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    Fichas sujas à beira de um ataque de nervos

    A tal da Ficha Limpa vai resolver toda a corrupção do País para causar tanto reboliço? Não tanto

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    Mesmo se não tivesse nenhuma serventia, a Lei da Ficha Limpa já teria prestado um grande serviço à nação brasileira. O de mostrar o quanto é difícil instituir no Brasil uma legislação que impõe uma nesga de moralidade num país que parece ter consolidado a corrupção como a luz do caminho para uma vida feliz.

    No Brasil, viceja a certeza da impunidade e a convicção generalizada de que dilapidar os cofres públicos é um crime que compensa. Nada há que um bom advogado não possa resolver. Rouba-se, rouba-se e rouba-se e se vive no mundo que todo mundo pediu a Deus, o sonho americano, morrer com as burras cheias de dinheiro. A nova lei é um pequeno passo para mudar isso. Já é alguma coisa.

    Dois anos atrás, quando foi aprovada, criou-se enorme celeuma em torno da validade dela ou não nas eleições de 2010. Muitos foram rifados do pleito em nome da nova legislação. Evocou-se um velho e consolidado conceito constitucional, uma lei aprovada agora só entra em vigor no ano subsequente. A tese prevaleceu e as punições não valeram. Agora, o STF discute nova tese: e vai valer para 2012?

    O MP ESTÁ NA ESPREITA

    A expectativa do julgamento dessa segunda questão foi o bastante para animar os nossos fichas sujas. Muitos deles, com condições políticas, mas sem chances legais de ostentar a condição de elegíveis, quando indagados por seus eleitores se serão candidatos em 2012 ou não, animam os interlocutores mandando-os 'esperar um pouco'. Agarram-se na última esperança de uma reversão, o que garantiria a impunidade plena de sempre.

    O primeiro voto no STF, do relator Luiz Fux, recomenda que a esperança é vã. Fux consagrou a validade da lei, o que deve ser seguido por seus pares por absoluta falta de argumentos minimamente plausíveis para ser de outra forma, segundo os nossos juristas.

    O que se discute é se a lei vai incidir sobre fatos passados. Por exemplo: se os que renunciaram a mandatos para fugir de cassação serão atingidos ou não (os casos dos deputados federais Jader Barbalho, do Pará, e Waldemar Costa Neto, de São Paulo, por exemplo). Pelo voto de Fux, também sim. Mas já é certo que quem tem contas rejeitadas por cortes colegiadas, como são os tribunais de contas e as Câmaras de Vereadores, será enquadrado.

    LADO BOM

    Se o processo de implantação da chamada Lei da Ficha Limpa é penoso, de outro tem um lado bom. Quando ela entrar em vigor, terá sido fruto de amplo e exaustivo debate, sinal de que virá para ficar. Os enquadrados que preparem o bolso para gastar muito com advogado na sustentação de uma batalha jurídica de vitória incerta, porque denunciantes não vão faltar.

    O procurador federal, hoje no Ministério Público Eleitoral, Vladimir Aras, é incisivo:

    - Não há sombras de dúvidas de que encaminharemos para a justiça todos os casos de quem tem contas rejeitadas. É o mínimo que poderemos fazer.

    Vladimir já acha que as leis brasileiras são extretamente generosas, não apenas com fichas sujas de lama, mas também com as sujas de sangue. Ele escreveu em seu blog, o blogdovladimir.wordpress.com, que se o caso Michael Jackson fosse no Brasil o médico Conrad Murray poderia ser condenado, mas dificilmente cumpriria pena.

    OS FICHAS SUJAS BAIANOS

    E quantos são os fichas sujas baianos?

    Ninguém sabe. Para nos atermos apenas a líderes municipais, que podem postular cargos no próximo ano na vastidão do território baiano, em 2010 o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) mandou para o TRE-BA uma lista com 857 gestores que tiveram contas rejeitadas entre 2002 e 2008.

    Diz alguma coisa, mas muito imprecisa. A lista em si já é confusa. Cita conta a conta ano a ano, e não gestor a gestor. Explicando: um mesmo gestor tem várias contas rejeitadas. E ainda assim, nem o TCM sabe quantas dessas contas as Câmaras de Vereadores confirmaram a rejeição ou aprovaram.

    Consolidou-se o princípio que o TCM não é a palavra final, e sim as Câmaras. E ainda assim, alguns gestores entraram na Justiça questionando a legitimidade das decisões. Alguns argumentaram, por exemplo, que nas Câmaras, não tiveram direito de defesa.

    Nesses casos, conseguiram liminares que lhes asseguram o direito de se candidatar. Mas é uma situação juridicamente instável. Como diz o advogado José Pires, especializado em direito eleitoral, que aconselha cada um a avaliar caso a caso:

    - Se houver algum senão jurídico, toda a ação política fica por conta e risco do pretenso candidato.

    Ou seja, quem está em tal situação, pode até tentar ir às urnas, mas sabendo que pode dançar.

    NADA A FESTEJAR

    Claro que a Lei da Ficha Limpa, fruto de uma iniciativa popular, mesmo se vier para valer, como tudo indica, ainda é pouco diante do que a sociedade almeja. Aliás, ela tanto rebuliço deu porque a nação, carente de algo que caminhe na direção da moralidade pública, exerceu em 2010 e agora também, forte pressão sobre as cúpulas do Judiciário.

    Falta punir quem realmente roubou não só com a inelegibilidade eleitoral, mas também com as imputações criminais que se deve dar a ladrões. Mas, como disse o ministro Luiz Fux ao relatar a matéria:

    - Aqui está o verdadeiro início da reforma eleitoral.

    Oxalá assim seja. Por enquanto, é suficiente para deixar os fichas sujas a beira de um ataque de nervos.

    Obs: Assim que o STF completar o julgamento, voltaremos ao assunto para destrinchar como será a nova regra.

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