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Economia

Angelus novus

O terror do dilmismo é o terror do futuro não-agrário. É o mesmo terror que o ensaísta Walter Benjamim viu no quadro Angelus Novus, de Paul Klee

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Está para surgir no Brasil, ainda, uma interpretação adequada que dê nome aos bois econômicos tocados na octaetéride do governo Lula, e na corrente político-econômica da presidente Dilma. Nos anos 80, um astrolábio era seguido a ferro e a fogo pelos economistas e administradores, e que servia como um potente analítico do que se passava na economia brasileira: foi um artigo, publicado pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, na revista Dados em 1983. Intitulado “Seis interpretações sobre o Brasil”, o estudo definia com precisão alguns modelos litigantes na economia e política brasileiras nos quatro lustros do século XX.

Na primeira metade do século 20 a burguesia mercantil brazuca era dividida entre um setor exportador e um substituidor de importações. A burguesia mercantil especulativa sempre sobreviveu de especulação, sinecuras do Estado, exploração do trabalho escravo, etc. Foi a burguesia que engrossou o caldo da UDN e do PSD – e que hoje vê-se representada, no governo Dilma, por José Sarney e caciques do Nordeste, a lotear cargos aqui e ali. Ainda havia a burguesia industrial, que se aliou a tecnoburocratas como Roberto Campos e Delfim Neto, no pacto pós-1964.

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Todos esses atores convergiram de uma ou de outra forma ao governo Lula ou como conselheiros que sugeriam operações da Polícia Federal (publicamente para coibir supostas ilegalidades, mas, na realidade, tutelados por litigantes privados, sobretudo no setor da telefonia) ou como vindicantes de pastas, ministérios e nomeações na máquina do governo – ou ainda como interlocutores midiáticos que injetavam anúncios em mídias ditas “sociais”, que defendessem cegamente tudo o que o PT determinava. Nessa última taxonomia, surge um novo ator, o ex-guerrilheiro Franklin Martins.

Nosso primeiro quadro de pensadores socioeconômicos era representado por Oliveira Vianna, por Paulo Prado, pela Semana de Arte Moderna, pela democracia de elites nieetzschinianas, postulada pelo jornal O Estado de S. Paulo. E, sobretudo, pelo Brasil essencialmente agrícola defendido por Eugênio Gudin. Talvez, como você verá mais a frente, o modelo de Lula, seguido por Dilma, seja a reimplantação desse modelo de Eugênio Gudin – sobretudo porque Lula, e agora Dilma, elevaram à enésima potência o nosso caráter de meros exportadores de matérias-primas justamente pelas vorazes demandas por grãos requeridas pela China. Não espanta, portanto, a atual febre musical pelo agro-brega, breganejo, sertanojo e a inserção de cantores da brasilidade pura no festival Rock in Rio. Afinal, o modelo agrário encontra os Euclides da Cunha que merece.

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No seu genial estudo de 30 anos atrás, Bresser Pereira chamava a atenção a um grupo de intelectuais, os quais ele apontava como donos da “interpretação nacional burguesa”. Punha ali o pessoal do Iseb, os economistas da Cepal, o Partido Comunista e gente como Helio Jaguaribe, o economista Ignácio Rangel e os filósofos Álvaro Ferreira Pinto e Roland Corbisier. Está também nesse cesto Nelson Werneck Sodré. Todos esses intelectuais criticavam duramente a interpretação agrária do Brasil: e propunham um projeto de industrialização e independência política. Estamos falando dos anos 50 e 60, quando a burguesia nacional, sobretudo representada por Roberto Simonsen e Ewaldo Lodi, são os ícones nacionalistas e industrializantes. Bresser Pereira chamou revolução de 64 de pacto autoritário modernizante: o populismo sai de cena e a burguesia agrária e mercantil e a industrial se unificam. É aquilo a que Roberto Campos chamou, em 1953, na Escola Superior de Guerra, da busca de “uma área possível de conciliação entre a ideologia do desenvolvimento e a ideologia de segurança”. Foi a época das multinacionais e dos tecnocratas. A crítica a esse modelo coube justamente ao “paper” escrito por Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto, que de resto marcou época em toda América Latina, desde que a partir de 1967 começou a circular em cópias mimeografadas: o famoso ensaio “Dependência e desenvolvimento da América Latina”. É a época em que começa a surgir os críticos do milagre brasileiro, como Celso Furtado, Carlos Lessa, Maria da Conceição Tavares, Alfred Stepan, Guido Mantega e Maria Moraes.

Qual o modelo econômico brasileiro a ser batizado sob Lula e Dilma?

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Talvez o que tenha nos salvado sejam as demandas internacionais por grãos. Alguns dados o processo inflacionário chegou a 2.012,6% em 1989 e 2.851,3% em 1993, estimados pelo índice geral de preços (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas. Nossa dívida externa chegou a representara 45,87% do PIB, no final do governo FHC, e caiu para 21,28% em dezembro de 2005, uma redução de mais de 50%, enquanto a dívida total diminuiu 19,55% e o PIB cresceu a uma taxa média real de apenas 2,6% ao ano. Em seu primeiro mandato, de 2003 a 2006, Lula nos deu taxas de crescimento do PIB de 0,5%, 4,9%, 2,3% e 3%. A economia mundial crescia então o dobro disso e os demais emergentes três vezes mais. No segundo mandato, a economia melhorou, mas a carga tributária nos fulminava: ela foi de 32,5% do PIB, em 2003, segundo os novos critérios do IBGE, para 35% do PIB em 2009. O crescimento do PIB foi impulsionado pelas agro-exportações para a China.

Nosso novo modelo é híbrido: mantém os velhos ideais do primeiro lustro do século 21, o do Brasil eterno exportador de matérias-primas, mas adota uma característica, digamos, pós-moderna: ao mesmo tempo em que olha para o passado, vislumbra um futuro que o ameaça. A ameaça do lulismo é ter de baixar os preços de produtos importados, deixar os tablets, a Apple e Steve Jobs entrarem aqui, e competirem conosco em pé de igualdade –mas não estamos capacitados para tal. O progresso individual nos incomoda, queremos salários e mamatas e cargos do aparelho estatal. A máquina burocrática em de continuar apaniguando, dando dinheiro por fora para as ditas “mídias sociais”, ou loteando cargos. O terror do dilmismo é o terror do futuro não-agrário. É o mesmo terror que o ensaísta Walter Benjamim viu no quadro Angelus Novus, de Paul Klee, hoje no Museu Israel, em Jerusalem –e sobre o qual Benjamim escreveu, em seu “Teses sobre a Filosofia da História”:

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“Uma pintura de Klee chamada Angelus Novus mostra um anjo olhando como se estivesse prestes a se afastar de algo que ele está contemplando fixamente. Seus olhos estão arregalados, sua boca aberta, suas asas estendidas. Isto é como uma imagem do anjo da história. Seu rosto está voltado para o passado.Onde nós percebemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única que se mantém empilhando destroços e os lançando na frente de seus pés. O anjo gostaria de ficar, acordar os mortos, e fazer todo o que foi destruído. Mas uma tempestade sopra do Paraíso, que tem capturado em suas asas com tal violência que o anjo não pode mais fechá-las. A tempestade o empurra irresistivelmente para o futuro ao qual ele vira as costas, enquanto o amontoado de ruínas cresce até o céu. Esta tempestade é o que chamamos de Progresso”.

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