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Heraldo Campos

Graduado em geologia (1976) pelo Instituto de Geociências e Ciências Exatas (UNESP), mestre em Geologia Geral e de Aplicação (1987) e doutor em Ciências (1993) pela USP. Pós-doutor (2000) pela Universidad Politécnica de Cataluña - UPC e pós-doutorado (2010) pela Escola de Engenharia de São Carlos (USP)

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Vocação para maldade

Alguém tem dúvida que sabotar a educação não é uma das maneiras de subjugar os povos para a perpetuação no poder e sob o domínio de poucos poderosos?

Militares ocupam as ruas após golpe de 1964 (Foto: Reprodução/TV Brasil)

Outro dia, dando uma zapeada na TV, caí na TV Senado e estava passando o excelente documentário “Vocacional – Uma Aventura Humana” [1] sobre as seis escolas vocacionais que existiam no Estado de São Paulo nos anos 60 do século passado.

Uma dessas escolas era o “Ginásio Vocacional Oswaldo Aranha” que funcionava (e funciona) no bairro do Brooklin, localizado na Zona Sul da capital paulista. As outras cinco escolas eram espalhadas pelo interior do Estado nas cidades de Batatais (“Ginásio Vocacional Cândido Portinari”), São Caetano (“Ginásio Vocacional de São Caetano do Sul Vila de Santa Maria”), Americana (“Ginásio Vocacional Papa João XXIII”), Rio Claro (“Ginásio Vocacional Chanceler Raul Fernandes”) e Barretos (“Ginásio Vocacional Embaixador Macedo Soares”).

Não estudei no “Ginásio Vocacional Oswaldo Aranha”, mas tenho amigos que sim. Fui pesquisar sobre o assunto e encontrei essa informação: “Nos anos 1960, foi criado por legislação o Serviço de Ensino Vocacional do Estado de São Paulo (SEV), composto por seis ginásios vocacionais, entre os quais o Ginásio Oswaldo Aranha, inaugurado em 1962. A proposta dos vocacionais era desenvolver uma educação interdisciplinar, trabalhando com a personalidade do aluno para que ele desenvolvesse suas habilidades. Uma visão pedagógica que se mostrava antagônica àquela que a ditadura procuraria estimular, mais voltada para o acúmulo de conhecimentos técnicos úteis ao mercado de trabalho. Os conflitos entre o ginásio e o regime não tardariam a se expressar, até que em 1969 Maria Nilde Mascellani, coordenadora do programa, foi afastada da função. Acentuada pela vigilância e ameaças de corte de verbas, uma invasão policial combinada em todos os colégios do SEV no mesmo ano levou ao encerramento da experiência pedagógica, com a intervenção da Secretaria no serviço.” [2]

Vale ressaltar que a vocação para maldade dos governos ditatoriais, com relação a projetos inovadores de educação, aconteceu em um passado não muito distante e, lamentavelmente, persiste nos dias de hoje em vários países, visando minar o ensino  (e a sua destruição ao final do plano) para as pessoas nos seus mais distintos níveis.

Tomando por exemplo o Brasil, é só ver os caminhos que tomaram a ditadura de 1964 a 1985 e a proto-ditadura de 2019 a 2022 e que, certamente, seguiria com uma nova ditadura, que não se consumou com o golpe de 08/01/2023 articulado, como sabemos, com certa antecedência pelos militares de plantão. Alguém tem dúvida que sabotar a educação não é uma das maneiras de subjugar os povos para a perpetuação no poder e sob o domínio de poucos poderosos?

“Lavar as mãos do conflito entre os poderosos e os impotentes significa ficar do lado dos poderosos, não ser neutro. O educador tem o dever de não ser neutro.” - Paulo Freire.

Fontes

[1] “Vocacional – Uma Aventura Humana” documentário de Toni Ventura de 2011.

https://www.youtube.com/watch?v=1NB7FZxdEwg

[2] Memorial da Resistência.

https://memorialdaresistenciasp.org.br/lugares/ginasio-vocacionaloswaldo-aranha/

*Heraldo Campos é geólogo (Instituto de Geociências e Ciências Exatas da UNESP, 1976), mestre em Geologia Geral e de Aplicação e doutor em Ciências (Instituto de Geociências da USP, 1987 e 1993) e pós-doutor em hidrogeologia (Universidad Politécnica de Cataluña e Escola de Engenharia de São Carlos da USP, 2000 e 2010).

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.