Bem Legal: Cartão é negociado livremente em site de vendas em Maceió
Beneficiários do vale-transporte, em Maceió, têm utilizado redes sociais e até sites de comércio eletrônico para vender a terceiros os cartões com créditos (passagens) a que têm direito para o custeio do ir de casa ao trabalho, e vice-versa; a venda é ilegal e cé onsiderada crime de falsidade ideológica
Por Maikel Marques/Gazetaweb.com Centenas, talvez milhares, de beneficiários do vale-transporte, em Maceió, têm utilizado redes sociais e até sites de comércio eletrônico para vender a terceiros os cartões com créditos (passagens) a que têm direito para o custeio do ir de casa ao trabalho, e vice-versa. A venda é ilegal e considerada crime de falsidade ideológica.
"O vale-transporte é direito apenas do trabalhador. É direito pessoal e intransferível, de acordo com legislação federal. O repasse dos créditos a terceiros é considerado crime de falsidade ideológica", avisa Toni Melo, gerente do Cartão Bem Legal, instrumento utilizado para pagamento por cada viagem no transporte coletivo.
Embora seja crime, a venda dos créditos ocorre com regularidade. "Sim. Estou vendendo meus créditos do vale--transporte. Vendo por R$ 280", confessou à Gazeta de Alagoas, ontem, a funcionária de uma empresa. Para repassar o que não pode ser comercializado, ela fez anúncio num site de classificados on-line.
"O cartão tem 308 créditos. O pagamento tem que ser feito à vista", explicou Débora (prenome informado ao telefone). "O local para entrega e recebimento do dinheiro é o bairro da Serraria", emendou, sem qualquer preocupação com discrição na negociação. "É vale-transporte de empresa. Não é passe estudantil", enfatizou.
Se quiser, cada cobrador de ônibus poderia solicitar identificação do portador do cartão, quando da passagem pela catraca eletrônica, em caso de desconfiança. Na prática, a cobrança, a fiscalização, não ocorre. Uma vez constatado o crédito para pagamento da passagem, a "ordem" é mesmo liberar a passagem do portador.
"Muitas vezes, o usuário do transporte coletivo nem tira o cartão da carteira. Encosta na maquininha. Com a confirmação do crédito, passa pela catraca e segue viagem", explicou o sindicalista Sandro Régis, atual presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Transporte Rodoviário do Estado de Alagoas (Sinttro).
De fato. Como a fiscalização é falha, a venda continua escancarada. "Bom dia, sou estudante e estou alugando o meu cartão Bem Legal para 2018. Moro perto da escola e não irei utilizar. Não pague inteira, pague meia. Venha comigo, vamos negociar". Eis a proposta de "Delk Smyle", pseudônimo de uma estudante.
Beneficiam-se da venda ilegal quem não tem direito ao vale-transporte e ainda quem não está matriculado em nenhum estabelecimento comercial. A associação dos Transportadores de Passageiros do Estado de Alagoas (Transpal) sabe que a prática criminosa tem sido adotada por diversos usuários.
"Temos ciência da ilegalidade. Infelizmente, ocorre com uma certa frequência", ratificou Toni Melo, segundo o qual, os empresários donos dos coletivos estudam a possibilidade de implantar a biometria facial em todos os veículos. "Nesse caso, só passaria pela catraca o verdadeiro titular do cartão".
Como não há data para adoção da nova tecnologia, persiste a malandragem. É mãe utilizando cartão de filho estudante; é pai desfrutando do vale-transporte do filho que tem veículo próprio. Se quiser, o patrão pode puxar relatório e verificar se o deslocamento do empregado ocorre no horário compatível com seu trabalho.
"Essa verificação é possível desde 2012, quando o sistema foi automatizado. Muitas das empresas reduziram, e muito, suas despesas com vale-transporte porque constataram que, embora seja um direito legal, alguns de seus colaboradores utilizaram o recurso para beneficiar terceiros", diz Toni Melo.
A revenda dos créditos pode ter explicação matemática, apurou a Gazeta. Ao solicitar o benefício, o trabalhador concorda com desconto de até 6% sobre seu salário. O restante da despesa é custeado pelo empregador. Com a venda, o trabalhador compensa os 6% e lucra embolsando o restante.
Trezentas mil pessoas utilizam os cartões eletrônicos como meio de pagamento de passagens. Desse total, 80% (240.000) são cartões de vale-transporte, segundo dados da Transpal. "À exceção do Cartão do Cidadão, que pode ser pago por uma pessoa e utilizado por terceiros, os demais só podem ser utilizados pelos titulares".
