Trocando de papéis
Precisamos ter ideias e propostas para que o Brasil intensifique seu processo de inovação, que seja capaz de preencher as lacunas que nos separam da alta capacidade industrial
O cenário econômico atual está totalmente diferente do que alguns pensadores imaginariam quando faziam suas análises em meados de 2000. Há uma troca de papéis nos agentes mundiais em todos os aspectos, desde a forma de se conduzir a economia até a posição política social de alguns governos.
Antes de entrar nas argumentações, rechaço a ideia de utilizar a expressão/afirmação de que o mundo econômico está de pernas pro ar. É leviano, e errado, para dizer o mínimo. Prefiro declarar que estamos vivendo um ponto de inflexão nas curvas da teoria dos ciclos econômicos. Um momento raro e extremamente rico sob o conhecimento da histórica econômica mundial.
O diagnóstico primário do atual momento econômico mundial traz em linhas gerais um EUA implementando políticas de incentivo a geração de emprego apoiados nas ações do Estado; uma Europa abandonando seu papel de provedor de Bem Estar Social, reduzindo sua integração (pelo menos em idéias) a uma zona de livre comércio e uma moeda; Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul sendo convocados para reuniões importantes, e sem receberem puxão de orelha sobre sua gestão interna, e sendo conclamados a ajudar na recuperação econômica mundial.
Uma das formas mais emblemáticas de liberalismo econômico sempre foi a condução das políticas monetárias e fiscais estadunidenses, sempre de características expansionistas e sem preocupação com o seu financiamento, chegando a ultrapassar somas inimagináveis de financiamento de dívida e criando mecanismos de rolagem que contemplavam muito mais a imaginação de Ben Barnanke e Alan Greenspan do que os manuais da Ciência Econômica.
No ano passado, frente a um impasse que paralisaria até mesmo os pagamentos dos pensionistas dos EUA e salários de funcionários públicos, por exemplo, o governo se viu obrigado a propor uma intervenção além do circuito financeiro (salvamento dos bancos e empresas de hipotecas), operando em todas as bases da economia. Além disso, viu-se obrigado a rever os altos custos empenhados em suas forças militares.
Ou seja, Barack Obama mostrou-se altamente incisivo ao determinar que o Estado, novamente, em um movimento de inflexão do ciclo econômico, rompendo suas ações predecessoras, deveria se utilizar dos incentivos governamentais para a criação de empregos.
Além disso, colocou ainda a “impressora para rodar”, imprimindo mais moeda, alargando a base monetária, forçando a uma desvalorização cambial para ajudar sua indústria frente aos desafios do comércio mundial. A enxurrada de dólares abalou mercados, atrapalhou a estratégia comercial chinesa e criou arestas com parceiros antigos, como o Brasil.
Acima de tudo, e muito além disso, criou-se a nova imagem para a economia de Washington: intervenção deliberada do governo na condução da política. O que antes era tratado como ofensa, agora foi anotado como salvação.
Na última semana, tivemos mais um capítulo desta mudança na condução econômica: Obama incentivará a geração de empregos, através de um “Job Action”.
Na Europa, após séculos de uma construção paternalista, que, mesmo integrada entre seus vizinhos, via o mundo com olhar torpe, sempre tentando ressalvar sua maneira de conduzir a afamada União Européia.
Com ações incisivas de governo e planejamento econômico, levou sua população a atingir os melhores e mais altos níveis de desenvolvimento humano, sempre apoiando em programas de subsídios fortes, transporte eficiente e uma teia previdenciária ampla.
Todas estas características, neste momento, parecem estar sendo deixadas para trás. Mesmo com uma moeda única, os maiores países europeus sentem o peso deste arcabouço criado, e buscam reinventar seu liberalismo social, ou seja, colocar os agentes sociais a disposição da população de forma indireta, sob uma remuneração, uma contrapartida ainda maior de sua população.
O equilíbrio das contas públicas, que antes eram rígidas (mesmo não sendo eficientes e cumpridos) devido a adoção do Euro, receberam alguma flexibilidade como os Gregos e Espanhóis.
Enfim, pelo lado Europeu, a teia de bem estar social tende a se reduzir, invertendo mais uma vez o papel de proteção, deixando mais livre (para não dizer desprotegidos) sua população, e cobrando agora dos países centrais como Alemanha e França o preço da integração, que reconheço a heterogeneidade que todos já viam, exceto o olhar monocromático da União Européia.
Já para os famosos subdesenvolvidos (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul), que reiteradamente aproveitaram as transições da pauta industrial dos países desenvolvidos, apóiam-se em uma população jovem, ávidos por tecnologias, com crescimento de renda e emprego, porém, sempre marginalizados nas tomadas de decisão.
Ora, os marginalizados são chamados ao centro da discussão econômica, mas para se mostrarem mais abertos a aceitarem a interação entre as grandes economias. Esta é a armadilha: com um processo de protecionismo crescente pelo lado estadunidense, e uma Europa paralisada por seu imbróglio Estado x Bem Estar, só resta em termos de mercados os países subdesenvolvidos, que oferecem todas as variáveis citadas no parágrafo anterior, e poderão garantir a salvação dos grandes desenvolvidos.
A alteração das posições econômicas dos países é natural, faz parte do ciclo capitalista e precisa ser utilizado para potencializar a ascenção dos emergentes. Esta é a arma e o ponto principal a se destacar novamente para nosso país.
Precisamos ter idéias e propostas para que o Brasil intensifique seu processo de inovação. Esta inovação precisa ser capaz de preencher as lacunas que nos separam da alta capacidade industrial, da promoção logística e deslaçar o pacote de problemas políticos, incluindo neste a desoneração tributária, a redução dos partidos políticos e o clientelismo fisiológico do Estado.
Antônio Teodoro é economista e professor
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