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Cultura

Leno Sacramento: “Quando vemos um preto no palco fazendo arte, ele está representando a todos os outros”

No elenco de "Medida Provisória", filme dirigido por Lázaro Ramos, ator cobra mais engajamento de artistas negros e diz que “é preciso que todos estejam ativos nessa militância”

Ator Leno Sacramento (Foto: Reprodução)
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Por Ricardo Nêggo Tom, do 247 - O programa "Um Tom de resistência" promoveu um debate sobre a arte através dos movimentos sociais, com foco no engajamento dos  artistas, principalmente, os pretos, com as causas defendidas pela militância desses movimentos. A jornalista Wanda Chase, conhecida como a guardiã da cultura preta da Bahia, e que possui grande representatividade no ativismo cultural, observa uma divisão entre os artistas negros com relação a esse engajamento. "Alguns são extremamente engajados, outros já foram cooptados pelo outro lado. E a arte é um instrumento de revolução muito forte. Nós vemos isso claramente dentro dos nossos blocos afros, onde nós fazemos um carnaval que leva para avenida aulas de história, de meio ambiente, de cultura e de tudo mais que se possa imaginar. Contando histórias desconhecidas pela grande maioria da população, e que não encontramos em livros. Esse é o engajamento que eu acho necessário. O bando de Teatro Olodum faz isso muito bem, de uma forma brilhante. É o primeiro grupo de teatro de negros da Bahia. Os blocos afros vêm fazendo isso também, e eu não vejo outra alternativa para nós avançarmos cada vez mais. Em maio será lançado um livro do Alberto Pita, que é artista plástico e presidente do Cortejo Afro, em que ele conta as nossas histórias através das fantasias. Isso também deveria ir para dentro das escolas, começar por lá." A jornalista ressalta que "a arte é uma chave que abre portas" e pondera para que os nossos artistas se conscientizem disso cada vez mais. 

Ator, diretor e professor de capoeira, Leno Sacramento chama a atenção para a importância da representatividade negra na arte e na cultura do país e lembra que só foi conhecer a sua verdadeira identidade étnica ao entrar no Bando de Teatro Olodum. "Quando eu entrei no Olodum, eu era 'moreno', homofóbico, racista. Há 25 anos atrás, tempo que eu estou no grupo, eu era isso tudo. Minha família era toda Batista, mas eu não os culpo por isso. Hoje a minha matriz religiosa é africana, é o candomblé. Mas eu precisei descobrir isso. E para que eu descobrisse isso, eu tive que entrar no Bando. E o grupo foi me denegrindo, me empretecendo e abrindo a minha cabeça para as coisas. Eu acho inacreditável termos um presidente que não liga para a cultura, sendo que ela salva e abre portas. É duro entender que temos um presidente que acabou de vetar uma lei (Lei Paulo Gustavo) que apoia e incentiva a cultura. Mas vamos seguir, esse governo vai passar”. Leno reforça a importância do trabalho do Bando de Teatro Olodum, no sentido de conscientizar socialmente os seus integrantes e a sociedade. “É um trabalho de formiguinha, de entrar na comunidade, pois cada um dos integrantes do Bando mora em comunidades. Somos agentes multiplicadores, que mudam as cabeças das pessoas nas nossas comunidades. É legal ver pessoas dizendo que se formaram na universidade, após assistirem a nossa arte e descobrirem que elas também podem estar ali”.

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Quanto ao engajamento dos artistas negros nos movimentos sociais, o ator entende que o processo, às vezes, é complicado. "Quando vemos um preto no palco fazendo arte, ele está representando toda a negritude. Ele já está fazendo alguma coisa pela gente. A dramaturgia preta está ali, por mais que ele não fale o que a gente quer ouvir. Eu me lembro que o primeiro personagem de Lázaro Ramos, foi o ‘Foguinho’, e ele foi muito criticado por que interpretava um preto, de bigode loiro, fazendo graça. Mas ele precisou fazer aquilo para ser o que ele é hoje e estar dirigindo um filme incrível. É uma estratégia para entrar no espaço. Eu também quero entender as pessoas que ainda não estão engajadas. É preciso que todos estejam ativos nessa militância. Eu não incentivo a violência, mas acho que, em algumas situações, as manifestações são pacíficas demais“. Wanda Chase clama por “mais atitude”, e que as ruas sejam o palco desse engajamento. Ela também comenta a respeito da representatividade que o personagem de Lázaro Ramos em “Cobras e Lagartos” deu a negritude. “Eu também ouvi muitas críticas a ele, que questionavam como ele poderia ter aceitado aquele personagem. E eu sempre dizia que o importante era vê-lo na TV. E o mais importante nessa história, não foi dentro da novela. Foi quando o Lazinho foi ao Faustão e falou sobre a cooperativa “Steve Biko”, que já colocou centenas e milhares de negros aqui da Bahia nas universidades. Sem a novela ele não teria tido esse espaço. “

Em 2018, enquanto passeava de bicicleta com um amigo, Leno Sacramento foi baleado por policiais civis que o teriam confundido com um bandido. Ao falar sobre o episódio, o ator faz questão de dizer que não houve confusão, e sim uma ação de “limpeza étnica” por parte dos agentes. “Eu não fui confundido. Nós, negros, sabemos que não somos confundidos. Eu fui atingido por trás. É limpeza étnica mesmo. Eles sabem porque me balearam, eu sei porque eles me balearam. É simplesmente por conta da cor da pele. Eu estava indo para o teatro, quando ouvi uma voz dizendo: ‘para desgraça! ’ E é assim como eles nos tratam nas nossas comunidades. Quem é preto e morador de comunidade sabe disso. E quando olhei para o lado fui baleado. A verdade é que isso se chama extermínio da pele negra. E ainda fui maltratado pelo estado, fui maltratado no hospital por pessoas que nem me conheciam. Foi um momento muito difícil da minha vida”. Wanda se recordou de outro episódio semelhante acontecido com um dos diretores do Olodum, que também foi baleado pela polícia de Salvador. “O Eusébio Queiroz estava saindo para uma turnê na Europa com o Olodum, quando ele levou um tiro no Pelourinho. Não morreu porque Deus não quis. Quando eu era assessora de imprensa do Olodum, outro músico do grupo foi morto na comunidade do Pela Porco, em Salvador, o que provocou uma manifestação do grupo nas ruas, onde eles foram para a frente da sede da secretaria de segurança pública, pararam os tambores e todos se sentaram no chão interditando a via”.

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