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Paulo Roberto Andel

Estatístico, escritor, autor e coautor de 26 livros sobre esportes, crônicas, Rio de Janeiro, política, humor e poesia

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Um câncer político na cadeira presidencial

O Brasil, que já vinha baleado e se arrastando pelo chão, passou a agonizar desde 2019. Virou um país desgovernado, de ministros que envergonham o povo brasileiro e até o mundo com declarações fascistas e ignorância suprema

(Foto: Marcos Correa)
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O Brasil tem uma trajetória tortuosa em seus 520 anos. Primeiro, como colônia, sendo literalmente estuprado por mais de três séculos. Depois, forjado como império onde a maioria de servos deve atender a seus amos. Mais à frente, como uma república que sempre segregou os mais pobres, destinados a servir de mão de obra e nada além disso. 

O fato de ser o último país do mundo a acabar com a escravidão ajuda a entender muita coisa do que temos vivido. Há uma lacuna entre a Abolição e a CLT de quase meio século, indo de 1888 até Vargas. Neste período, a população negra foi jogada literalmente na vala. Os que conseguiam empregos na Era da Liberdade recebiam salários humilhantes, e a eles se somaram os retirantes do Norte e Nordeste. A formação das metrópoles do Sudeste é amparada nisso, com os prós e contras da questão. Mas indo direto ao assunto, é certo que o empresariado brasileiro, salvo exceções, nunca viu o trabalhador como um componente importante da sua engenharia de lucro. Na verdade, ainda impregnado pelo passado, teve em mente que fazia o favor de pagar a quem deveria ser na verdade um escravo - e não é à toa que, volta e meia, algum patrão inescrupuloso diz a seus funcionários que eles devem agradecer a Deus pelos seus postos de trabalho, como se o seu próprio bolso não devesse dizê-lo. 

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"A abolição vai quebrar a Economia".

"Os custos da carteira assinada vão quebrar a Economia". 

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"O décimo terceiro salário é desastroso para o país".

A ausência de visão periférica da maior do empresariado brasileiro, que muitas vezes carrega os mesmos sobrenomes do poder de cem ou duzentos anos atrás, contribuiu diretamente para que o Brasil sempre tivesse uma das maiores desigualdades sociais do mundo. Quanto mais gente na miséria, maior a probabilidade de se pagar menores salários. Não havia o menor interesse de fazer com que os mesmos trabalhadores assalariados tivessem poder de compra e consumo. Vender, para a classe média e a elite, ou ainda exportar. 

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Depois de séculos, o paradigma da exclusão foi quebrado na Era Lula. Não que boa parte do empresariado tivesse mudado de postura, mas o pleno emprego aumentou o consumo e, para quem só pensa em lucro, era o que importava. Só que veio junto um problema grave para os senhores de engenho contemporâneos, em duas vertentes. Primeiro, os mais pobres começaram a ocupar espaços inéditos: filas de supermercados, shopping centers, casas de espetáculos, cinemas e, para entornar o caldo de vez, aeroportos. Segundo: a prosperidade do país, associada às negociações laborais coletivas, elevou os salários - e para uma mentalidade empresarial ansiosa por escravos de carteira assinada, aquilo era o fim. 

Antes mesmo da crise econômica no governo Dilma, já se falava à boca nada pequena que os empregados ganhavam muito, que era um exagero. Qualquer pessoa que tenha tido mínimo contato com entidades de representação patronal sabe das falas. Um dos setores mais destroçados pela Lava Jato foi justamente um dos mais entusiasmados com a redução salarial e os atos que, de uma forma ou outra, levaram ao golpe de 2016: o da Construção. No mínimo, foi uma enorme traição, já que a Construção no Brasil só tem crescimento estatístico constante justamente nos governos do PT. Vibrante com o golpe, a Construção foi uma espécie de Carlos Lacerda em 1964: celebrou o que viria a ser sua própria tragédia. Mas é bom que se diga: o apoio ao golpe veio de todos os setores empresariais contemplados com a desoneração de Dilma, realizada em 2013. Não geraram empregos, não investiram, apenas comemoraram o reforço no caixa e sabe-se. 

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Dado o golpe, a Ponte para o Futuro do golpista Michel Temer nunca foi tão arcaica, até medieval. Em nome da crise, era a hora de atender o patronato e destruir os direitos trabalhistas, com a falsa promessa da geração de empregos que, sinceramente, só os ingênuos e despreparados poderiam acreditar. Era o Brasil do século XXI voltando ao primeiro quartil do XX. Empolgados com a era da opressão, muitos empresários partiram para a dilapidação de empregos sem sequer raciocinar que atirariam nos próprios pés: afinal, o PIB depende de consumidores de todas as classes. Em dois anos e meio, o Brasil passou de uma crise econômica para a estagnação suprema. 

A cereja podre e envenenada do bolo estragado veio no fim de 2018. Com a máquina de ódio turbinada pela força econômica e jornalística, o Brasil elegeu um verdadeiro esgoto falante, considerado tão incapaz que precisou se humilhar recebendo negativas até conseguir um vice-presidente. O discurso fácil, os robôs e a aliança com o empresariado da fé neopentecostal, além das relações ruidosas com a opressão miliciana nas comunidades carentes, levou ao poder o mais inepto, despreparado, ignorante e preconceito presidente da República em todos os tempos, cujo escudo moral era um operador do mercado financeiro envolvido em escândalos - sem nenhum problema para boa parte da elite empresarial brasileira, pelo contrário: era até virtude. A proposta de um governo para poucos, os de sempre, os que sempre lutaram para deixar grande parte da população do lado de fora dos shoppings, dos mercados e até da vida: não é nenhuma novidade que o presidente eleito tenha feito várias manifestações para dizimar populares, todas em entrevistas que podem ser vistas no YouTube: "Tem que matar uns 30 mil" e outras.

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O Brasil, que já vinha baleado e se arrastando pelo chão, passou a agonizar desde 2019. Virou um país desgovernado, de ministros que envergonham o povo brasileiro e até o mundo com declarações fascistas e ignorância suprema. Um deles, mentalmente perturbado, chegou ao cúmulo de imitar o nazista Goebbels num vídeo. Outros já fizeram citações de discursos de Adolf Hitler. O Brasil foi tomado de assalto por nazistas caboclos e mamelucos posando de arianos, com toda a vergonha e o ridículo que cabem nesta sentença. Enquanto isso, dezenas de milhões de trabalhadores foram descartados, assim como o eram os escravos doentes. Os menos desafortunados viraram motoristas de aplicativo. Os mais jovens e empobrecidos viraram entregadores de aplicativo. Ninguém tem qualquer direito trabalhista, o consumo das famílias desabou, as falências e inadimplências dispararam, o dólar disparou e os rentistas comemoraram feito fosse um gol de Copa do Mundo, ainda que o Brasil tenha tido a maior fuga de capitais da sua história em 2020. Por ironia do destino, vários empresários golpistas, especialmente médios e pequenos, quebraram a cara de verde e amarelo. O Governo Federal nada tem a oferecer, exceto bravatagem diária para criar manchetes e jogar cortinas de fumaça sobre a incompetência caótica que desfralda a olho nu. Agora, parte do grande empresariado ainda cativa seu mito de estimação, e é corresponsável por toda a desgraça imposta a dezenas de milhões de brasileiros, junto com os principais meios de comunicação, o inescrupuloso empresariado da fé e o crime organizado. 

Há duas ou três semanas, o Brasil é refém de uma pandemia gravíssima que assola o mundo. Todos os países afetados precisaram tomar ações imediatas de isolamento. Os que demoraram a agir estão carregando corpos em empilhadeiras e fazendo necrotérios em shopping centers. Na contramão da racionalidade mundial, amparada em ciências, o degenerado que senta na cadeira de presidente vai às ruas, gasta milhões com uma propaganda sórdida e diz que é preciso encarar o Covid19 como "homem", para evitar o colapso econômico do Brasil. Nunca os microfones da República estiveram a serviço de uma criatura tão ignorante, insensata e desprovida das mínimas faculdades mentais para estar ali. Uma pedra, uma parede ou um bueiro fariam pronunciamentos bem melhores. E aí se percebe de vez a tragédia que foi eleger a figura de Jair Bolsonaro.  

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Mas não basta apenas o primitivismo e a hostilidade de um presidente boçal, que não anda mas galopa. É preciso mentir, mentir até à morte. A economia brasileira não vai morrer por causa da quarentena, uma necessidade mundial que irá afetar todo o planeta. Na verdade, ela já estava morta ANTES da quarentena, porque se arrasta há quatro anos e agravou-se a partir de 2019 atendendo os interesses da nobreza brasileira, deixando a plebe para que morra ao vento e atenda aos princípios nazifascistas da necropolítica. A economia brasileira só pode ser resgatada se fazendo o contrário de tudo o que aí está - e, para isso, Jair Bolsonaro precisa imediatamente deixar de ser o que, na prática, nunca foi: um presidente de fato, capaz de enfrentar os problemas brasileiros. 

Três tragédias sem par nos ameaçam. 

Uma delas, o Covid19, já espalhou morte pelo Brasil e a luta agora é pela redução dos danos. Precisamos ficar em casa, ajudar os necessitados e esperar o fim dessa tempestade. 

A segunda é a mentalidade medieval de empresários em passeata dentro de carros, exigindo que seus funcionários se arrisquem em condições lotadas - são a reencarnação dos inimigos da Abolição. 

A terceira é o câncer político instalado na cadeira presidencial. É preciso agir imediatamente antes que uma metástase leve o país ao caminho irreversível do óbito. 

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