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Lourinho livre para voltar ao seu amor de 30 anos

Em Goiás, Justiça garante posse de papagaio para dona de casa que cria animal há 30 anos. E o Ibama fica proibido de aplicar multa

Lourinho livre para voltar ao seu amor de 30 anos (Foto: Andre Saddi/Diário da Manhã)

247 – Eis uma história de amor com final feliz. Reportagem do jornal Diário da Manhã conta a história da mulher que lutou para continuar com o seu papagaio. Ela venceu. Liminarmente, mas venceu.

Para conferir a liminar na integra, clique aqui.

Abaixo, a reportagem do Diário da Manhã.


Louro Livre

Hélmiton Prateado

Da editoria de Política & Justiça

O juiz federal Carlos Augusto Tôrres Nobre concedeu liminar para a dona de casa Romilda Justino Franco continuar com a posse do papagaio Lourinho, que estava sob risco de ser apreendido pelo Ibama. O magistrado da 6ª Vara Federal garantiu que a ave fique na posse de Romilda e proibiu o Ibama de aplicar multa de R$ 5 mil, como estava prevista na notificação entregue a ela.

Romilda havia recorrido à Justiça na última semana, representada pela advogada Carolina Alves Luiz Pereira, com pedido de liminar para continuar com a posse do animal que cria há 30 anos. “Fundamentamos ao juiz que a ave é com toda certeza mais bem cuidado na casa de dona Romilda do que seria nos abrigos do Ibama e que fora do habitat onde vive há três décadas Lourinho correria sério risco de morte”, explicou a advogada.

Segundo os fiscais do Ibama a Lei de Crimes Ambientais proíbe a crição em cativeiro de animais da fauna silvestre, como é o caso do papagaio. O próprio superintendente do Ibama em Goiás, Luciano Menezes, reiterou o parecer dos fiscais que pretendiam retirar Lourinho de sua família adotiva. Luciano ainda contemporizou a situação dizendo ser possível contornar a situação com uma autorização especial prevista em resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). A Resolução 384 de 2006 “disciplina a concessão de depósito doméstico provisório de animais silvestres apreendidos”, que pode dar a guarda a quem cria respeitadas algumas condições pré-estabelecidas.

Na ação cautelar a advogada Carolina Alves explicou a odisseia de Romilda para continuar com a guarda de Lourinho. “Depois que o Diário da Manhã noticiou em primeira mão a luta que estava travando para manter um bichinho indefeso e criado com tanto amor parece que os inimigos do verde se sentiram provocados”.

O papagadio Louro é considerado parte da família e tem livre trânsito pela casa de Romilda Justino. “Se formos separados seria um sofrimento muito grande para todos nós e para ele principalmente”, explica Romilda. Louro foi encontrado há aproximadamente 32 anos na cerca de uma chácara que a família possuía no município de Aragoiânia. Aparentemente a ave já era domesticada, o que era possível perceber por sua docilidade e pelas palavras que já falava e cantava.

O cuidado que Romilda dispensa ao Louro pode ser medido por seu espaço exclusivo feito apenas para passar o dia: gaiola de tela medindo 15 metros quadrados com água abundante, árvore, poleiro, espaço com areia, passeador e comida farta como cenoura, mamão e maracujá. “Duvido que os animais que estão em abrigos do Ibama sejam tão bem cuidados, pois além da comida e espaço generoso ele recebe carinho e atenção constantes”, resume a criadora. À noite Louro vai para dentro de casa para não passar frio e dorme no quarto com sua criadora.

Louro chama pelos cachorros da casa e até por outros da redondeza. Conhece a maioria dos vizinhos e quando os avista chama pelo nome. Sua participação na família se estende aos jogos que passam na televisão e o papagaio sabe até mesmo gritar quando é gol. Até parece que o bicho sabe torcer por algum time, comentam os vizinhos. Outros pássaros vêm fazer companhia a Louro e se regalear com as frutas que são colocadas na telha do viveiro para seu deleite. Assanhaços, sabiás e bentevis são fregueses habituais do banquete servido exclusivamente para eles.

Inteligência e mansidão

À ação cautelar foi juntado um laudo da veterinária Cynthia Sandoval Lavigne, justificando com argumentos científicos os motivos para manter Louro na companhia de Romilda e de sua família. “Papagaios são algumas das aves mais inteligentes que existe e que possuem o cérebro mais desenvolvido que a maioria delas”, explicou.

Segundo a veterinária o período de vida na natureza é de 15 a 25 anos e que essa expectativa aumenta para a faixa dos a 40 a 50 anos quando domesticado e algumas espécies gigantes africanas tipo o Papagaio cinza africano vive até os 60 a 80 anos de idade. “Quando criadas à mão, facilmente se tornam mansos e excelentes animais de estimação para toda a família. Apesar de escolher para si um único dono. Os papagaios relacionam-se com os humanos da mesma forma que se relacionam com outras aves em estado selvagem”.

O maior risco de um animal domesticado ser devolvido sem critérios à natureza é a sua falta de malícia em fugir de predadores , falta de capacidade de buscar alimentos e a necessidade de aproximação de outros seres humanos , fatos que podem levá-lo à morte.

“Por ser uma ave domesticada há tanto tempo (30 anos) não tem mais a menor condição física, psicológica, nem cognitiva para sobreviver sozinho sendo reintroduzido na natureza. Se é que é essa a verdadeira intenção do Ibama”, adverte a veterinária.

Cynthia frisou ainda que qualquer mudança nesse momento poderá ser fatal para Louro e que com certeza ele não encontrará sequer a terça parte do que lhe é dado hoje na família de Romilda.

Legitimidade e proporcionalidade

Em seu despacho o juiz Carlos Augusto Tôrres Nobre frisou que é “legítima e proporcional” a pretensão de Romilda Justino Franco em continuar com a posse de Lourinho. O juiz acatou o parecer da veterinária Cynthia Sandoval de que o animal se encontra há muito fora de seu habitat natural “vislumbrando-se a possível inadequação e ineficiência da medida de apreensão”.

Ao receber a notícia de que terá a posse de Lourinho com a chancela da Justiça a dona de casa chorou de alegria para depois comemorar com sua família e amigos a vitória sobre o que considera “um arbítrio contra inocentes”. O juiz, os técnicos do Ibama e todas as pessoas que acompanharam nossa luta podem ficar tranquilos que vou cuidar do Lourinho muito melhor do que ele estaria nos abrigos do Ibama”.