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    O mundo encantado da instantaneidade

    Todo o aparato tecnológico é pensado para economizarmos tempo (e teoricamente nos sobrar tempo pra outras coisas), mas o que menos temos hoje é tempo. E paciência

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    "Mandei o e-mail há 3 horas e nada. O que será que houve. Claro que viu. Será que não vai rolar? Se incomodou com alguma coisa?"

    Sim, aparentemente trata-se de um pensamento psicótico-paranoico, pois enviar uma mensagem a alguém e pensar que pode haver algum problema só porque não teve retorno poucas horas depois é coisa de maluco!

    Hoje, estamos todos mais ou menos assim. E quem, ao ter lido isso, disser ou pensar "Eu não sou assim!" tem os meus sinceros parabéns.

    Todo o aparato tecnológico é pensado para economizarmos tempo (e teoricamente nos sobrar tempo pra outras coisas), mas o que menos temos hoje é tempo. E nem paciência.

    Como, segundo Tolstoi, tempo e paciência são eternos beligerantes, vivemos em guerra espiritual (o que às vezes pode mesmo detonar uma guerra material!).

    Hoje, sabemos se as mensagens escritas que mandamos foram lidas ou não. Se são lidas e não respondidas, o pensamento torto começa a funcionar. "Leu e não respondeu. Babaca. Ou será que fiz alguma coisa e não sei?". Ou ainda, "podia responder qualquer coisa. Mal educado!" Sim, as pessoas, hoje, têm seus movimentos tão expostos, são tão cobradas que acabam sendo mesmo mal-educadas. É muito canal, muita informação, muita resposta pra dar, acaba não dando! E se você quiser ser polida e dar respostas instantâneas o tempo todo, suas tarefas vão ficando de lado e para trás. É um beco quase sem saída. Se você recebe um texto e lê, chega a pensar: "Ferrou. Agora, tá lido, vou ter que responder." Não tenho certeza se esses novos aparatos e costumes revelam caráter (ou falta dele) ou se somente expõem mais uma faceta do ser humano que sempre existiu: nem sempre somos transparentes como poderíamos ou deveríamos ser.

    A falta de paciência não se revela só nas mensagens digitais. Ninguém quer mais esperar nada. A ideia de instantaneidade não vem de hoje: vide os restaurantes fast food e a câmera Polaroid. Outras são incrivelmente atuais. Foto tem que ser vista na hora. E editada com os mais diversos tipos de filtros. Fotografou, postou. Se não postar logo, como vamos marcar o lugar onde estamos no momento da foto? E quando o 3G não funciona e nem há rede wi-fi disponível? Haja paciência!

    Para completar o quadro e provocar ainda mais impaciência no mundo do instantâneo, tem o trânsito. Longos engarrafamentos, trânsito que não anda. E a gente lá, parado, tentando ganhar tempo, possivelmente falando no celular com fone de ouvido ou bluetooth. É sempre um teste de paciência ou somos nós que não sabemos mais esperar por nada?

    Fico imaginando o reflexo dessa instantaneidade compulsória em campos da vida onde não deveria haver pressa. Será que as preliminares estão com os dias contados? O Viagra vai passar a ser remédio contra perda de tempo? Terá o gozo hora marcada, com contagem regressiva?

    Kant afirmou que a paciência é a fortaleza do débil e a impaciência, a debilidade do forte. Como boa seguidora da ética kantiana, proponho que, nós que nos tornamos fortes pelo que pensamos e refletimos, tentemos exercer nossa paciência nas mais diversas áreas do cotidiano, a fim de evitarmos a debilidade generalizada vislumbrada por ele.

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