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Brasil

Fazendeiros baianos em guerra contra o Estado

O reconhecimento de 54 mil hectares de terras como indígenas por parte do STF põe fim a uma história de muitas mortes e abre outra guerra, a dos fazendeiros contra o Estado da Bahia

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A decisão do STF que reconheceu como reserva indígena 54 mil hectares de terras entre Pau Brasil, Camacã e Itaju do Colônia, onde estão 186 fazendas, um marco histórico; põe fim a um conflito de mais de 40 anos que custou muitas vidas.

Às vezes um índio aparecia morto, aparentemente sem conflito evidente. Noutras invadiam fazendas que diziam ser deles expulsando os fazendeiros. Nos últimos anos, tais conflitos eram uma rotina. Em dois deles estávamos lá.

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Em 20 de abril de 1997 eu e o fotógrafo Marco Aurélio estávamos em Porto Seguro para cobrir a festa do Dia do Índio que aconteceria dia seguinte em Coroa Vermelha, Santa Cruz de Cabrália, o local em que o Frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa no Brasil, hoje núcleo da reserva pataxó.

À noite, já perto das 21 horas, recebemos o telefonema de Elizer Varjão, então chefe de reportagem de A TARDE.

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- Se mande para Pau Brasil porque tocaram fogo num índio em Brasília e ele é de lá.

Passamos a madrugada viajando, mais de 100 quilômetros ao norte. Amanhecemos na aldeia pataxó hã hã hãe, sete da manha do dia 21 estávamos na casa de Galdino. A viúva, Jucimara, soube da morte dele pelo Bom Dia Brasil, da Globo. Nós também.

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Foi aí que tomamos conhecimento, in loco, do velho conflito, pelo ponto de vista dos índios pataxós hã hã hães.

As terras foram demarcadas como reserva indígena na década de 30, em 1948 o governo baiano concedeu títulos a fazendeiros. Era uma área de cacau, terras valorizadíssimas, sinônimo de riqueza e campo fértil para a guerra.

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Até pensou-se que o ataque da vassoura de bruxa, no início da década de 90, facilitaria os entendimentos, com a suposta queda da valorização. Qual nada. No início do ano 2000, outro conflito desses. Os índios ocuparam duas fazendas. César Borges, governador, mandou a Tropa de Choque da PM, que teve a infeliz ideia de tentar invadir a área à noite. Os PMs foram emboscados perto da entrada da aldeia e um deles morreu no tiroteio.

Tiroteio verbal

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Em tais circunstâncias acontecia um detalhe curioso: nós, jornalistas, nos hospedávamos em Pau Brasil na pousada de D. Mary, a única, onde ficavam também alguns fazendeiros que moravam em Salvador e em tais ocasiões iam para lá acompanhar o caso de perto. Os fazendeiros tentavam fazer a cabeça dos jornalistas de que eles estavam cheios de razão.

Numa das vezes ousei dar uma opinião em contrário:

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- Eu acho que os índios estão certos.

Foi um terremoto. Quase apanho.

- Quem é você para dizer isso? Quem lhe concedeu tal autoridade? Se você não tem

autoridade então sua afirmação é um atrevimento! Aquilo lá não é índio, é um bando de aproveitadores!

Aprendi que o conflito virou uma história de ódio.

No lado dos índios, Nailton Pataxó rebatia com veemência:

- Índio é gente como qualquer povo. Tem os de bem, os estudiosos, os artistas e os canalhas. O que não é justo é nos espoliarem só por sermos índios.

Ainda bem que essa história virou a página. Os fazendeiros agora preparam uma legítima ofensiva judicial contra o Estado, que concedeu os títulos de propriedade anulados pelo STF.

Na área, um hectare de terra era negociado por R$ 6 mil, o que, se considerado apenas o valor da terra nua, pode prenunciar uma nova batalha jurídica por mais de R$ 300 milhões.

É outra longa batalha. A Constituição veda a indenização por terra considerada indígena, mas os produtores vão basear suas ações no argumento de que receberam, de boa fé, os títulos do Governo da Bahia.

Eles estão certos. De alguma forma, foram ludibriados pelo Estado. Mas esse é outro capítulo da mesma história, de final imprevisto em termos de tempo e incerto em termos de resultado.

Do próprio veneno

Para quem gosta de acompanhar fenômenos políticos, é instigante ficar de olho na greve dos professores da rede estadual na Bahia, que hoje completa 23 dias.

Os professores se queixam de um acordo não cumprido, o governador Jaques Wagner (PT) disse que já deu o que pôde, e não tem como atendê-los sob pena de infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Em suma, não tem acordo.

Em recente entrevista Cristovam Buarque, hoje senador do PDT, mas eleito governador do Distrito Federal pelo PT em 1998, admitiu que perdeu a campanha da reeleição em 2002 por causa de uma greve de professores.

- Errei do ponto de vista eleitoral ao não dar o aumento que eles pretendiam. Mas acertei ao fazer uma coisa que eu sabia, não ia poder cumprir.

Ora, Cristovam é um homem notoriamente comprometido com a educação e defende que a qualificação do ensino público passa necessariamente pela boa remuneração dos professores. Os grevistas nem tchum. Queria a satisfação da pedida deles e o governo que se vire.

A mesma coisa parece estar acontecendo com Jaques Wagner agora. Claro que o Distrito Federal é um território pequeno, tem apenas 5.802 Km quadrados, e a Bahia 567.295,669, quase 98 vezes maior, e greve de professores não tem força para destronar o governante de um território com essa vastidão, mas nem por isso deixa de desgastar.

Vaia amiga

Semana passada, em Irecê, Wagner foi vaiado por professores em greve. Na Assembleia, onde os grevistas estão acampados, todo governista leva vaia.

Não é só o fato de as lideranças grevistas pertencerem ao PCdoB, partido da base aliada, que instiga. Mas também a ironia do destino: Jaques Wagner, que construiu sua trajetória na área sindical, agora passa os seus piores momentos justamente em conseqüência da estratégia que o consagrou, a greve como instrumento de pressão, em fevereiro com a PM e agora com os professores.

Que greve é um ato político, não se discute. Por natureza sempre, por conveniência às vezes. Tanto que o movimento sindical sempre funcionou como um trampolim para a conquista de mandatos eletivos como aconteceu com Lula, Wagner e tantos e tantos que aí estão. Wagner apenas prova do próprio veneno.

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