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Ideias

Jornalista norte-americano explica a psicologia dos supremacistas brancos

Em livro sobre o assassinato do ativista negro Vernon Dhamer, executado pela KKK, Curtis Wilkie explica a psicologia dos supremacistas brancos que são relevantes para a era atual

(Foto: Reprodução)
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Chris Hedges entrevista Curtis Wilkie. 

Transcrição publicada originalmente no The Real News Network, traduzida e adaptada por Rubens Turkienicz com exclusividade para Brasil 247.

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Em 9 de janeiro de 1966, os Cavaleiros Brancos do Ku Klux Klan to estado de Mississippi (EUA) assassinaram o ativista negro pelos direitos civis Vernnon Dahmer em Hattiesburg, Mississippi (EUA), depois de bombardear e disparar tiros contra a sua casa. Este foi um dos milhares de crimes de ódio executados no Sul dos EUA por brancos que travavam um reino de terror contra os negros, para amedrontá-los para que deixassem de clamar pela desegregação e pelo direito de votar. O terrorismo dos vigilantes brancos contra minorias religiosas e étnicas está arraigado no DNA da sociedade estadunidense, remontando às patrulhas para perseguir escravos – e isto só fez escalar nos últimos anos. O FBI registrou 8.263 crimes de ódio em 2020, um pulo de 13% sobre 2019. O que motiva esta gente? Como é que eles olham para o mundo? Como é que eles justificam, para si próprios e para outros, estes atos de terror?

Estas questões são exploradas no novo livro 'When Evil lived in Laurel: The White Knights and the Murder of Vernon Dahmer', escrito por Curtis Wilkie, antigo repórter do jornal Boston Globe. Baseando-se em entrevistas feitas por Wilkie com participantes e registros meticulosos guardados por Tom Landrum – que trabalhou durante anos como informante do FBI dentro do Klan – Wilkie prove uma visão rara sobre o funcionamento interno do ódio branco e o conluio da sua extensa rede de autoridades de implementação das leis, políticos, autoridades do estado e da cidade, jornalistas, pregadores religiosos e homens de negócio naquilo que se tornou uma década de terrorismo implacável no Sul dos EUA.

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Transcrição do vídeo:

Chris Hedges: Bem-vindos ao The Chris Hedges Report. Em 9 de janeiro de 1966, os Cavaleiros Brancos do Ku Klux Klan do estado de Mississippi (EUA) assassinaram o ativista negro pelos direitos civis Vernnon Dahmer em Hattiesburg, Mississippi (EUA), depois de bombardear e disparar tiros contra a sua casa. Este foi um dos milhares de crimes de ódio executados no Sul dos EUA por brancos que travavam um reino de terror contra os negros, para amedrontá-los para que deixassem de clamar pela desegregação e pelo direito de votar. Estes ataques incluiam ameaças, espancamentos e ataques incendiários contra igrejas, negócios e casas de negros.

Os poucos homens acusados desses crimes, incluindo assassinatos, frequentemente eram absolvidos por juízes brancos. Até hoje, mais de 159 assassinatos – 56 no Mississippi – permanecem não resolvidos. O terrorismo de vigilantes brancos contra minorias religiosas e étnicas está arraigado no DNA da sociedade estadunidense, remontando às patrulhas para caçar escravos negros. A sua face foi exibida em 2015, quando Dylann Roof matou a tiros nove membros de um grupo de estudo da Bíblia numa igreja negra em Charleston, no estado da Carolina do Sul (EUA). Esta face foi exibida novamente 3 anos depois, quando 11 pessoas que rezavam foram assassinadas numa sinagoga em Pittsburgh. A mesma face foi exibida quando neonazistas marcharam nas ruas de Charlottesville, estado da Virgínia. Também foi exibida quando Ahmaud Arbery foi assassinado em 23 de fevereiro de 2020, no estado da Geórgia. E foi exibida quando os neo-confederados atacaram o Capitólio em 6 de janeiro de 2021. O FBI registrou 8.263 crimes de ódio em 2020, um aumento de 13% sobre 2019.

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O que motiva esta gente? Como é que eles olham para o mundo? Como é que eles justificam, para si próprios e para outros, estes atos de terror? Estas questões são exploradas no novo livro 'When Evil lived in Laurel: The White Knights and the Murder of Vernon Dahmer', escrito pelo antigo repórter do jornal Boston Globe Curtis Wilkie. Baseando-se em entrevistas feitas por Wilkie com participantes e registros meticulosos guardados por Tom Landrum – que trabalhou durante anos como informante do FBI dentro do Klan – Wilkie prove uma visão rara sobre o funcionamento interno do ódio branco e o conluio da sua extensa rede de autoridades de implementação das leis, políticos, autoridades do estado e da cidade, jornalistas, pregadores religiosos e homens de negócio naquilo que se tornou uma década de terrorismo implacável no Sul dos EUA.Juntando-se a mim para discutir sobre o seu livro 'When Evil lived in Laurel: The White Knights and the Murder of Vernon Dahmer', aqui está Curtis Wilkie.

Você escreve que “muitos dos Klansmen [membros do KKK] sentiam-se feridos pela sociedade. Com pouca educação formal, ignorantes das habilidades modernas e consignados a trabalhos pouco compensadores, eles se agitavam pelas suas próprias situações.” Você diz que eles eram “... na sua maioria constituídos por homens ressentidos que trabalhavam em pequenas fazendas, campos de petróleo ou acampamentos madeireiros, ou tinham empregos na indústria de Masonite, uma monstruosa fábrica que pairava sobre a paisagem como uma força brutal, transformando sobras de madeira em placas de fibra.” Você escreve que este ressentimento “... se endureceu em ódio ao homem negro”. Você poderia falar sobre este ressentimento, especialmente considerando que tantos da classe trabalhadora branca também estão em declínio econômico atualmente?

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Curtis Wilkie: Certamente. Se transformou em uma metástase de ódio e violência. Isso certamente ocorreu no início, como você diz. Isto é o tipo de coisa que ainda estamos vendo. Eu suspeito que muitas das pessoas envolvidas no ataque ao Congresso em 6 de janeiro do ano passado vinham deste mesmo tipo de dificuldades econômicas.

Chris Hedges: E o que há nesta privação econômica que entra em metástase para gerar esta violência racial?

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Curtis Wilkie: Bem, este é um fenômeno terrível que certamente estava conosco no Mississippi nos anos de 1960 e que se manifesta novamente, agora fora do Sul (dos EUA). Isto certamente envolve líderes políticos demagógicos que agitam isto sob a noção de que são populistas. Considerar alguém como Donald Trump como um populista é uma grande tolice. Os populistas sobre os quais eu penso são os que correspondem à definição clássica de populistas – basicamente alguém que tem origem na própria situação sobre a qual estamos falando: pobre, algumas vezes com pouca educação formal, ressentido e atacando autoridades, lideranças e a lei. Donald Trump vem da antítese deste tipo de condição, mas eu penso que ele certamente é responsável por muito do surto deste tipo de coisa nos últimos 5-6 anos. Ele me lembra tanto de George Wallace [governador racista do estado de Alabama], há 50-60 anos.

Chris Hedges: Sim. Durante a campanha de Trump, eu fui lá atrás e escutei os discursos de George Wallace; a retórica era muito similar, quase idêntica, incluindo o chamado de Wallace pela violência contra os opositores.

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Curtis Wilkie: Sim, e a imprensa. Wallace amava usar a imprensa como realces e destacava indivíduos nos seus discursos; os comícios de Wallace tinham esta áurea de violência incipiente neles, o que – eu nunca fui a um comício do Trump, eu já havia me aposentado alegremente do jornalismo por alguns anos, então. Porém, me parece um tipo de coisa que nós vimos com o Wallace, quando eu estava reportando e cobrindo Wallace.

Chris Hedges: Curtis, a diferença é que Wallace sempre foi uma figura marginal, enquanto que Trump se moveu para o epicentro da política estadunidense.

Curtis Wilkie: Sim, para a nossa aflição.

