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Cultura

Cientista político diz que diálogos da Vaza Jato podem ser considerados indícios de crime

O cientista político Fernando Augusto Henriques Fernandes afirma, sobre a Vaza Jato, que "o uso da metodologia indiciária (...) aplicada à sociologia será útil para entender a importância dos diálogos como um indício do crime grave. Os elementos históricos devem ser vistos não como uma foto, mas como um filme"

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247 - O cientista político Fernando Augusto Henriques Fernandes afirma, sobre a Vaza Jato, que "o uso da metodologia indiciária (...) aplicada à sociologia será útil para entender a importância dos diálogos como um indício do crime grave. Os elementos históricos devem ser vistos não como uma foto, mas como um filme."

Leia a íntegra do artigo do cientista político. O artigo compõe o livro "Relações Obscenas", que reúne análises sobre o escândalo dos procuradores brasileiros. 

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CYPHERPUNKS E A GARGANTA PROFUNDA DA LAVA-JATO

Fernando Augusto Henriques Fernandes[1]*

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As divulgações das conversas entre o ex-juiz Sergio Moro e do procurador Dellgnol realizadas, inicialmente pelo site The Intercept Brasil e seguido por inúmeros órgãos da imprensa nacional, desnudam uma relação mais que promíscua entre o juiz e o acusador. Para serem compreendidas é necessário que esses diálogos e vazamentos sejam encarados como peça de um enorme quebra-cabeça histórico. 

O uso da metodologia indiciária[2], advinda do método de Sherlock Holmes, aplicada à sociologia será útil para entender a importância dos diálogos como um indício do crime grave. Os elementos históricos devem ser vistos não como uma foto, mas como um filme. Os diálogos estão inseridos nos cinco anos de Operação Lava Jato da República de Curitiba, mas fazem parte de toda uma estratégica geopolítica mundial cujos personagens são meros partícipes de um grande golpe; a fraudulenta condenação de Lula é um capítulo. 

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O jornalista Glenn Greenwald, que encabeça as revelações do The Intercept Brasil, foi protagonista das divulgações da vigilância internacional realizada pelos Estados Unidos da América, através da NSA (Agência de Segurança Nacional). Em 2005 Glenn entrevistou Edward Snowden, que entregou ao jornalista provas de que entre milhares de pessoas violadas e monitoradas em todo mundo estavam a ex-presidente Dilma Roussef[3]. Também a Petrobras[4] era monitoradas com violações de e-mails e interceptações telefônicas, com a falsa justificativa de combate ao terrorismo[5]. O potencial energético[6] do petróleo brasileiro somado a importância dos recursos naturais e o destaque geopolítico do país o tornam fundamentais aos planos de dominação americanos. 

Abordamos[7] a revelação do WikiLeaks[8] quanto à participação do ex-juiz federal Sergio Moro em um encontro desenvolvido pela embaixada americana para treinamento de juízes e promotores brasileiros, parte do Projeto Pontes. Tal “encontro” foi parte da estratégia de influência americana e, em 2009, como um “guarda-chuva” de um “novo conceito de treinamento”, com a presença de juízes federais de 26 estados da federação, 50 agentes da polícia federal, bem como 30 autoridades estaduais, entre promotores e juízes. 

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Tal treinamento, conforme relato na mensagem oficial vazada, “foi realizado na capital regional do Rio de Janeiro e financiada pelo Coordenador do Estado para Contraterrorismo [orig. State’s Coordinator for Counter Terrorism (S/CT)]”. O documento destaca “que [os brasileiros] historicamente sempre evitaram qualquer treinamento que tomasse por objeto o terrorismo, preferindo terminologia mais genérica como crimes transnacionais”. No documento constam referências às palavras da “vice-coordenadora para Contraterrorismo na S/CT, Shari Villarosa”, que “está elogiando juízes e policiais brasileiros, que militam na direção oposta à do governo eleito e seu Ministério de Relações Exteriores”. O ex-juiz federal Sergio Moro esteva presente e falou sobre lavagem de ilícitos. 

Na íntegra das mensagens divulgadas no dia 12 de junho pelo The Intercept Brasil[9] o procurador federal Deltan Dallagnol claramente fala com Moro de articulação com os americanos. A influência do governo americano será aos poucos desnudada na utilização de Moro e dos procuradores através da Lava-Jato.

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Com o fim da Guerra Fria, a “guerra jurídica assimétrica” (lawfare[10]) passou a substituir as formas de intervenção. Enquanto nos Estados Unidos se protege a todo o custo a classe política de qualquer intervenção criminal, ‘vende-se’ para o resto do mundo uma ideia de limpeza contra a corrupção. O livro de Glenn Greenwald[11] destrói essa ideia de equidade nos Estados Unidos trazendo a falta de punição de Nixon, de Bush no escândalo do Iran-Contra, depois Bush filho em relação ao programa de interceptação de americanos, bem como o porquê de não incluir Obama e todo o programa denunciado por Snowden. O Congresso americano correu para mudar a legislação e proteger suas empresas de telefonia que cooperavam com os programas ilegais de monitoramento de americanos. 

