Português traz modelo de escola que investe na autonomia do estudante
Uma escola sem salas de aula tradicionais, com disciplinas diversas e onde os estudantes escolhem em quais conteúdos precisam se aprofundar; assim é a Escola da Ponte, na cidade do Porto, em Portugal; embora a descrição possa parecer uma novidade, o local já funciona com esse modelo desde os anos 1970, e desde então vem inspirado escolas em diversos locais do mundo, incluindo o Brasil; fundador e educador José Pacheco esteve em Porto Alegre para se reunir com educadores e falar sobre as possibilidades de construir espaços de ensino diferentes dos tradicionais
Débora Fogliatto, Sul 21 - Uma escola sem salas de aula tradicionais, com disciplinas diversas e onde os estudantes escolhem em quais conteúdos precisam se aprofundar. Assim é a Escola da Ponte, na cidade do Porto, em Portugal. Embora a descrição possa parecer uma novidade, o local já funciona com esse modelo desde os anos 1970, e desde então vem inspirado escolas em diversos locais do mundo, incluindo o Brasil. Nesta semana, o fundador e educador José Pacheco esteve em Porto Alegre para se reunir com educadores e falar sobre as possibilidades de construir espaços de ensino diferentes dos tradicionais.
A Escola da Ponte é municipal na cidade do Porto e tem como referência uma política de direitos humanos, com o objetivo de garantir igualdade de oportunidades a todos os cidadãos e promover solidariedade ativa e participação responsável. A estrutura organizativa exige participação dos alunos e dos "orientadores educativos" — que seriam os professores nas escolas tradicionais –, que planejam e organizam a escola, as atividades e as avaliações. Os orientadores educativos acompanham os estudantes de modo individual e diferenciado, tendo em conta as necessidades e especificidade de cada um.
Em 2012, no município de Cotia, região metropolitana de São Paulo, nasceu um projeto semelhante. Com a ajuda de Pacheco, a escola Âncora, que existia desde 1995 e já tinha um trabalho fora do comum, com aulas de circo, música e outras atividades culturais, adotou um modelo de educação diferenciada baseado na Ponte. "O Projeto Âncora é uma escola, que é quase uma comunidade de aprendizagem. Foi uma teimosia minha, porque me diziam que não era possível fazer algo como a Escola da Ponte aqui no Brasil", conta Pacheco.
A instituição atende crianças e jovens de baixa renda, que muitas vezes foram expulsos ou tiveram dificuldades de aprendizado em escolas tradicionais. Segundo o professor português, não há casos de indisciplina e os jovens conseguem cumprir os programas previstos nas grades curriculares antes do tempo determinado. "Isso é a prova de que é possível. E aqui em Porto Alegre também pode acontecer, até porque os gaúchos são pioneiros em desenvolvimento da escola e da educação.
O Projeto Âncora, diferentemente da Ponte, que é uma escola municipal, é uma Associação Civil de Assistência Social, de natureza beneficente, filantrópica e cultural, que objetiva “desenvolver cidadãos conscientes de suas capacidades para construir coletivamente uma sociedade justa, equilibrada e sustentável”. Na escola, a equipe é constituída por cozinheiras, jardineiros, motorista, professores, pessoal de limpeza, manutenção e administrativo, voluntários em diversas áreas, diretores e conselheiros, e todos são considerados educadores e igualmente responsáveis pelos educandos.
Para ele, a necessidade de mudar os moldes da educação não apenas é possível, como também é necessário. “Espero que, em breve, de uma vez por todas se acabe com o modelo epistemológico do século 19 que está aí. Porque temos crianças estudantes do século 21, com professores com mentalidade do século 20, trabalhando como no século 19”, afirma. Os educadores que trabalham na Ponte têm formações como as de todos os outros, mas são pessoas que buscam um modelo de educação diferente e, por isso, se interessam por se adaptar ao formato da instituição.
Então, por que a maior parte das escolas ainda insiste em antigos modelos? É o que o próprio Pacheco se questiona. Ainda nos anos 1970, ele participou de uma pesquisa sobre os obstáculos à mudança, onde foram apontados diversos fatores. Pensando nisso e trazendo para os dias atuais, ele pondera que um dos principais motivos é a cultura da formação pessoal e profissional dos professores. “É preciso uma reelaboração dessa cultura. Essa cultura é herdeira de culturas ancestrais de ‘ensinagem’, não de aprendizagem, que é reforçada pelo fato de a formação ser, no mínimo, pobre”, aponta.
Outro fator é a própria sociedade civil, que tem ideias conservadoras de que a escola deve ser como sempre foi, com turmas, com aulas seguindo um certo modelo. “E escolas não são nada disso. Escolas são pessoas, não edifícios”, afirma o educador português. Por último, há ainda o poder público, que muitas vezes não considera alternativas e não quer propor mudanças. “Essa escola que aqui está não tem qualquer fundamento, nem científico nem legal, e é preciso que os professores façam a reelaboração de sua cultura. E isso é possível”, destacou Pacheco, que em seguida se reuniu com integrantes da Secretaria Estadual de Educação.
