Relatório global alerta que aquecimento acima de 1,5°C já provoca colapso dos recifes e ameaça Amazônia
Estudo da Universidade de Exeter divulgado na véspera da Pré-COP30 mostra que o planeta entrou em nova era climática e exige ação imediata
247 - O planeta já ultrapassou um dos primeiros pontos de inflexão do sistema terrestre, marcando o início de uma nova era climática que pode causar danos catastróficos se não houver ação urgente. A constatação é do segundo Relatório Global sobre Pontos de Inflexão, divulgado neste domingo (13) pela Universidade de Exeter e parceiros internacionais. O estudo foi lançado no mesmo dia em que tem início, em Brasília, a Pré-COP30, encontro preparatório para a conferência do clima que será realizada no Brasil em 2025.
O documento traz um alerta contundente: os recifes de corais de águas quentes, dos quais dependem quase um bilhão de pessoas e um quarto de toda a vida marinha, já ultrapassaram seu ponto de inflexão térmico. Segundo os cientistas, a morte generalizada dos recifes está em curso e, a menos que o aquecimento global seja revertido, os ecossistemas de corais como os conhecemos deixarão de existir, restando apenas pequenos refúgios que devem ser urgentemente protegidos.
Para Helga Correa, especialista em Conservação do WWF-Brasil, o relatório reforça que a humanidade está atravessando limites críticos. “A Amazônia, que ainda pode desempenhar um papel decisivo na regulação do clima global, está se aproximando perigosamente de um ponto de não retorno”, alertou. Apesar do cenário alarmante, Helga destaca que “ainda há caminhos para reverter essa trajetória, com políticas de conservação robustas, valorização dos povos da floresta, investimentos em restauração e um modelo de desenvolvimento inclusivo e sustentável”.
Ela enfatiza que os chamados “pontos de virada positivos” — como a rápida adoção de energias limpas e a restauração de ecossistemas — representam o caminho possível para a mudança. “O trabalho com a Presidência da COP30 visa exatamente isso: criar uma cascata de mudanças positivas onde a inovação sustentável se torne a opção mais atraente e acessível. É fundamental que governos, empresas e a sociedade ajam juntos para que o Brasil maximize seu potencial em tecnologias verdes e promova essa transformação global.”
O Dr. Mike Barrett, cientista-chefe da WWF-Reino Unido e coautor do relatório, classificou as conclusões como “extremamente alarmantes”. “O fato de os recifes de corais de águas quentes estarem ultrapassando seu ponto de inflexão térmico é uma tragédia para a natureza e para as pessoas que dependem deles para obter alimento e renda”, afirmou. Ele alertou ainda que, sem ação imediata, “também perderemos a floresta amazônica, geleiras e correntes oceânicas vitais — um resultado verdadeiramente catastrófico para toda a humanidade”.
O relatório, elaborado por 160 cientistas de 87 instituições em 23 países, destaca que outros pontos de inflexão — como o derretimento irreversível das calotas polares, o colapso das correntes oceânicas e a morte da floresta amazônica — estão perigosamente próximos de serem alcançados. O estudo enfatiza que cada fração de grau e cada ano acima de 1,5 °C fazem diferença, reforçando a urgência de reduzir as emissões e ampliar a remoção de carbono.
O professor Tim Lenton, do Instituto de Sistemas Globais da Universidade de Exeter, destacou: “Estamos nos aproximando rapidamente de vários pontos de inflexão do sistema terrestre que podem transformar nosso mundo, com consequências devastadoras para as pessoas e a natureza. Isso exige ação imediata e sem precedentes dos líderes da COP30 e dos formuladores de políticas em todo o mundo.”
A cientista Manjana Milkoreit, da Universidade de Oslo, alertou que o pensamento político atual não considera os pontos de inflexão e que “prevenir pontos de não retorno requer medidas de mitigação antecipadas que minimizem o pico da temperatura global”. Segundo ela, a governança global precisa ser reformulada para lidar com desafios inéditos e de natureza irreversível.
Além do diagnóstico sombrio, o relatório aponta ações para desencadear pontos de inflexão positivos, como a aceleração da transição energética. Desde o primeiro relatório, em 2023, houve avanços notáveis na expansão da energia solar, eólica e na adoção de veículos elétricos. Esses movimentos, segundo os autores, mostram que “pontos de virada positivos oferecem o único caminho confiável para um futuro seguro, justo e sustentável”.
O grupo de pesquisadores está colaborando com a Presidência da COP30, liderada pelo embaixador André Corrêa do Lago, que destacou o papel do Brasil na mobilização global: “Nossa Presidência convidou líderes comunitários, acadêmicos e cientistas para explorar o melhor da ciência e da sabedoria ancestral sobre como nossas instituições podem ganhar versatilidade na resposta à crise climática. O relatório é uma resposta positiva e oportuna ao nosso convite”, afirmou.
Entre os estudos de caso apresentados, o relatório confirma que os recifes de corais tropicais estão próximos do colapso total; que a Amazônia pode atingir seu ponto de inflexão com o aquecimento em torno de 1,5 °C; e que a Circulação Meridional do Atlântico (AMOC) corre risco de colapso abaixo de 2 °C, o que teria efeitos severos sobre o clima da Europa, da África e da Ásia.
Lenton concluiu o documento com uma mensagem de urgência e esperança: “Somente com uma combinação de políticas decisivas e ações da sociedade civil o mundo poderá mudar sua trajetória — de enfrentar riscos existenciais de pontos de inflexão do sistema terrestre para aproveitar oportunidades positivas de transformação”.