Enquanto isso, o mundo, e em especial a América Latina[12], entendida como “quintal dos Estados Unidos” – como se referiu John Kerry um discurso ante o Comitê de Assuntos Exteriores da Câmara de Representantes em abril de 2013[13] – passou a ter suas classes políticas perseguidas e desacreditadas. A ideia intervencionista é tão presente que John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, se refere, em entrevista em março de 2019, à Doutrina Monroe[14]

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A operação serviu à destruição da credibilidade de toda a classe política, ao golpe parlamentar contra Dilma e à eleição de Bolsonaro. Mais do que isso, para gerar um impacto econômico terrível à Petrobras e para a praticamente falência de nossas construtoras, que exerciam papel fundamental no desenvolvimento da infraestrutura do Brasil e tinham papel de multinacionais brasileiras. O que dizer dos diálogos em que Deltan planeja divulgar delações da Odebrecht para influenciar a conjuntura política na Venezuela[15]

A “militarização do ciberespaço” com a vigilância em massa de nossa população e invasão das privacidades e das empresas também geraram um movimento de resistência através da cultura dos cyberpunks, de “privacidade para os fracos, transparência para os poderosos” e do princípio “a informação quer ser livre[16]”, que tem no Wikileaks uma importante organização se dedicando a publicar documentos secretos e revelando má-conduta de governos, empresas e instituições. As denúncias reveladas pela organização passam por ataques a civis e torturas no Iraque, centenas de assassinatos no Afeganistão, e a ordem de Hillary Clinton para que 33 embaixadas recolhessem dados pessoais de diplomatas da ONU. 

Walter Degatti Neto é o cyberpunk que foi identificado pela Polícia Federal como aquele que remeteu ao The Intercept Brasil os dados das mensagens trocadas pelas autoridades que serviram aos interesses americanos e criaram a farsa que nos trouxe a esse momento histórico. Certamente o tempo relevará toda a conjuntura que vivemos. Mas graças à velocidade das informações na internet e a divulgação de documentos secretos podemos tomar conhecimento dos dados que aceleram nossa compreensão histórica. 

O papel relevante e corajoso de Glenn Greenwald nos permite acelerar o conhecimento necessário para tentar reverter o diabólico plano que somos vítimas. Julian Assange foi preso em Londres em 3 de julho de 2018, quatro dias depois de o vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, visitar Quito e anunciar o fim de “dez anos de tensas relações entre ambos os países” e ter feito acordos com o FMI anunciando privatização de funções que outrora eram realizadas pelo Banco Central. Foi quando a Corte Nacional de Justiça do Equador ordenou a captura do ex-presidente Rafael Correa[17], que governou o país de 2007 a 2017[18].

Abraham Lincoln dizia: “pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo.” Lula, antes de ser preso, verberou em seu discurso que: os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais poderão deter a chegada da primavera. E a nossa luta é em busca da primavera[19]”. Ao contrário do que afirmou o neoliberal Francis Fukuyama, a história não terminou. “O tempo não para”. 

    

[1]* Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e Mestre em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Cândido Mendes (UCAM). 


[2] Ginsburg, Carlo. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: GINSBURG, Carlo. Mitos, Emblemas, Sinais: Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, pp. 143-179. Ver também Gisálio Cerqueira Filho.


[3] A NSA também se dedica à espionagem diplomática, como demonstram os documentos

referentes a “questões políticas”. Um exemplo particularmente chocante, de 2011, mostra que a agência teve como alvo dois líderes latino-americanos – a atual presidente do Brasil, Dilma Rousseff, assim como seus “principais consultores”, e o então líder da disputa presidencial (e hoje presidente) do México Enrique Peña Nieto, junto com “nove de seus colaboradores mais próximos” – para um “esforço especial” de vigilância especialmente invasiva. O documento chega a incluir algumas das mensagens de texto interceptadas entre Nieto e um “colaborador próximo”. Cf. GREENWALD, Glenn. “Sem lugar para se esconder do Governo Americano”, Rio de Janeiro: Sextante, 2014, p. 123.


[4] “Boa parte do acervo de Snowden revelou o que só pode ser qualificado de espionagem econômica: escuta e interceptação de e-mails da gigante brasileira de petróleo Petrobras, de conferências econômicas na América Latina, de empresas de energia da Venezuela e do México, e uma vigilância conduzida por aliados da NSA (entre os quais Canadá, Noruega e Suécia) sobre o Ministério das Minas e Energia do Brasil e empresas do setor de energia em vários outros países.” GREENWALD, Glenn. Op. cit, p. 117.


