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“Inovação acadêmica é imprescindível para o desenvolvimento do país”, diz professor da UNB

João Paulo Longo explica que quando a universidade pública consegue gerar inovação aplicada, contribui diretamente para a soberania tecnológica

João Paulo Longo, professor associado da Universidade de Brasília (UnB) (Foto: Divulgação | Freepik)

Beatriz Bevilaqua, 247 - A força criativa do Brasil passa, necessariamente, pela ciência. Em um país marcado por profundas desigualdades e pela dependência histórica de tecnologias importadas, transformar o conhecimento produzido nas universidades públicas em inovação aplicada é um desafio estratégico e também uma oportunidade de desenvolvimento econômico e social.

Esse foi o centro da conversa com João Paulo Longo, professor associado da Universidade de Brasília (UnB), doutor em Nanociência e sócio-fundador da Glia Innovation, startup brasileira especializada no desenvolvimento de nanomateriais para a indústria cosmética. Pesquisador com ampla experiência em projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I), Longo defende que a ciência não deve ficar restrita aos laboratórios, ela precisa chegar à sociedade na forma de soluções concretas.

Para ele, inovar é justamente fazer a ponte entre o conhecimento de base, produzido na universidade, e os problemas reais da sociedade e do mercado. “A ciência básica é fundamental e precisa ser valorizada, mas o empreendedorismo científico exige um outro olhar que é identificar demandas concretas e oferecer soluções viáveis”, afirma.

O desafio de tirar a inovação da academia

Apesar dos avanços, ainda existe no Brasil, e no mundo, um tabu que separa ciência e mercado. A burocracia institucional, a rigidez dos modelos acadêmicos e até uma resistência cultural fazem com que muitas tecnologias permaneçam engavetadas, sem alcançar impacto social ou econômico. Segundo Longo, esse cenário precisa mudar.

“A universidade pública tem um papel estratégico no desenvolvimento do país. Quando ela consegue gerar inovação aplicada, contribui diretamente para a soberania tecnológica, para a geração de riqueza e para a redução da dependência externa”, destaca. Ele lembra que grandes transformações históricas, como a Revolução Industrial, só foram possíveis porque havia um sólido acúmulo prévio de conhecimento científico.

Em um mundo pós-pandemia, marcado pela crise da globalização e pela concentração de cadeias produtivas em poucos países, dominar tecnologia deixou de ser uma escolha, tornou-se uma questão de sobrevivência econômica. “A prosperidade é filha da inovação”, resume o pesquisador, ecoando debates recentes que, inclusive, estiveram no centro do Prêmio Nobel de Economia.

Fundada em 2018 por quatro cientistas, a Glia Innovation nasceu justamente desse desejo de aplicar nanotecnologia para resolver problemas concretos da indústria. Focada inicialmente no setor cosmético, a empresa desenvolveu plataformas capazes de aumentar significativamente a performance de ativos, como a vitamina C, prolongando seus efeitos na pele e reduzindo desperdícios.

Hoje, a Glia possui um portfólio com mais de 50 produtos e oito plataformas nanotecnológicas próprias, além de tecnologias avançadas como o uso de peptídeos inteligentes. Um dos destaques é a chamada “tecnologia drone”, que permite direcionar ativos para células específicas da pele, aumentando a eficácia com quantidades mínimas de matéria-prima.

“O resultado é fazer mais com menos”, explica Longo. Além de gerar diferenciação e melhores margens financeiras para as empresas que utilizam essas tecnologias, o modelo contribui para a sustentabilidade ambiental, ao reduzir o uso de recursos naturais sem comprometer a performance dos produtos.

Ciência, inovação e projeto de país

Para além do sucesso empresarial, a experiência de João Paulo Longo aponta para uma reflexão maior: o Brasil precisa investir em currículos acadêmicos, políticas públicas e ecossistemas de inovação que estimulem o surgimento de empreendedores científicos. Transformar conhecimento em valor agregado é um caminho para fortalecer cadeias produtivas nacionais, gerar empregos qualificados e reduzir desigualdades.

“A inovação não é luxo. É condição fundamental para o desenvolvimento”, afirma o pesquisador. Em um país com enorme capacidade científica e criativa, aproximar universidade, mercado e sociedade pode ser uma das chaves para um projeto de nação mais soberano, justo e sustentável.

Assista a entrevista na íntegra aqui: