CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
Rogério Puerta avatar

Rogério Puerta

Engenheiro agrônomo, atuou por doze anos na Amazônia brasileira em projetos socioambientais. Atuou em assentamentos da reforma agrária no Distrito Federal por dez anos e atualmente vive em São Paulo imerso em paixões inadiáveis: música e literatura. Escreveu diversos livros

47 artigos

blog

Vila Mussolini

"Se Vila Adolf Hitler fosse, também não se incomodariam?"

(Foto: Mário Gonçalino)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Bom Dia 247: deliciosa saudação a um novo dia de labuta que acompanhamos pela internet. Breno Altman, num destes programas, recomendou o livro, o primeiro em trilogia, "M - O Filho do Século", de Antonio Scurati, Editora Intrínseca. Ótima dica de leitura, em especial em tempos de neofascismo modo Terra Brasilis grassando. Benito Mussolini o protagonista do livro.

Leiamos e nos informemos, de tudo o quanto for de interesse ou, caso desinteressante, de tudo quanto for necessário, praticamente obrigatório. Um chamado atual ao estudo compulsório a quem queira exercer sua cidadania plena e inserção democrática em qualquer sociedade. A imperiosa necessidade de ler e estudar o enfoque contemporâneo, agradem a você determinados temas mais penosos e entediantes ou não.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Mein Kampf de Adolf Hitler, defendo, deve ser lido. Li e recomendo. Que venham as pedradas. No livro a grande maioria das narrativas nos foge em contexto geopolítico temporal. O autor fala da cena geopolítica de sua contemporaneidade, cita nomes que desconhecemos quase todos, países que nem mais existem. Discorre também sobre suas teorias de ódio étnico, eugenia, e convence quem queira de fato ser convencido e se identifique com a narrativa.

Olavo de Carvalho, devo dizer, não consegui virar página, dizem que escreve bem. O não separar autor de sua obra parida considero um fundamento coerente. Mein Kampf pareceu mais necessário. Se o atual presidente neopentecostal escrever o melhor livro de ficção científica de todos os tempos na história do Brasil, um gênero literário particularmente muito estimado, pouco ou nenhum interesse me despertará.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Por uma obrigação jornalística muitos assistem as famigeradas lives de quinta-feira do neofascista no poder. Não consegui suportar dez segundos, sem fígado apto. Quem porventura queira apedrejar e taxar de antissemita este que escreve, que considere os que assistem as tais famigeradas lives. Quiçá, talvez, mal ou bem comparando, estejam estes espectadores em mesmo patamar de sadismo quando relacionados ao satanizado Mein Kampf. E milhões assistem as tais lives.

Na ótima dica de leitura de Breno Altman, vê-se que personagens históricos tais quais o Marechal Badoglio e o próprio Mussolini viraram a casaca, aderiram ao fascismo vindos desde o seu exato político oposto, Mussolini desde o movimento sindical socialista. Ambos e outros ilustram escandalosamente os nomes de logradouros, nada menos, do que da chamada Vila Mussolini, no bairro Rudge Ramos, município de São Bernardo do Campo, região do ABC paulista. O "B" ao lado do A e C de Santo André e São Caetano do Sul.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

ABC paulista já fundido com o município vizinho, a megalópole São Paulo. Presença forte de imigrantes em décadas passadas, tal qual ocorreu em tantos lugares, bairros inteiros de São Paulo onde se fizeram muito presentes os italianos e espanhóis principalmente. ABC paulista berço do sindicalismo e de Lula, um forte histórico dentre as indústrias automotivas lotadas de proletários nas décadas de 70 e 80.

Na vila são-bernardense alguns saudosistas de Il Duce de plantão talvez, quando da fundação desta porção do bairro no passado. Daquelas pessoas comparáveis as que saíram na fotografia do Duce dependurado ao lado da amante, vingado pelo povo em meio a capitulação da Itália na Segunda Guerra.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Bem plausível que dentre os da fotografia alguns apoiadores apaixonados, querendo descolar da testa o adesivo de fascistas para viverem o pós-guerra se escondendo, mas talvez nem tão arrependidos ou sequer nem tão envergonhados.

Breve observação: a tipografia do português e outras línguas soa falha ao nos referirmos à letra i quando inicial maiúscula. Assim, Il Duce, Ilana Casoy, por exemplo, sem nenhuma comparação adicional à autora, por óbvio, são estas algumas palavras assim grafadas, o i maiúsculo geralmente muito similar à letra ele minúscula. Leia-se, "il Duce e ilana Casoy", ela uma autora de ótimos livros.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Duce um título ou alcunha, "il" o artigo masculino "o" em italiano. Il Duce portanto "o líder" ou "o duque". Adendo aqui a uma chatice de escritor metido à besta.

Diferenças mil dentre homenagear em vida ou postumamente e, por outro lado, citar a personalidade histórica em museu ou biblioteca, isto imprescindível. Ponte Costa e Silva, ele um ditador militar, inaugurada em Brasília. Bandeirantes, as avenidas, praças às dezenas Brasil afora em homenagem aos desbravadores das matas e dos sertões. Mais polêmicas e pedradas.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Sim, foram os bandeirantes personagens históricos importantíssimos, mas valeria considerar o papel nítido de limpadores étnicos, imbuídos que foram de desbravar, ou seja, combater os bravios, adentrar territórios dos povos pré-colombianos originais, e removê-los bruscamente. Quando muito dar-lhes uma escolha dificílima: a cruz ou a espada. A espada prevaleceu, historiadores atestam.

