Djamila Ribeiro defende afroconsumo como questão política e econômica
Filósofa destacou impacto do racismo estrutural na percepção do consumo, enquanto executivas de grandes marcas apresentaram iniciativas de inclusão
247 - Fortalecer o empreendedorismo negro não deve ser entendido como caridade, mas como um movimento estratégico de economia e política. A afirmação foi feita pela filósofa e ativista Djamila Ribeiro durante a roda de conversa “Potências que Movem”, realizada na sexta-feira (12) pela FutureBrand São Paulo, ecossistema de gestão de marcas, cultura e negócios. O encontro reuniu nomes como Adriana Barbosa, fundadora da Feira Preta, Cecília Preto Alexandre, CMO da C&A, Luciana Batista, presidente Brasil da Coca-Cola, e Paula Sayão, CMO do Banco do Brasil, sob mediação de Karen Fontana, CCSO da FutureBrand. A informação foi publicada pela FutureBrand São Paulo.
Ao longo de sua fala, Djamila Ribeiro chamou atenção para os reflexos da escravidão ainda presentes no imaginário coletivo. “Não podemos mais naturalizar o imaginário de que as pessoas negras estão sempre em posições de menor destaque. De onde vem, por exemplo, a percepção de que um homem negro dirigindo um carro de luxo é porque ele é motorista? Ou a hipersexualização da mulher negra? Das teorias racistas do século XIX”, afirmou. Para a filósofa, embora haja avanços, ainda é preciso transformar a forma como a sociedade percebe a presença da população negra no consumo e na publicidade.
A mediadora Karen Fontana reforçou a necessidade de mudanças estruturais nas estratégias das empresas. “É preciso colocar as questões do afroconsumo no centro das decisões de negócios. Do contrário, temos ações frágeis e pouco estratégicas”, alertou.
A fundadora da Feira Preta, Adriana Barbosa, destacou que o consumo negro deve ser compreendido como identidade e posicionamento político. “Quando olhamos para o presente, vemos que se inicia a sofisticação do consumo, que agora traz nuances da questão da identidade. É como se as pessoas negras dissessem: ‘se eu não me vejo, eu não compro’”, explicou. Ela também apresentou dados de pesquisa de 2023: 81% dos consumidores já deixaram de comprar de marcas por discriminação e 64,9% priorizam empresas que apoiam causas negras.
Djamila Ribeiro concluiu sua participação questionando a ausência de representatividade em setores de prestígio. “As marcas ainda têm resistência, por exemplo, em estrelar pessoas negras no mercado de luxo. Se, historicamente, campanhas de produtos como creme dental e margarina foram protagonizadas apenas por pessoas brancas, por que não podemos ocupar outros espaços diferentes do imaginário já estabelecido?”, provocou.
Iniciativas das marcas
Cecília Preto Alexandre, CMO da C&A, relatou que a empresa alcançou 30% de líderes negros — meta inicialmente prevista para 2030. “Ainda há um caminho a ser percorrido. Não fazemos por modismo, mas porque acreditamos na relevância. Nossos programas de estágio, por exemplo, são afirmativos para pessoas pretas. Não basta o discurso, mas as boas práticas dentro de casa, só assim vamos evoluir”, afirmou.
Já Luciana Batista, presidente Brasil da Coca-Cola, enfatizou o papel da escuta ativa. “Não adianta termos representatividade de pessoas negras nas peças publicitárias se não há escuta ativa delas nas etapas anteriores, de criação. Temos processos internos para garantir isso”, destacou.
Representando o Banco do Brasil, Paula Sayão ressaltou a importância do fomento direto ao afroempreendedorismo. Segundo a executiva, a instituição lançou recentemente um edital de R$ 22 milhões para apoiar microempreendedores, levando em conta questões de raça e gênero. “É preciso financiar o afroconsumo na prática”, disse. Ela também lembrou que o banco tem hoje sua primeira presidente mulher, negra e LGBTQIA+, o que representa “um marco em um setor ainda dominado por homens”.
