As drogas e a sociedade brasileira
Será o que o crack é nesse momento a droga que merece ser tratada com mais atenção? É ela que representa realmente os maiores riscos para nossa sociedade?
Vivemos um momento em que um dos temas centrais de nossa sociedade é a questão das drogas.
Pesquisa do Ministério da Saúde apontou que uma das principais demandas das famílias brasileiras é por um programa que as oriente o uso abusivo de drogas, conforme retratado em excelente matéria publicada na revista Época (acesse aqui) http://bit.ly/sia2yQ.
Já pesquisa desenvolvida pela USP / UNESCO apontou que as escolas brasileiras são os principais pontos de difusão e comercialização de drogas, sendo que os estudantes de escolas privadas consomem drogas ilegais, em média, 30% mais que o estudante de escolas públicas, gerando, também, uma das maiores demandas do coletivo escolar brasileiro: um programa de capacitação continuado que os habilite a atuar com essa questão.
Como não podia deixar de ser, as drogas interferem diretamente na produtividade dos trabalhadores, o que tem levado as empresas a não pouparem esforços para investirem em programas de prevenção e tratamento para seus funcionários de todos os escalões.
De acordo com matéria publicada em 17/07/2011 pelo Jornal Folha de São Paulo, o número de trabalhadores licenciados pelo INSS no primeiro semestre de 2011 "cresceu 22% em relação ao mesmo período de 2010 por problemas causados por uso de drogas ilícitas como cocaína e abuso de remédios sedativos e estimulantes, como antidepressivos e ansiolíticos (para controle da ansiedade).
Dos executivos, 15% usam substâncias psicoativas, segundo pesquisa do HCor (Hospital do Coração) com 829 pessoas de abril de 2009 a março de 2010, obtida com exclusividade pela Folha."
Diversos estudiosos no assunto têm repetidamente nos chamado a atenção para o crack, que é, sim, uma droga que exige um olhar diferenciado, mas sequer é a mais letal no momento.
A despeito de somente umas poucas substâncias que produzem efeitos psicotrópicos serem classificadas como proibidas, surgem a todo momento drogas com efeitos devastadores, as chamadas drogas sintéticas, sobre o que o Estado não tem e nem pode ter nenhum controle.
Na Rússia, por exemplo, o equivalente ao nosso “crack” é uma droga denominada de “krokodil”. Sua matéria prima é a borra da heroína e além de provocar dependência quase que imediata, é injetada e necrosa rapidamente o tecido do local onde for injetada aplicada mais de uma vez.
É cada vez mais evidente que a política mundial atual para as drogas está falida, com movimentos de diversos setores de nossa sociedade solicitando por mudanças urgentes.
E qual a resposta do governo brasileiro para essa demanda?
Um programa pífio, reconhecido por todos como inapropriado, a começar por seu nome:
CRACK É POSSÍVEL VENCER!
Observem que a frase induz ao erro de que a ÚNICA droga que merece atenção é o CRACK e que todas as demais (heroína, cocaína, álcool, oxi, merla, ...) são sem importância, quem sabe até inofensivas.
Uma outra questão que salta aos olhos nesse título é: podemos vencer a quem? Quem deve ser vencido?
Além disso, suas metas até 2014 são pífias, como por exemplo:
• implantação de 308 consultórios de rua até 2014. Como o crack está presente em aproximadamente 5000 municípios, o que fazer com 308 ônibus?
• criação de 2.462 leitos para dependentes químicos, o que representa que se cada leito for usado por um período de 30 dias para desintoxicação (período padrão) teremos aberto vagas para tratamento de 29.544 usuários abusivos de drogas por ano. Como o Ministério da Saúde estima que temos algo em torno de 30 milhões de usuários abusivos de drogas no Brasil essas 29.544 novas vagas são absolutamente irrisórias.
Mas será o que o crack é nesse momento a droga que merece ser tratada com mais atenção? É ela que representa realmente os maiores riscos para nossa sociedade?
Pesquisa do Ministério da Saúde nos fala que 85% das mortes causadas por overdose de drogas lícitas ou ilícitas são provocadas pelo álcool, sem levar em consideração os incidentes e acidentes provocados em decorrência do consumo, o que acrescentaria muitos outros pontos percentuais na conta do álcool.
Por fim, se existe realmente alguma preocupação de nossos governantes com o consumo de drogas em nosso país, por que não se desenvolve políticas maciças de prevenção?
Por que continuar com a política de enxugar gelo em relação as drogas?
Que interesses estão por trás dessa questão que vale a vida de milhões de brasileiros?
Até quando todos nós assistiremos passivamente todos esses descalabros como se as drogas fossem uma questão que não nos dissesse respeito.
“Primeiro entraram em nosso jardim e roubaram uma flor.
Nós não dissemos nada.
Depois o mais frágil deles entra em nosso quintal e mata nosso cão.
Nós não dissemos nada.
Depois conhecendo nosso medo, roubaram a lua, e arrancaram-nos a voz da garganta.
E como não dissemos nada, não podemos dizer mais nada.”
Vladimir Maiakóvski
Paulo Silveira é fundador da Da Vinci Marketing Social e membro do movimento Respeito é BOM e Eu Gosto!
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