Em poucos quarteirões, Vila Mussolini homenageia comendadores, duques, militares, conde, um rei e um vice-rei. Injusto taxar todos de simpatizantes ou colaboradores ao fascismo do Duce, mas tal relação é, de fato, a mais plausível.

Rodolfo Crespi editou jornal em São Paulo voltado aos imigrantes italianos simpáticos ao fascismo. Pinotti Gamba dentre os bem-sucedidos empresários brasileiros financiadores. Rei Vitório Emanuel, aportuguesado de Vittorio Emanuele, nada menos protagonizou a geopolítica de invasão e matanças na Etiópia e região e formalizou a implantação do fascismo de Mussolini.

Gabriel D'Anunzio aportuguesado de Gabriele D'Annunzio inspirou teoricamente ideais fascistas. Marechal Badoglio virou casaca e decidiu apoiar o recém-inaugurado fascismo de Mussolini. Laureado como vice-rei da Etiópia, comandou o uso de gás tóxico em campo africano, violando o Protocolo de Genebra da época recém-ratificado pelos próprios italianos. Duque D'Aosta um oficial da Marinha Real Italiana em pleno palco de águas da Segunda Guerra Mundial.

São personalidades históricas homenageadas em ruas de Vila Mussolini, este próprio ilustre líder relembrado póstumo talvez ele uma das maiores inspirações ao seu colega em sadismos germânico, o qual foi agraciado com o envio de armamentos e militares italianos lançados ao martírio, lado a lado de tropas nazistas mais bem preparadas.

De se supor que os fascistas italianos, tanto quanto os nazistas em escapada no pós-guerra, tenham buscado terras de além-mar como refúgio, o que de fato ocorreu em especial dentre as regiões de clima temperado na América do Sul. O oposto também aconteceu. Gente perseguida pelo fascismo e nazismo na Europa ou que, desiludida após os intensos e traumáticos confrontos e desesperanças, gente vilipendiada, tenha buscado outras terras mais distantes e mais oxigênio à mente e ao coração.

Adendo à situação espanhola, onde o "Generalíssimo" Franco mostrou-se um fascista de mão-cheia, sagaz e astuto o suficiente para manter-se um pouco afastado de Hitler e Mussolini. Não poucos se viram forçados a zarpar da Espanha em busca de terras sul-americanas de língua similar.

Em São Bernardo do Campo houve, no passado, tentativa da Câmara Legislativa local quanto a alteração do nome da vila. Vários anos após, em plena pandemia, o mundo de ponta-cabeça e o neofascismo grassando, nova tentativa, desta vez isolada.

Estratégia equivocada. Com a restrição sanitária de circulação, buscou-se a divulgação quanto a proposta de alteração do nome da vila via um grupo de WhatsApp local, dentre os moradores. Um grupo de vigilância comunitária solidária, daqueles em que participantes alertam sobre atitudes suspeitas no bairro e divulgam o desaparecimento de um cãozinho de estimação pelas redondezas.

A proposta inicial de alteração de nomenclatura sugerida aos moradores até que foi simpática: alterar o nome desde Vila Mussolini para Vila Monte Castello, onde pracinhas da FEB na Segunda Guerra Mundial enfrentaram tropas de Hitler em plenas terras de Mussolini. A estratégia equivocada já mencionada seria fácil de se prever e de se evitar. O que se espera de um grupo de segurança comunitária, daqueles onde quem mais atua é o pessoal do "Bandido bom é bandido morto" ou do "Tiro na cabecinha"?

Deu errado, por óbvio. Uma enquete prévia mostrou reprovação inicial da proposta ou, quando muito, total indiferença. Seria também indiferente se morássemos em Vila Adolf Hitler? Por que então Mussolini não incomoda tanto? De certo por nossa ignorância histórica. Dentre o criador e a criatura não pode haver distinção significativa quanto as responsabilidades de seus atos. Historicamente não se mostra exagerado reputar ao italiano uma inspiração quase fundamental ao seu colega germânico.

Em paralelo à enquete prévia junto aos moradores e moradoras, buscou-se oficialmente a gestão de uma empresa multinacional alemã situada na vila. Nova negativa, esta imprevista. Esperava-se que, em terras matrizes alemãs onde a legislação é rigorosa quanto as referências nazistas, houvesse, também em solo estrangeiro onde as empresas se façam presentes, ao menos alguma consideração ou reconhecimento. Nada.

Há dois anos novos legisladores e legisladoras eleitas em São Bernardo do Campo. Um resgate de tentativa de mudança de nome da vila desde a Câmara municipal, tentativa esta desde lá vinda há mais de década, seria uma grata saudação a um novo Governo Federal. Quiçá, oxalá, torçamos que novo mesmo, um governo que estará disposto a arrefecer tanto quanto possível a insana e contaminante febre neofascista presente em Terra Brasilis neste exato deprimente momento histórico.

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Carregando os comentários...
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO