BNDES financia preservação dos acervos de Herzog e Glauber Rocha
Com R$ 9,9 milhões, Fundo Cultural apoia digitalização de documentos da ditadura e restauração de filmes quase inéditos
247 - O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou apoio de R$ 9,9 milhões em recursos não reembolsáveis do BNDES Fundo Cultural para dois projetos voltados à preservação da memória histórica e cultural do país. A iniciativa contempla a organização e digitalização de mais de 13 mil itens do Instituto Vladimir Herzog (IVH) e o restauro de três filmes do cineasta Glauber Rocha, que passarão a ter maior acesso público.
De acordo com informações divulgadas pelo próprio BNDES, o investimento busca fortalecer a cultura democrática, os direitos humanos e a difusão do patrimônio audiovisual brasileiro. O presidente do banco, Aloizio Mercadante, destacou o alcance simbólico e cultural das ações apoiadas. “O apoio do BNDES à preservação dos itens que integram e resultam das atividades do Instituto Vladimir Herzog contribuem para o fortalecimento de uma cultura de respeito à democracia, que esteve em um passado muito recente sob risco no Brasil, e aos direitos humanos. E com o restauro das obras de Glauber Rocha, o Banco ajuda a difundir e a democratizar o acesso do público à cultura e à história do cinema nacional”, afirmou.
Do total aprovado, R$ 2 milhões serão destinados à Box Cultural para o restauro de três obras realizadas por Glauber Rocha durante seu período de exílio, entre as décadas de 1960 e 1970. O trabalho será feito em padrão 4K RGB sequencial 16 bits, tecnologia que assegura cópias extremamente fiéis aos negativos originais. Serão restaurados o documentário de longa-metragem História do Brasil (1974) e os curtas Amazonas, Amazonas (1966) e Di Glauber (1977), filmes praticamente inéditos para o grande público.
Após o processo de restauração, as obras serão exibidas em festivais no Brasil e no exterior e integrarão a Mostra BNDES Glauber Rocha, prevista para ocorrer na Cinemateca, em São Paulo. A programação reunirá oito títulos do diretor. Uma cópia dos filmes restaurados será depositada na Cinemateca Brasileira, responsável pela guarda do acervo de Glauber Rocha. O projeto inclui ainda a produção de um minidocumentário sobre o processo de restauro, com o objetivo de dar visibilidade à importância da preservação do cinema nacional e aos desafios técnicos e culturais envolvidos.
A maior parte dos recursos, R$ 7,9 milhões, será aplicada pelo Instituto Vladimir Herzog na organização, catalogação, digitalização e difusão de 13.840 itens pertencentes a três acervos: o Acervo Vladimir Herzog, o Acervo Institucional do IVH e o Acervo Memórias da Ditadura. O conjunto reúne documentos fundamentais para a compreensão da história recente do Brasil a partir de 1955, com especial atenção ao período da ditadura civil-militar, entre 1964 e 1985.
Em 25 de outubro de 1975, há 50 anos, o jornalista Vladimir Herzog foi assassinado pela ditadura, episódio que se tornou um marco na luta pela democracia no país. Sua morte teve grande repercussão nacional e internacional e consolidou Herzog como uma figura central na defesa das liberdades democráticas e dos direitos humanos no Brasil.
Os itens preservados pelo projeto serão traduzidos para o inglês e o espanhol e disponibilizados na internet, por meio de uma infraestrutura digital específica, com servidores dedicados, banco de dados unificado e sistema integrado de catalogação. A iniciativa também prevê a adoção de marcadores sociais de diversidade, como raça e gênero, na indexação dos documentos, ampliando as possibilidades de pesquisa e leitura crítica do acervo.
Fundado em 2009, em São Paulo, o Instituto Vladimir Herzog é uma entidade sem fins lucrativos criada por amigos e familiares do jornalista, intelectual, cineasta, professor e escritor que foi torturado até a morte em 1975, após se apresentar voluntariamente ao DOI-CODI para prestar depoimento. Herzog atuou em importantes veículos da imprensa brasileira e internacional, como o jornal O Estado de S. Paulo, a revista Visão, as TVs Excelsior e Cultura e a BBC de Londres.
Atualmente, o IVH desenvolve suas atividades em três frentes principais. Na área de Memória, busca tornar a história do país conhecida, especialmente entre os jovens, com foco nos impactos da ditadura nos dias de hoje. No campo do Jornalismo, promove a valorização do jornalismo comprometido com o interesse público e com a denúncia de violações de direitos. Já na Educação, atua na formação de valores desde a infância, com ênfase no respeito à diversidade, ao diálogo e aos direitos humanos.
Já Glauber Rocha, baiano e um dos líderes do movimento Cinema Novo, revolucionou o cinema brasileiro com uma linguagem própria, marcada pela chamada “estética da fome”, que transformava a miséria em expressão de resistência. Defensor do cinema como instrumento de transformação social, deixou obras consagradas como Deus e o Diabo na Terra do Sol, Terra em Transe e O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, filme premiado no Festival de Cannes.
A Box Cultural, responsável pelo projeto de restauro, é uma Organização da Sociedade Civil sem fins lucrativos que atua na gestão e produção de projetos culturais. A instituição desenvolve ações nas áreas de artes visuais, cênicas, audiovisual, comunicação e educação, e é responsável, entre outras iniciativas, pelo contrato de gestão do Cine Brasília.
