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O grito humano. Por que ele é assustador?

As características muito particulares do grito humano mobilizam diretamente a área cerebral relacionada ao medo. E elas seriam compartilhadas pelos alarmes e a música heavy metal.

O grito humano. Por que ele é assustador?

 

 

Por Tristan Vey – Le Figaro

 

O grito é um sinal de alarme. Embora seja provavelmente a forma mais primitiva de se expressar, os cientistas nunca se interessaram realmente pela sua acústica específica. No entanto, temos o direito de perguntar: por que um grito é tão perfeitamente perceptível, mesmo que seja um tanto abafado? Por que ele pode nos aterrorizar e, de forma tão eficaz, nos alertar de um perigo? Em outras palavras, por que ele é tão especial?

De acordo com um estudo publicado na revista Current Biology, o grito ocuparia de fato um lugar especial na paisagem sonora. Quando falamos emitimos naturalmente em média quatro picos de som por segundo, que correspondem cada um a uma sílaba. A «frequência de modulação» da palavra é, portanto, de 4 Hz. Este valor não tem nada a ver com a altura do som – seja, se ele é agudo ou grave - mas com alterações de intensidade.

Uma intensidade sonora denominada “aspereza”

Uma equipe de cientistas das Universidades de Genebra e de Nova Iorque, liderada por um jovem pós-doutorando frânces, Luc Arnal, acaba de demonstrar que esta frequência de modulação é muito mais rápida no grito: entre 30 e 150 Hz. «Quando gritamos, soltamos rapidamente uma grande quantidade de ar que, aparentemente, coloca nossas cordas vocais em um sistema de vibração especial que causa essa modulação muito rápida da intensidade sonora, denominada “rugosidade”», ele explica.

Esta modulação parece desempenhar um papel mais profundo que a própria potência do grito, que finalmente, serve somente para atrair a atenção da maioria. «Utilizamos os gritos de 19 de nossos funcionários para que fossem ouvidos por 20 cobaias, entre outros sons da mesma potência, mas desprovidos desta aspereza, diz o pesquisador. O grau de terror ou de constrangimento que inspiram está diretamente correlacionado com a aspereza.» Da mesma forma, um grito cuja aspereza foi artificialmente cancelada, será, em volume igual, menos assustador que um grito natural. Por outro lado, uma música tornada «áspera» por manipulação do sinal será percebida como mais assustadora.

Mais divertido ainda, os pesquisadores descobriram que os alarmes artificiais mais eficazes, dos carros e casas, por exemplo, também tinham essa aspereza. «No entanto, não existe tal indicação nos manuais de design do som, surpreende-se Luc Arnal. Esta prática parece somente baseada em uma abordagem empírica.»

Sons do heavy metal são como gritos

Por que os sons ásperos são bons sinais de alarme? Porque eles ativam diretamente uma área do cérebro, a área das amígdalas  cerebelosas , que geram especialmente o medo e o estresse. «Os cantores de heavy metal produzem precisamente sons ásperos, diverte-se o cientista. Trata-se provavelmente desta área que agrada os fãs desta música, um pouco do modo com que brincamos em sentir medo ao assitir filmes de terror. Quanto às pessoas que não gostam é que estes sons ásperos se assemelham a sinais de alerta desconfortáveis.»

Os pesquisadores supõem uma rede de ativação direta, indo do ouvido para as amígdalas cerebelosas, sem passar pelo córtex auditivo, que processa o sinal sonoro habitual. Isso explicaria especialmente os tempos de reação mais rápidos observados no estudo para identificar a origem de um grito em vez de outros sons. Resta entender a origem neurofisiológica, ou seja, como um som mais áspero estimula nosso ouvido de forma diferente para que o sinal do cérebro vá diretamente para as amígdalas cerebelosas.

«Atualmente, trabalho também em um banco de dados de gritos de recém-nascidos para ver se há alguma especificidade relacionadas com a altura do som, mais agudo, que favoreceria um pouco mais a atenção dos adultos, explica Luc Arnal. Mas trabalhar sobre gritos de crianças é algo um pouco desanimador, é difícil …», ele reconhece.

A ultima linha de pesquisa seria encontrar um modelo físico que permita explicar como as cordas vocais produzem estes sons com uma grande modulação.

Todos esses trabalhos poderiam ter impactos para os designers de som. «Só se fala dos riscos ligados à intensidade sonora nas recomendações sanitárias, relembra Luc Arnal. Penso que a rugosidade também pode ser um fator de estresse que deva ser estudado com mais afinco se quisermos ambientes sonoros mais suaves.»