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“Brasil luta para que a sustentabilidade seja um valor nacional”, diz pesquisadora

Pesquisadora que coordenou a primeira pesquisa nacional sobre meio ambiente no Brasil reflete sobre a evolução da consciência ecológica desde a Rio 92

Samyra Crespo, ambientalista e doutora em História da Ciência pela USP (Foto: Ricardo Lima/Reuters | Divulgação )

Beatriz Bevilaqua, 247 - A historiadora e pesquisadora Samyra Crespo tem o raro privilégio de ter acompanhado, a partir das instituições e das políticas públicas, a construção da consciência ambiental no Brasil. 

Nascida em Belo Horizonte, doutora pela USP e ex-pesquisadora do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, Samyra coordenou, em 1991, a primeira pesquisa nacional sobre o que o brasileiro pensa do meio ambiente. Este foi um trabalho pioneiro que marcou a história da Rio 92, conferência global que projetou o Brasil no cenário ambiental internacional.

“A pesquisa foi uma ponte entre governo e sociedade civil num momento em que esses dois mundos ainda não se misturavam”, lembra Samyra. “Nós queríamos entender o que o brasileiro pensava de meio ambiente e como isso poderia orientar políticas públicas.”

Desde então, a pesquisadora manteve viva a série “O que o Brasileiro Pensa do Meio Ambiente”, repetida a cada quatro anos até 2012. O levantamento ajudou a mapear a evolução da consciência ecológica no país e revelou tendências profundas sobre a forma como o brasileiro compreende temas como poluição, desmatamento e sustentabilidade.

“Na época, falava-se em ‘ecologia’. O termo ‘meio ambiente’ só se consolidou depois, junto com o conceito de ‘desenvolvimento sustentável’, que ninguém sabia exatamente o que era”, explica. “Hoje, essa ideia está consagrada nas políticas públicas, nas empresas e nas ONGs.”

Ao relembrar o contexto da Rio 92, Samyra destaca que o Brasil vivia um momento de diversificação de vozes: ambientalistas, movimentos de mulheres, lideranças espirituais e empresários participaram de um mesmo debate. “Foi um tempo em que o ambientalismo se tornou plural, e o país começou a se ver como ator global nessa agenda”, diz.

Entre os avanços, a pesquisadora ressalta a recuperação da camada de ozônio e o compromisso do Brasil em assinar tratados internacionais de combate à poluição. Mas também reconhece que o mundo enfrenta hoje um cenário alarmante.

“Sete dos nove limites planetários já foram ultrapassados. Estamos tornando o planeta hostil à vida humana e de outras espécies”, alerta. “Mas acredito que cada geração dá o seu melhor diante dos desafios que enfrenta.”

Apesar do diagnóstico preocupante, Samyra mantém o otimismo: “Nós, ambientalistas, somos pessimistas no diagnóstico, mas otimistas na ação. Acredito nas novas gerações e mesmo que não estejam todas nas causas ambientais, elas estão engajadas em lutas por justiça social, igualdade e cultura. E tudo isso faz parte da sustentabilidade.”

Para a pesquisadora, compreender a crise climática exige também entender a ciência como campo de disputa e debate, não como bloco único. “A ciência nunca foi unânime. Houve correntes progressistas e conservadoras, e o consenso sobre as mudanças climáticas levou tempo para se formar”, afirma. “Mas hoje há um entendimento global de que o aquecimento do planeta é real e de origem humana, logo esse consenso precisa guiar a ação.”

Ao olhar para o futuro, Samyra aposta na força da educação ambiental e na mobilização cidadã: “O que começamos nos anos 1990 com idealismo e militância precisa agora se transformar em política de Estado e cultura de vida. Sustentabilidade não é um tema e sim uma forma de existir.”

Assista a entrevista na íntegra aqui: