos outros, que busquemos a sábia indiferença dos mais inteligentes, confundindo e desestabilizando os algoritmos nossos de cada dia.

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