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E-Cigarette Summit UK debate papel dos vapes no controle do tabagismo e expõe riscos da proibição brasileira

Especialistas mostram como regulação baseada em evidências acelera queda do tabagismo, enquanto veto total no Brasil fortalece o mercado ilegal

E-Cigarette Summit UK debate papel dos vapes no controle do tabagismo e expõe riscos da proibição brasileira (Foto: Divulgação )

247 - A 13ª edição anual do E-Cigarette Summit, realizada em 5 de dezembro de 2025 no Royal College of Physicians, em Londres, ocorreu em um momento decisivo: enquanto no Reino Unido avançava na Câmara dos Lordes um projeto de lei que amplia significativamente os poderes de regulação sobre produtos de tabaco, cigarros eletrônicos e demais formas de entrega de nicotina, especialistas de vários países se reuniram para debater e divulgar estudos recentes sobre o papel dos cigarros eletrônicos e dos novos produtos de nicotina em um futuro livre do cigarro.

Os dados de crescimento desse mercado surpreendem: nos últimos cinco anos, o número de usuários de cigarros eletrônicos cresceu 81%, o de tabaco aquecido, 80%, e o de sachês de nicotina, 600%, segundo informações divulgadas no E-Cigarette Summit. E este crescimento é particularmente relevante quando observado o cenário em países que optaram pela regulamentação de produtos alternativos de nicotina, como Reino Unido, Suécia e Nova Zelândia, por exemplo. Nesses locais, a disponibilização de alternativas menos prejudiciais, sob um quadro regulatório adequado, tem sido associada a uma queda notável nas taxas de tabagismo tradicional, sugerindo uma estratégia eficaz de saúde pública para acelerar a diminuição do uso de cigarros convencionais.

Enquanto o Reino Unido caminha para fortalecer sua estrutura regulatória, o cenário brasileiro emergiu como contraponto: em 2024, o tabagismo no Brasil voltou a crescer, passando de 9,3% para 11,6%, e o país mantém a proibição total de cigarros eletrônicos, apesar de já contar com cerca de 4 milhões de usuários adultos, segundo o Vigitel 2024.

“As pessoas estavam usando e-cigs para parar de fumar espontaneamente”, diz Matt Neill.

O pesquisador Matt Neill, do King’s College London, lembrou que, quando o Summit começou, os cigarros eletrônicos “engatinhavam”. Hoje, o mercado inclui vapes, sachês de nicotina, dispositivos de tabaco aquecido e uma multiplicidade de alternativas.

“Vimos uma grande proliferação de produtos de cigarro eletrônico. E entrei nessa área porque as pessoas que fumavam estavam usando cigarros eletrônicos para parar de fumar espontaneamente — o que era ótimo de ver.”

Neill destacou que seu compromisso central permanece o mesmo: reduzir desigualdades e ajudar fumantes a abandonar o produto mais danoso.

Mas ele alertou que o avanço entre jovens, aliado ao crescimento de mercados ilícitos, exige atenção:

“Como garantir que produtos de boa qualidade — e definitivamente não ilícitos — sejam utilizados? E como garantir que representem riscos mínimos?”

Perguntas como essas são prioritárias para países que proíbem, e não regulam, os dispositivos — como é o caso do Brasil.

Lion Shahab: regulação proporcional ao risco é essencial

O professor Lion Shahab, do University College London, reforçou que a estratégia de redução de danos é indispensável para apoiar fumantes que não conseguem parar com métodos tradicionais.

“Precisamos de regulamentação apropriada e proporcional para ajudar quem usa o produto mais nocivo — os cigarros à combustão — a migrar para alternativas menos arriscadas.”

Shahab destacou que medidas de saúde pública funcionam melhor quando combinam restrições ao produto mais perigoso (como tributação elevada) com acesso a produtos de menor risco com controle sanitário.

Ele lembrou que o Reino Unido — justamente o país que discute agora regras ainda mais rigorosas — é também um dos mais bem-sucedidos do mundo na redução do tabagismo, graças a políticas integradas de apoio ao consumo de dispositivos eletrônicos.

“Vimos um aumento nas tentativas de parar de fumar e o menor índice de tabagismo da história — algo em torno de 10%.”

Questionado sobre o Brasil, foi direto:

“Faria sentido permitir a venda legal de cigarros eletrônicos no Brasil, para ampliar o acesso e evitar que as pessoas usem produtos ilícitos potencialmente mais nocivos.”

Karl Erik Lund: proibir alternativas [de nicotina] mantém fumantes presos ao cigarro

O pesquisador sênior Karl Erik Lund, do Instituto Norueguês de Saúde Pública, apresentou evidências que mostram a enorme diferença de risco entre produtos combustíveis e não combustíveis.

“A redução de danos é central porque muitos fumantes não conseguem ou não querem parar. Precisam de nicotina em formas menos perigosas.”

Lund citou o exemplo da Noruega e da Suécia, onde órgãos reguladores adotam políticas proporcionais ao risco, contribuindo para taxas de tabagismo próximas de 5%.

Ao comentar o caso brasileiro — que vê o tabagismo subir enquanto os vapes seguem ilegais no país, mas amplamente disponíveis por meio do contrabando — ele fez um alerta:

“Quando você proíbe produtos menos nocivos, acaba prendendo fumantes ao produto mais perigoso. O máximo que uma proibição alcança é atrasar a migração para alternativas mais seguras.”

E concluiu:

“É muito melhor ter um mercado de nicotina regulado, permitindo esses produtos e informando os fumantes de que são opções menos arriscadas.”

Lições da experiência internacional e o contraste com o Brasil

Os especialistas citaram exemplos consistentes:

  • Suécia: o tabagismo diário caiu de 16,5% (2004) para 5,4% (2024) com regulação diferenciada para produtos alternativos de nicotina, ficando próximo de se tornar o primeiro país do mundo livre do tabagismo.
  • Reino Unido: apoia cigarros eletrônicos no sistema público de saúde e distribui kits gratuitos para fumantes com o projeto “Swap to Stop”, “Trocar para Parar” em português. O relatório do programa mostra que cerca de 2/3 dos participantes cessaram definitivamente o hábito de fumar.
  • Nova Zelândia: reduziu o tabagismo quase pela metade após regulamentar vapes em 2018, caindo de 12,2% para 6,8%.

Em todos os casos, políticas de redução de danos caminham lado a lado com regras rígidas de proteção a jovens, limites de nicotina, fiscalização sanitária e restrições de publicidade. O Brasil, por sua vez, vive um paradoxo: mantém a proibição, mas vê o uso crescer via mercado contrabandeado por meio do crime organizado — exatamente o cenário que especialistas internacionais dizem ser o mais perigoso.