Você é de esquerda? Os outros precisam saber
"O avanço do extremismo de direita me parece estar sendo oportunizado pela não existência de um dique que lhe contraponha"
Um curso de água sem suas margens cobertas pelas matas ciliares é favorecido para o alargamento do seu leito, tem facilitada a ocorrência de erosão que leva aos oceanos o que vê pela frente. Às vezes, é com esses traços que vejo a tela em que está sendo pintada a sociedade brasileira nos dias de hoje. O avanço do extremismo de direita me parece estar sendo oportunizado pela não existência de um dique que lhe contraponha.
E esse dique, sem dúvidas, são as ideias libertárias, humanistas e inclusivas que constituem o conteúdo da visão de mundo da esquerda e, em alguns casos, da centro-esquerda.
É verdade que o trabalho realizado pelo lawfare patrocinado por agentes públicos a partir de Curitiba intimidou a imensa maioria daqueles que constroem a resistência. Milhares de páginas de jornais e revistas, bits na internet, palavras jogadas irresponsavelmente pelas ondas do rádio, um sem-número de horas de telejornais fizeram o serviço.
Mas já passou da hora de retomar a disputa. Disputa que não se trava nem a partir e nem por conta de governos. É no cotidiano da vida real que será recolocado o curso para o leito normal. A imensa maioria da sociedade brasileira não é de direita — e muito menos de extrema-direita. Ela está em disputa, com perfil maior para se inclinar ao centro e à esquerda, mas se encontra inebriada pelo discurso raso da direita e, ainda, por uma boa pitada de anti.
Tenho acordo que se faz necessário o ajuste no conteúdo, na forma e nas ferramentas a serem utilizadas para isso. Seria preciso calibrar o discurso, aproximando-o mais da visão média da maioria, para se conquistar terreno passo a passo? Dominar melhor os novos canais? Trabalhar temas e pautas segmentadas de forma segmentada? Tudo isso é necessário. Do jeito que era feito já se mostrou incapaz de exercer a força exigida pelo momento.
Mas, enquanto não se encontram as respostas a essas e outras perguntas que martelam o debate diário entre dirigentes e militantes de esquerda, penso que algo simples seja possível. É preciso que as pessoas, no seu dia a dia, falem mais que são de esquerda — para que mais pessoas ouçam. Pode até não ser a volta do uso de bottons com estrelas ou foices, ou com imagens de Marx, Lênin, Rosa, Trótski ou Gramsci. Mas se for, ótimo. Contudo, verbalizar um simples sou de esquerda já terá cumprido uma parte importante da tarefa que se apresenta.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

