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Entrevistas

Danielle Cireno: “a aporofobia está associada ao racismo”

Socióloga lembra que pessoas não brancas costumam ser associadas à pobreza, em função dos quase 400 anos do regime de escravidão. Assista na TV 247

Danielle Cireno / população de rua (Foto: Reprodução | Jorge Araujo/Fotos Públicas)
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Por Ricardo Nêggo Tom, 247 - Aporofobia é um neologismo criado pela espanhola Adela Cortina, professora de ética e filosofia política da Universidade de Valença, para classificar a aversão e o desprezo pelos mais pobres na sociedade. No Brasil, tanto o termo quanto o seu significado, têm sido mais explorados e gerado muitos debates. Principalmente, pelo trabalho social que realiza o padre Júlio Lancelotti com pessoas em situação de rua. Professora de sociologia da UFMG, Danielle Cireno considera que a pobreza no Brasil está diretamente ligada ao período em que o escravagismo vigorou no país e a ausência de políticas públicas de inclusão social. Instada a definir quem é pobre no Brasil, Danielle considera que “objetivamente, nós temos uma linha de pobreza calculada pelo IPEA, que define quem é ou não pobre no Brasil. Eu diria que pobres são as pessoas que não consomem uma determinada quantidade de bens, pessoas que moram em comunidades, pessoas que estão em situação de rua ou em extrema vulnerabilidade social. Mas precisamos dizer também, que, em geral, costumam ser identificadas como pobres no Brasil as pessoas não brancas. Existe essa associação dos negros com a pobreza. “A socióloga seguiu abordando o tema sobre o recorte racial e concordou que a aporofobia é um dos sintomas do racismo na sociedade, como consequência dos 388 anos de escravagismo vigentes no país.

Ela entende que “a aporofobia está associada ao racismo. São duas reações discriminatórias que têm uma correlação muito grande entre elas. E não apenas no Brasil. Em todos os países onde a população negra excede um contingente acima de 20% e parte dessa população encontra-se em situação de vulnerabilidade, essas reações se convergem. Traçando um paralelo entre Brasil e EUA, por exemplo, dado a semelhança, a idade dos países e pela incidência de uma, digamos, quase bipolaridade racial, com os Estados Unidos tendo um terço da população negra e nós tendo mais da metade, observamos que houve uma preocupação norte-americana de integrar o negro no desenvolvimento capitalista. Apesar de resistências, como a guerra da secessão, eles foram incluídos. Já no Brasil, o negro saiu da escravidão e foi largado à própria exclusão, sem poder frequentar a escola e sem espaço nessa nova ordem econômica que estava por se estabelecer. Além disso, trabalhadores brancos foram importados tornando a concorrência absurdamente desleal. Pessoas que dominavam pouco o português, mas tinha um grau de escolarização bastante razoável e tinham todo o inconsciente do brasileiro. Que é a ideia do povo europeu, branco, e, mais tarde, até mesmo a população asiática que veio para São Paulo. Então, a associação do negro com uma situação social vulnerável existe desde sempre”.

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A importância das políticas públicas afirmativas, como as que foram criadas nos governos do PT, e de programas sociais como o “Bolsa Família”, foi defendida por Danielle Cireno como fundamentais ao combate à pobreza e a inclusão social. “A percepção da pessoa quase pobre, classe média baixa, C, D, E, que ganhe até quatro mil reais, a intenção deles é subir esse muro com medo de escorregar para baixo. E, no momento em que você cria um ‘Bolsa Família’ e o torna um programa popular, criando uma forma de supervisionar e assistir socialmente os beneficiados, essas pessoas passam a receber essa pequena ajuda, que é uma transferência direta de renda, mas com condicionalidades impostas. E, no resto do mundo, basicamente não existe condicionalidade para transferência direta de renda. No Brasil, nós temos pelo menos quatro, e eram cinco condicionalidades. Para chegar R$ 400,00 nas mãos de uma pessoa, não se gasta menos de R$ 2.000,00 para cada uma dessas famílias. A vacinação da criança tem que estar em dia, a criança tem que estar frequentando a escola, a mãe tem que frequentar o posto de saúde. Por mais que tenham havido críticas e uma avaliação de que o programa se tornou caro e conservador, porque vai tomar conta da família e não apenas do aluno, o projeto é fantástico. E pela obrigatoriedade de as crianças estarem na escola para receber o benefício, também ajudou a combater a evasão escolar, que, dependendo da localidade, podia chegar a 80% de uma série”.

A socióloga comentou algumas declarações dadas pelo presidente Jair Bolsonaro, quando era deputado federal, nas quais ele manifestou todo o seu ódio e desprezo pelos mais pobres, dizendo, entre outras coisas, que era perda de tempo investir em educação para os mais pobres e que pobre não deveria nascer porque não teria futuro. Responsabilizando a política do atual governo pelo aumento da pobreza e da miséria no país, Cireno diz que “claramente esse governo é um desastre, do ponto de vista econômico e social. A concentração de renda aumentou e houve um verdadeiro desmonte das políticas públicas. Na verdade, esse desmonte começou no governo Temer, cuja primeira medida foi bloquear parte do recurso do ‘Bolsa Família’ e criar um programa chamado ‘Criança Feliz’, destinado apenas a crianças até os 3 anos de idade. Observando as falas de Bolsonaro sobre os mais pobres, a gente percebe o quanto ele é ignorante e aporofóbico ao extremo. Ele fala como se acabar com os pobres fosse uma política econômica. Passa uma ideia de que filho de pobre nasce geneticamente modificado, o que justificaria uma limpeza étnica e social no país.

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