Lego de guerra. A violência cada vez mais presente nas caixas de tijolinhos
Pesquisadores neozelandeses denunciam uma corrida armamentista no reino dos tijolinhos Lego. O brinquedo há muito deixou de ser inocente
Por Soline Roy – Le Figaro
No princípio era um tijolo em miniatura. Por muito tempo, Lego foi um mundo de pura construção que não conhecia nem vilão e nem mocinho. Mas em 1974, nasceu o primeiro personagem (um policial, mas sem o seu ladrão), e dez anos mais tarde, os inimigos chegaram : face aos cavaleiros brancos das cruzadas, o mau caráter Black Falcon . Então, de acordo com um estudo conduzido por pesquisadores neozelandezes, publicado na revista científica PlosOne, é o começo de uma onda de violência e de uma corrida armamentista que tem se abatido no universo Lego …
«Os produtos da Lego não são tão inocentes quanto antes », avalia Christoph Bartneck, professor associado no HIT Lab NZ da Universidade de Canterbury (Nova-Zelândia). Ele fornece duas demonstrações: por um lado, desde 1978 e o primeiro kit oferecendo armas (um castelo fortificado), «Houve um aumento significativo na proporção de caixas contendo armas. […] Hoje, cerca de 30 % das caixas contêm pelo menos uma arma» Segundo, alvo dos pesquisadores: a análise, por 161 participantes com idades variando de 15 a 54 anos, sobre a violência expressa em 1 500 imagens oriundas de catálogos da marca dinamarquesa desde 1973. Quase 40 % dos cenários propostos, expressariam uma ou outra forma de violência física, aumentando 19 % ao ano, em média. Pressões, ameaças, violações dos direitos humanos e zombarias estariam em alta de 8 a 16 % por ano. Os autores apontam, no entanto, e vamos nos alegrar com isso, não ter encontrado nenhum vestígio de violência sexual nas histórias oferecidas às crianças …
A Lego afirma que as armas estão aí apenas para «enriquecer o jogo» e permitir que as crianças «lutem contra um mal imaginário». Mas de acordo com os pesquisadores neozelandeses, o fabricante queria, sobretudo «manter a atenção de seus consumidores» ao oferecer-lhes produtos cada vez mais excitantes. Outros, começando pelo grande rival Playmobil, teriam as mesmas falhas, notam os autores, lamentando que a exposição das crianças à violência seja praticamente explorada nas telas.
A violência é diferente, seja ela no «jogo» ou em uma tela
No entanto, não vamos nos preocupar : as horas gastas para construir naves Star Wars ou personagens NinjaGo, provavelmente não transformarão seus filhos em um psicopata potencial. «É preciso não confundir violência e representação da violência. Dizer que os Lego’s são violentos é como dizer que os livros de história são violentos!», adverte Gilles Brougère, professor em ciências da educação na Universidade Paris-XIII. Para um trabalho coletivo, ainda não publicado, Gilles Brougère também estudou os universos propostos pela Lego. «Há de fato um forte aumento da representação da violência.»
Mas a interpretação feita por Gilles Brougère é bem diferente: «Na origem, a Lego era apenas um jogo de construção. Em seguida, a marca desenvolveu a narrativa em torno do brinquedo, fazendo surgir personagens temáticos. Mas é possível desenvolver uma história sem oposição ou conflito? Em vez de “violência”, eu falaria mais de oposição, como um estimulante narrativo.» Trama clássica do jogo, incluindo as crianças, ele recorda, se apoderaram, sem esperar o Lego nem os jogos de vídeo. «Há muito tempo que elas brincam de cowboy e de índios!», brinca o pesquisador.
«A violência faz parte da construção psíquica das crianças, e o jogo permite que elas a exteriorize», explica o psiquiatra infantil Patrick Landman. Mas «representada» no ritmo da criança, ela é bem diferente daquela engolida pela tela, não deixando tempo para a fantasia crescer . «No entanto, é preciso conversar a respeito com a criança, mostrar-lhe que outras coisas são possíveis.» Como os pesquisadores neozelandezes, Gilles Brougère observa também que a violência «made in Lego» situa-se muitas vezes em um universo fantástico ou futurista. «Antigamente, os adultos viam no jogo, uma preparação da criança para seu futuro papel, hoje em dia, é um universo de fuga.» Talvez, sugerem alguns, os adultos são menos relutantes ao ver seus filhos brincarem de guerra … contanto que isso não se pareça com a realidade.
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