Professora de física abre escola para resgatar infância raiz
Darla Fortunato transforma crise em oportunidade e cria em Palmas (TO) um espaço educativo que valoriza o brincar livre e o contato com a natureza
Beatriz Bevilaqua, 247 - A professora de Física Darla Fortunato, gaúcha de Uruguaiana e radicada em Palmas (TO) há 13 anos, transformou um momento de crise em uma oportunidade para empreender na área da educação. Em meio à pandemia, após ser demitida da universidade onde lecionava, ela decidiu investir em um projeto que resgata o essencial da infância: o brincar livre, o contato com a natureza e a convivência sem telas. Assim nasceu o Espaço Pimentinhas, um ambiente de contraturno escolar e cuidado infantil que hoje atende cerca de 45 crianças de até 10 anos.
Formada em Licenciatura em Física e mestra em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), Darla construiu uma carreira acadêmica sólida, mas sentia-se frustrada com a falta de valorização da profissão. “Eu amava estar em sala de aula, mas a realidade salarial era muito dura. Quando perdi o emprego na universidade, precisei me reinventar”, conta.
Foi então que o antigo dono do Espaço Pimentinhas, frequentado por seus dois filhos desde pequenos, decidiu vender o local. “Eu já admirava a proposta do espaço, que priorizava a liberdade e o brincar. Quando surgiu a oportunidade de comprar, conversei com meu marido e decidimos arriscar. Foi um ato de coragem, em plena pandemia”, relembra.
Com uma ampla área ao ar livre, o Espaço Pimentinhas é pensado para que as crianças possam correr, explorar e se conectar com o mundo real. “Aqui não entram eletrônicos. As crianças brincam de bola, sobem em árvores, fazem bolo de terra, jogam elástico. Queremos resgatar a infância que tínhamos há 20 ou 30 anos, mas num ambiente seguro e supervisionado”, explica Darla.
A empreendedora destaca que o excesso de telas têm gerado efeitos preocupantes: “Muitos pequenos estão com miopia precoce, hiperatividade e dificuldade de atenção. Além disso, há uma perda de interesse pelo mundo ao redor. As telas oferecem dopamina rápida, e isso tira a curiosidade natural da criança”, afirma.
A educadora defende que o primeiro passo para reconectar as crianças à natureza é reduzir o uso de aparelhos eletrônicos. “A essência da criança é a curiosidade. Quando ela está livre dos estímulos artificiais, volta a se encantar com o simples: brincar de pé no chão, sentir a grama, mexer na terra. Isso traz equilíbrio, diminui a ansiedade e melhora até o sono”, observa.
Desafios e aprendizados do empreendedorismo
Assumir uma empresa em plena pandemia exigiu muitos enfrentamentos e incertezas. “Eu não entendia nada de gestão, contabilidade ou tributos. Fiz cursos online, pedi ajuda e aprendi na prática”, conta. A empreendedora também enfrentou o medo de não conseguir pagar as contas e manter o negócio em funcionamento.
Hoje, o Espaço Pimentinhas se consolidou como referência em educação afetiva e não violenta na capital tocantinense. Além das atividades regulares, o espaço oferece colônias de férias que atraem dezenas de crianças.
Darla acredita que o futuro da educação passa por um equilíbrio entre tecnologia e natureza. “Não se trata de rejeitar o mundo digital, mas de usá-lo com consciência. Precisamos garantir que as crianças tenham experiências reais, que aprendam com o corpo, com o outro, com o ambiente”, diz.
A empreendedora também vê potencial para que outros educadores sigam o mesmo caminho. “Quem tem formação em pedagogia ou áreas afins pode começar pequeno, com um quintal, uma horta, um espaço simples de brincar. Está crescendo um movimento chamado desemparedamento escolar, que propõe que a aprendizagem aconteça além das quatro paredes. É sobre permitir que a criança seja criança”, incentiva.
Inspirada em metodologias como a de Emilia Reggio, Darla acredita que o brincar é a base da educação infantil. “A criança aprende enquanto brinca. Nosso papel é proporcionar um ambiente que estimule a autonomia, a convivência e a imaginação. Esse é o verdadeiro investimento no futuro”, conclui.
Assista a entrevista na íntegra aqui:
