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Família Caiado descumpre decisão do STF e mantém ocupação em área quilombola em Goiás

Mesmo após ordem de Edson Fachin, moradores da Antinha de Baixo seguem impedidos de retornar às próprias casas em Santo Antônio do Descoberto

Família Caiado descumpre decisão do STF e mantém ocupação em área quilombola em Goiás (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

247 - Mais de dois meses após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar a devolução das casas aos moradores da comunidade Antinha de Baixo, em Santo Antônio do Descoberto (GO), as famílias seguem impedidas de retomar suas moradias. Integrantes da família Caiado continuam ocupando a área, mesmo após a decisão que reconheceu a autodeclaração quilombola da região.

De acordo com reportagem do Metrópoles, a disputa envolve 32 imóveis que foram desocupados após decisão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), posteriormente anulada pelo STF. A ordem mais recente, assinada pelo ministro Edson Fachin, cassou a medida que colocava as terras sob controle dos herdeiros ligados à família do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).

Segundo Fachin, ao considerar o autorreconhecimento da comunidade como quilombola, a continuidade da desocupação poderia causar “prejuízos irreversíveis” aos processos de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação do território, conforme estabelece o Decreto 4.887/2003.

Em visita à região na última semana, a reportagem do Metrópoles constatou que as famílias não conseguiram voltar para as casas que haviam sido derrubadas. Um dos imóveis, anteriormente utilizado por moradores, funciona atualmente como uma espécie de quartel-general, abrigando pessoas ligadas à família dos políticos.

No local, foram encontrados tratores, carros, esferas de arame, roupas no varal e placas de identificação da propriedade, incluindo uma com os dizeres: “Sítio Macaúba: espólio de Maria Paulina, propriedade particular. Não entre!”. Maria Paulina Boss, já falecida, é tia do governador Ronaldo Caiado.

A disputa judicial remonta a uma decisão do TJGO, ainda na década de 1990, que reconheceu como herdeiros da área três pessoas: Luiz Soares de Araújo, Raul Alves de Andrade Coelho e Maria Paulina Boss.

Em 28 de julho, a juíza Ailime Virgínia Martins, da 1ª Vara Cível de Santo Antônio do Descoberto, determinou o cumprimento dessa decisão, autorizando a desocupação compulsória de 32 imóveis e a transferência da posse aos herdeiros. Como dois deles já são falecidos, os descendentes passaram a ser os beneficiados.

Entre os herdeiros está o desembargador Breno Caiado, primo do governador, que atuou como advogado no processo até 2023. Outro herdeiro é o empresário Murilo Caiado, também primo de Ronaldo Caiado, que esteve presente na região durante as desocupações.

Após a repercussão do caso, no início de agosto, os moradores obtiveram três decisões favoráveis no STF, Justiça Federal de Anápolis e no próprio TJGO.

As decisões suspenderam as derrubadas para que fosse apurada a autodeclaração quilombola da comunidade. Com isso, a Justiça Federal passou a ter competência exclusiva sobre o caso, retirando do TJGO a prerrogativa de emitir novas ordens de despejo.

Posteriormente, em decisão divulgada no dia 24 de setembro, o ministro Edson Fachin determinou que os herdeiros deixassem a área, garantindo a devolução integral das terras aos antigos moradores da Antinha de Baixo.

A atuação da União no processo foi reforçada após o Incra solicitar à Advocacia-Geral da União (AGU) que ingressasse no caso, diante da declaração dos moradores de que a área é ocupada por uma comunidade quilombola há cerca de 400 anos. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já estabeleceu, desde 2014, que áreas com esse perfil estão sob competência da Justiça Federal.

Mesmo antes da comprovação definitiva, o STF entendeu que a autodeclaração é suficiente para garantir a preservação da área e de seus habitantes.

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