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Economia

Anvisa afrouxa critérios para avaliação e classificação de agrotóxicos

Imprecisas quanto ao conceito de perigo, novas regras não ampliam cautelas e desprezam efeitos das substâncias sobre a saúde, inclusive quando combinadas

Um projeto de lei quer vedar o uso da técnica no Estado por considerá-la a mais nociva para a saúde e para o meio ambiente; para especialistas que defendem a mudança, a pulverização aérea de agrotóxico provoca danos persistentes; já o pesquisador e engenheiro agrônomo Ulisses Antuniassi, da Unesp, avalia que as grandes extensões de lavouras e o porte de algumas culturas fazem da pulverização aérea de defensivos agrícolas um método imprescindível para o agronegócio brasileiro
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Cida de Oliveira, da RBA - O governo de Jair Bolsonaro (PSL) reafirma sua parceria com a chamada “farra dos agrotóxicos”. Ontem (22), o Ministério da Agricultura liberou mais 51 agrotóxicos, que somam 290 em apenas sete meses. E hoje, por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), anunciou o afrouxamento dos critérios para avaliação e classificação desses produtos. De acordo com nota da agência regulatória, a medida atualiza e torna mais clara a classificação toxicológica ao estabelecer categorias e faixas de cores que vão facilitar a comunicação no país do perigo desses produtos.

Mas não é bem assim. Vice-presidente da regional sul da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), o agrônomo Leonardo Melgarejo avalia que os critérios só estariam sendo atualizados caso ampliassem as cautelas, o que implica na retirada do mercado de vários produtos. E não há qualquer sinalização nesse sentido. “Uma atualização efetiva deveria considerar os efeitos crônicos das substâncias, isoladamente, e também os efeitos sinérgicos resultantes da combinação de agrotóxicos, o que necessariamente ocorre na água e nos organismos que os absorvem”, afirma.

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Melgarejo também tem críticas em relação às mudanças na rotulagem. A comunicação dos perigos à vida e à saúde humana, e da classificação toxicológica, com o estabelecimento de categorias e faixas de cores – que a agência considera uma evolução –, para ele é a transmissão de conceitos imprecisos e sem clareza. “Não está clara a consideração de perigos.”

Produtos proibidos

As novas regras anunciadas estabelecem o uso de métodos alternativos à experimentação animal. E retiram exigências que a agência considera “redundantes” e “cientificamente desnecessárias” para a tomada de decisão regulatória.

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Nesse aspecto, Melgarejo chama atenção para o fato de o governo Bolsonaro estar aprovando produtos de uso proibido na União Europeia. “Ao mesmo tempo que retiramos do sistema regulatório a análise de risco com animais, consideradas ‘desnecessárias’, os riscos estão sendo aumentados. Isso porque o novo sistema privilegia impactos agudos, ligados à mortalidade. E despreza os impactos crônicos, ligados à infertilidade, sistema nervoso, aparecimento de tumores em longo prazo. Os estudos que avaliam esses problemas passam a ser ‘desnecessários’ e os agrotóxicos que seriam proibidos passam a ser permitidos”.

Segundo a Anvisa, as mudanças foram propostas com base nos padrões do Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals – GHS). Um sistema que define a classificação para fins de rotulagem do produto conforme desfecho de morte, analisado nos estudos toxicológicos agudos. Foi lançado em 1992, durante a Eco-92, realizada no Brasil, e a harmonização da classificação e rotulagem de produtos químicos é uma das seis áreas programáticas endossadas pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para fortalecer os esforços internacionais relativos à gestão ambientalmente segura de produtos químicos.

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Com isso, a regulação adotada no país passa a estar em consonância com regras internacionais, adotadas em países da União Europeia e da Ásia, entre outros. E que sai fortalecida, assim, a comercialização de produtos nacionais no exterior. O dirigente da ABA, porém, reforça que na prática esse sistema aumentará o perigo a que toda a população brasileira estará exposta. “Impactos de baixa intensidade, relacionados a danos pela exposição crônica em longo prazo, que não matam em curto prazo, perderão relevância na avaliação de risco”.

É bom frisar que intoxicações crônicas incapacitam populações por causa das alterações diversas que podem causar no sistema nervoso central, endocrinológico e imunológico, entre outros, que se agravam e se tornam letais. “Venenos com baixa probabilidade de matar podem ter alta probabilidade de causar infertilidade, câncer e assim por diante. Uma classificação de baixo risco de morte não significa necessariamente algo positivo”.

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Pacote do Veneno

Em seu comunicado, a Anvisa ressalta que fará reclassificação dos 2.300 agrotóxicos disponíveis no mercado brasileiro, que é também o maior consumidor mundial desses produtos desde 2008. E lembra que o registro e o monitoramento de agrotóxicos no Brasil são realizados de forma tripartite. A Anvisa avalia questões relacionadas à saúde humana, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) cuida das questões agronômicas e é responsável pelo registro dos produtos de uso agrícola. E o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é responsável pelas questões ambientais.

No entanto, há um Pacote do Veneno aguardando um momento político mais propício à sua votação na Câmara. Aprovado em comissão especial em maio de 2018 pela pressão dos ruralistas e manobras da então presidente da comissão, a atual ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), o pacote que praticamente revoga a atual Lei dos Agrotóxicos, retira a Anvisa e o Ibama de decisões importantes no processo de registro.

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“Se o governo, por meio da Anvisa, está mesmo ajustando nossas normas às normas da comunidade europeia, e vai reavaliar os agrotóxicos vendidos no Brasil, seria de esperar que muitos daqueles que estão entre os mais usados no país, viessem a ser proibidos no território nacional. Mas ainda ontem liberaram mais produtos que são proibidos na Europa. Então, cabe pensar que a contradição desses anúncios ilustra especialmente uma lógica atravessada, sem pé nem cabeça, difícil acompanhar. Parece mesmo que há uma mudança para pior”, afirma Melgarejo.

Característica macabra

Em janeiro, quando o Ministério da Agricultura havia liberado registro de 28 “novos” agrotóxicos, o professor e pesquisador da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) Marcos Pedlowski deu início a uma base de dados.  São sistematizadas informações quanto à empresa ou escritório solicitante do registro, o fabricante primário do produto autorizado, o país de origem da empresa que fabrica o produto, o nível de toxicidade humana e ambiental, bem como o status do produto na União Europeia.

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“Na lista dos agrotóxicos liberados nesta segunda está o principio ativo Sulfoxaflor, conhecido por dizimar enxames de abelhas. Com isso, aumenta ainda mais o número de produtos disponíveis no mercado brasileiro com essa mesma característica macabra”, avalia Pedlowski.

O “governo do veneno”, como ele vem classificando o governo Bolsonaro, corre o risco de enfrentar uma série de boicotes. “Desde que essa febre de aprovação de agrotóxicos começou, em janeiro, que ninguém se surpreenda se começarem banimentos em escala de produtos agrícolas brasileiros, flagrados com níveis de agrotóxicos acima dos tolerados em outras partes do mundo.  Isto sem falar na possibilidade de que o boicote iniciado na Suécia, porJohannes Cullberg, encontre rápida ressonância em outras partes da Europa. Isso apenas para começo de conversa.”

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