Mulheres negras ampliam estudos e enfrentam desigualdades no empreendedorismo
Pesquisa do Sebrae mostra que, apesar de maior preparo e resiliência, empreendedoras negras ainda recebem menos e enfrentam barreiras estruturais
247 - Elas estudam mais, se qualificam mais e constroem importantes redes de apoio. Ainda assim, para as mulheres negras que empreendem no Brasil, os obstáculos estruturais permanecem profundos. Os dados são da pesquisa “Empreendedorismo Negro no Brasil”, divulgada pelo Sebrae, que revela tanto a potência quanto os desafios enfrentados por esse grupo.
Segundo o levantamento, 65% das empreendedoras negras têm ensino médio completo ou mais — um índice superior ao dos homens negros (46,1%) e praticamente equivalente ao dos homens brancos (65,2%). Apenas as mulheres brancas, com 79,8%, superam esse nível educacional. Ainda assim, a escolaridade não se traduz em renda proporcional.
Rendimento menor, esforço maior
Apesar da qualificação, as mulheres negras que comandam negócios próprios ganham, em média, R$ 1.986 — um valor 27% menor que o de homens negros, 48% inferior ao de mulheres brancas e 61% menor que o de homens brancos. Para o Sebrae, essa desigualdade reflete o racismo estrutural que atravessa o ambiente econômico brasileiro.
Fau Ferreira, gestora nacional de Afroempreendedorismo da instituição, afirma que a desvalorização de produtos feitos por mulheres negras é um dos sintomas desse cenário. “Os clientes não querem pagar o valor do produto quando vendido diretamente pela empreendedora, enquanto o mesmo produto colocado em uma loja de grife pode ser vendido por inúmeras vezes o valor original e as pessoas costumam pagar”, pontua.
Empreender para transformar
A empreendedora Brenda Prates encontrou no próprio processo de transição capilar a inspiração para iniciar um negócio. Em 2017, criou o instablog Clube Raiz, voltado a orientar pessoas sobre cuidados com cabelos crespos e cacheados. “Ainda trabalhava como funcionária pública, mas enxerguei um potencial mercado nessa época”, lembra.
Ela conta que a motivação veio da carência de informações adequadas para esse público. “Muitas pessoas não davam atenção a esse público, não encontrávamos direcionamento certo sobre como escolher produtos para cabelos com curvaturas, como usar, em quem se inspirar. Então aproveitei para assumir meu cabelo natural, após anos de alisamentos, e fazer dessa fase o início de um negócio”, afirma.
Dois anos depois, em 2019, abriu a loja física em Cuiabá (MT). O Clube Raiz envia produtos para todo o Brasil e também ampliou a linha para itens de pele. O maior desafio, diz Brenda, é manter competitividade em um mercado em mudança constante. Ainda assim, destaca o impacto social do trabalho que realiza. “Ajudamos a valorizar a beleza natural de muitas mulheres e pessoas que não conseguiam se olhar no espelho por não se encaixarem num padrão que a sociedade impôs como ‘o que é ser bonito e aceitável’. A autoestima vai muito além de estética, ou simplesmente aceitar seu cabelo, como nosso nome diz: valorizamos nossas raízes”, reforça.
Visibilidade em crescimento, estrutura ainda limitada
Brenda observa que o empreendedorismo negro tem ganhado mais espaço nos últimos anos, especialmente na mídia. “Acredito que, nos últimos anos, o empreendedorismo negro teve um crescimento significativo, especialmente na mídia. Temos visto mais pessoas se destacando com seus negócios, mas ainda encontram muitos desafios e barreiras de entrada como informalidade e falta de oportunidades efetivas”, avalia.
Para ela, parte das soluções passa pela educação. “Acredito que muitas oportunidades poderiam ser implementadas no ensino das escolas, analisando desde cedo os perfis com potencial empreendedor”, sugere.
