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    Pedro Serrano: as pessoas ainda não compreenderam o que é uma democracia

    "Democracia não é só soberania popular, não é só escolha da maioria, não é só desejo da maioria. O que se descobriu na ascensão do fascismo e do nazismo foi que essas maiorias ocasionais ocasionam tragédias às vezes", explica o jurista e professor à TV 247; assista

    Pedro Serrano: as pessoas ainda não compreenderam o que é uma democracia
    Guilherme Levorato avatar
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    247 - "O povo brasileiro ainda não aprendeu o real significado de democracia". A afirmação é do jurista e professor Pedro Serrano, que falou à TV 247 sobre a atuação do Judiciário no país e voltou a defender que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem função contramajoritária, o que implica em, muitas vezes, ir contra a opinião pública em favor do cumprimento da lei.

    "A gente tem uma democracia nascente, 30 anos parece muito mas não é, quando você fala em outros países estamos falando de séculos de aprendizado democrático. Então as pessoas ainda não compreenderam o que é realmente uma democracia, no sentido moderno e contemporâneo. Democracia não é só soberania popular, não é só escolha da maioria, não é só desejo da maioria. O que se descobriu na ascensão do fascismo e do nazismo foi que essas maiorias ocasionais ocasionam tragédias às vezes, então a ideia é, vamos dizer, de uma democracia relativa, de uma democracia limitada por direitos para não virar uma ditadura da maioria, direitos que garantem os indivíduos e as minorias", explicou.

    "O papel do Judiciário principal em uma democracia hoje seria de ser um órgão de decisão contramajoritária, por isso mesmo é que a maioria dos países estabelece mecanismos de discrição e de proteção aos juízes. Nós temos bons mecanismos de proteção a juízes que devem ser mantidos e mecanismos de garantia da independência mas tem essa demanda da vaidade humana, que eu acho péssima para o Judiciário, que é ficar se filmando tudo e essa excessiva exposição dos ministros que transforma eles em celebridades e em pessoas públicas, isso totalmente negativo para o Judiciário", complementou Serrano.

    O jurista disse que para decisões que requerem a soberania popular e a vontade pública, a democracia tem à disposição outro poder, o legislativo. "O Judiciário deve ser respeitado justamente pelo papel dele de às vezes ter que decidir contra a opinião pública, depende de um amadurecimento da sociedade e nós, que temos consciência disso, deveríamos estar contribuindo para isso, de entender que o Judiciário tem esse papel de desagradar. Hoje os ministros estão tendendo a dizer o contrário, que tem que refletir a opinião pública. Judiciário não é parlamento. Para decisões majoritárias tem o órgão adequado em uma democracia que é o legislativo, o Judiciário tem que ser o chato da parada", criticou.

    Serrano relatou como deveria ser, para ele, o modelo estrutural do Estado, passando por uma reforma, principalmente, do Judiciário. "Eu acho que a estrutura brasileira deveria rever a estrutura de Estado em um outro momento político oportuno. Tem que ter uma corte constitucional que só decida questões constitucionais em abstrato segundo o critério dela de aceitabilidade e relevância nacional, geral daquilo, quem tem que decidir decisão penal é o Judiciário, a corte constitucional seria com representante dos três poderes, ao meu ver, não só do Executivo e uma estrutura do Judiciário capilarizada o máximo possível, uma estrutura com órgãos decisórios locais. Temos que reconhecer também, nós advogados, que não são todos os casos que demandam quatro instâncias de decisão, acho que a gente tem que repensar um pouco isso e radical, vamos dizer, o modo de gerenciar o Judiciário. O Judiciário tem que fazer aquilo que ele teme que é você estar constantemente medindo, em termos administrativos, a eficiência dele, mas não esse modo abstrato, autoritário que o Estado sempre age em geral. Tem que propor critérios mais inteligentes, capilaridade, desconcentrar competências, eu diria que isso é também problema do Executivo, estamos em uma federação que temos que radicalizar a federação, temos que ter mais competência nas mãos dos municípios e mais riqueza material, portanto, nas mãos deles para poderem responder a essas competências".

    Ou seja, qualquer estrutura gerencial humana é mais eficiente na medida em que ela é descentralizada. Temos que ter, em qualquer política pública ou funcionamento do serviço ou atividade pública, mecanismos de aferição para verificar se está funcionando e até que ponto está funcionando. O problema maior é que tudo isso passa por um caldo de mudança e de cultura que infelizmente a humanidade está inserida hoje que é um caldo de cultura que exagera na avaliação crítica do Estado e do serviços prestados diretamente pelo Estado e, vamos dizer, não observa, provavelmente de propósito, os malefícios ou o lado negativo que a atividade privada tem quando se resolve prestar serviço público. A ideia de privatização ou de serviço público direto não pode estar sujeita a um pré-juízo ideológico de que é bom ou ruim, tem que ver em cada caso, tem que verificar, mas o mundo já está observando que esse modelo de se considerar o Estado inepto a priori é equivocado", disse Serrano sobre as adequações necessárias ao Estado para seu melhor funcionamento.

    O professor Serrano também comentou a mudança do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do ministério da Justiça e Segurança Pública, do ministro Sérgio Moro, para o ministério da Economia, de Paulo Guedes. Ele acredita que, da forma como estava, nas mãos de Moro, o ministério possa fazer uso das informações do Coaf para coagir exageradamente líderes políticos e empresariais e até pessoas comuns.

    "É um atentado à democracia. Por isso que o Coaf não deve ficar no Ministério da Justiça, não é por preocupação com a pessoa do doutor Moro porque não é ele o problema só, troca de ministro e o problema vai continuar o mesmo. Há uma cultura hoje de punitivismo excessivo na estrutura policial brasileira em que o uso da estrutura da Receita para realizar devassas e, com isso, ficar pescando, procurando um crime e sujeita a uma interpretação acusatória. Imagine todos nós no dia a dia, o meu filho, minha mulher vai interpretar meu dinheiro de um jeito acusatório: 'onde você foi almoçar? O que você foi fazer? Por que você não atendeu o telefone aquela hora?', todo mundo já passou por isso. Então imagina isso com o poder de te coagir fisicamente, de te prender. Todo mundo já foi alvo de alguma desconfiança, imagina esse olhar desconfiado com o poder de te prender, é isso que nós temos que imaginar. Isso não tem fim, isso começa com líder político, com líder empresarial e vai chegar nas pessoas comuns", afirmou o professor.

    Ele voltou a reiterar que sua posição não está ligada particularmente ao ministro Sérgio Moro. "Eu acho que é por isso que o Coaf não deve fazer parte, não é nada que deva ser tido nesse Fla-Flu ridículo de ficar personalizando e não é um problema do doutor Moro ou não, é um problema de estrutura de Estado e que não deve ser admitido em uma democracia. Não se pode confundir investigação fiscal, que só deve ter uma função fiscal e que não pode compartilhar seus resultados para criminal porque ela tem uma estrutura devassadora, o que não pode ser admitido na investigação policial ou criminal".

    Sobre uma possível indicação de Moro ao STF pelo presidente Jair Bolsonaro, Serrano afirmou que a indicação é legal e legítima porque é uma das atribuições garantidas ao presidente da República. "É a regra do jogo, a regra do jogo é um modelo em que o presidente que foi eleito que saiba nomear ministros alinhados com a linha ideológica dele, nesse ponto o Bolsonaro me parece muito firme, muito claro, coisa que o Lula não foi e a Dilma também não, então a esquerda perdeu o jogo nesse ponto. O Bolsonaro colocou muito claro e inclusive restringindo a autonomia das instituições, mas de uma forma muito honesta, ele chegou na eleição e falou: 'não vou nomear candidato a procuradoria-geral, vou nomear ministros alinhados com que eu penso', e a população votou nisso, então é absolutamente legítimo e é uma prerrogativa do presidente, quer dizer, é legal e legítimo".

    Inscreva-se na TV 247 e assista à entrevista na íntegra:

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