[5] “Para começar, é claro que grande parte da coleta de dados conduzida pela NSA nada tem a ver com terrorismo ou segurança nacional. Interceptar as comunicações da gigante Petrobras, espionar sessões de negociação em uma cúpula econômica, ter como alvo os líderes democraticamente eleitos

de países aliados ou coletar todos os registros de comunicações dos americanos não tem qualquer relação com o terrorismo. No que diz respeito à atual vigilância praticada pela agência, está evidente que deter o terrorismo é um pretexto”. GREENWALD, Glenn. Op. cit, p. 197.


[6] O acesso aos recursos naturais como água, minério e petróleo são considerados “explicitamente, um assunto de segurança para os Estados Unidos”, cfe. BRUCKMANN, Monica. Ou inventamos ou erramos: a nova conjuntura latino-americana e o pensamento crítico, 2011, p. 293.


[7] FERNANDES, Fernando Augusto Henriques. A omissão da PF e das autoridades federais diante de atos terroristas, 2019. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mar-20/fernando-fernandes-omissao-governo-diante-atos-terroristas, acesso em 24/04/2019.


[8] Disponível em https://wikileaks.org/plusd/cables/09BRASILIA1282_a.html, tradução disponível em http://www.patrialatina.com.br/da-vergonha-mas-e-preciso-ler-o-telegrama-moro-wikileaks. Acessos em 24/04/2019.


[9] “Moro (18:44:08) – Não é muito tempo sem operação? Deltan (20:05:32) – É sim. O problema é que as operações estão com as mesmas pessoas que estão com a denúncia do Lula. Decidimos postergar tudo até sair essa denúncia, menos a op do taccla pelo risco de evasão, mas ela depende de Articulacao com os americanos”. Disponível em: https://theintercept.com/2019/06/12/chat-sergio-moro-deltan-dallagnol-lavajato/, acesso em 26/07/2019.


[10] A professora Carol Proner descreve lawfare como um método de Guerra não tradicional pelo qual a lei, através de sua legitimidade e de seus atores (juízes, promotores e policiais) é utilizada como um meio para alcançar objetivo military, desestabilizando ou substituindo governos. Cf. PRONER, Carol. Lawfare como herramienta de los neofascismos, 2019.


[11] GREENWALD, Glenn. With Liberty and Justice for Some – How the law is used to Destroy Equality and Protect the Powerful. Nova Iorque: Picador, 2011.


[12] O acesso aos recursos naturais como água, minério e petróleo são considerados “explicitamente, um assunto de segurança para os Estados Unidos”, cf. BRUCKMANN, Monica. Ou inventamos ou erramos: a nova conjuntura latino-americana e o pensamento crítico, 2011, p. 293.


[13] Sul21, “John Kerry um discurso ante o Comitê de Assuntos Exteriores da Câmara de Representantes em abril de 2018”, 2013. Disponível em: https://www.sul21.com.br/postsrascunho/2013/04/o-secretario-de-estado-estadunidense-john-kerryn-chama-a-america-latina-de-quintal-dos-eua/, acesso em 02/05/2019.


[14] JORNAL O GLOBO, “Assessor de Trump evoca Doutrina Monroe, que justificou intervenções na América Latina, ao comentar cenário na Venezuela”. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/assessor-de-trump-evoca-doutrina-monroe-que-justificou-intervencoes-na-america-latina-ao-comentar-cenario-na-venezuela-23496229, acesso em acesso em 26/07/2019.


[15] Disponível em: https://theintercept.com/2019/07/07/lava-jato-vazamento-delacao-venezuela/. Acesso em 26/07/2019.


[16] Cypherpunks – Liberdade e o Futuro da Internet”, ed Boitempo, 2012, pag. 12 prefácio Natalia Viana. Vide https://apublica.org


[17] Disponível em: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/para-rafael-correa-prisao-de-assange-e-vinganca-pessoal-do-presidente-equatoriano/ e https://exame.abril.com.br/mundo/prisao-de-assange-e-vinganca-de-lenin-moreno-diz-ex-presidente-do-equador/, acessos em 24/04/2019. Olha, cada vez inventam uma nova acusação contra mim. É uma perseguição brutal. Assim como estão perseguindo o Lula, a Cristina Kirschner, a todos. E porque somos líderes de esquerda não temos direitos humanos! Está em curso um a absurda deturpação midiática e da Justiça.


[18] Carta Maior, “Lawfare: as masmorras da política latino-americana”, 2018. Disponível em: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Estado-Democratico-de-Direito/Lawfare-as-masmorras-da-politica-latino-americana/40/40888, acesso em 01/05/2019.


[19] https://aguapretanews.com.br/leia-integra-do-discurso-historico-de-lula-antes-de-ser-preso/

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