Chris Hedges: Robert Paxton, no seu livro 'The Anatomy of Fascism', escreve que o Klan foi o primeiro exemplo de fascismo nos EUA, e este fascismo é embrulhado em supremacia racializada, na bandeira, na cruz. E, no seu livro, você escreve sobre como o Klan abria com uma prece. Eles montavam um altar nas reuniões. Eles davam multas aos seus membros por praguejar, o que me parece um tanto irônico, já que todos eles estavam indo queimar a casa de alguém. Eles tinham capelães. Os seus líderes citavam versos bíblicos para justificar a segregação e os atos de violência. O líder do grupo do Klan sobre o qual você escreve, um cara chamado Sam Bowers, foi um expoente daquilo que eles chamavam de militância cristã; ele estava em guerra aberta com o governo federal – o qual ele dizia que era controlado por ateus e bolcheviques. Os membros do Klan se referiam a si mesmos como redentores que restaurariam os valores cristãos, caso fosse necessário, pela violência contra a nação. Eu lhe pergunto se você poderia falar sobre este componente religioso, especialmente dado o tecido conectivo existente entre aqueles que atacaram o Capitólio em 6 de janeiro de 2021 e este tipo de fascismo cristão? Eles são a mesma coisa?

Curtis Wilkie: Bem, esta é uma cristandade perversa. Eu não penso que seja o tipo de coisa com a qual Jesus Cristo se sentiria muito confortável. Não só estas pessoas usam a Bíblia; a Bíblia era uma coluna de suporte nas reuniões do Klan. E o Klansman que liderou o ataque assassino à casa de Dahmer era, na verdade, ele próprio, um ministro – um sujeito chamado Chris Sessions. E ele se auto-ordenou, porém era um ministro. Havia ministros envolvidos naqueles assassinatos horríveis em Neshoba County, Mississippi, em 1964. Um dos líderes da grupo, e o cara que orquestrou aquilo, e o Bowers – que você mencionou, que era o Mago Imperial deste grupo e dos Cavaleiros Brancos, ele deu uma longa entrevista que está nos arquivos do estado, a qual eu consegui localizar, e na qual ele simplesmente fala sem parar sobre a militância cristã. E um dos princípios deles é que o homicídio é aceitável se você o comete com amor. Seja como for, é loucura.

Chris Hedges: Os membros do Klan sobre os quais você escreve eram frequentemente estas figuras bufonas. Eles esposam estas selvagens teorias da conspiração, muito similares aos grupos como o Qanon. Eles se autodenominavam com este estranho sortimento de grandes títulos oficiais – como Mago Imperial e Grande Ciclope. Eles tinham este senso de importância e empoderamento dentro do grupo que a sociedade como um todo lhes negava. Eu gostaria que você falasse sobre este aspecto do Klan e qual era o seu atrativo para estas pessoas.

Chris Wilkie: Você tem razão sobre isso. Isto dava a eles o senso de autoridade que talvez eles nunca teriam. De repente, eles foram ungidos; Ciclopes Exaltados, Grande Dragão, Mago Imperial, coisas bobas. Este é o tipo de coisa que você pensaria que crianças fariam, mas eles amavam isto. Eles buscavam qualquer respeitabilidade que o Klan provia. E o Klan também provia a camaradagem entre estas pessoas. Para alguns deles, era como pertencer a um clube cívico – exceto que as suas reuniões eram secretas e envolviam pistolas e facas e a Bíblia e a bandeira de batalha dos Confederados como pilares de sustentação. Era tudo muito estranho. E enquanto eles falavam sobre os pobres, as pessoas com menos educação formal, a coisa estranha é que havia alguns homens de negócios ou autoridades públicas que eram alegadamente “respeitáveis” - alguns formados em faculdades, que também entravam no Klan. E eu penso que isto era motivado principalmente pelo ódio racial.

Chris Hedges: Em todo o livro, você escreve sobre como, essencialmente, estas figuras políticas tinham que lidar com o Klan. Eles não podiam entrar em conflito com o Klan, por medo de perderem as suas posições eleitas.

Curtis Wilkie: Sim. Naqueles tempos havia muitos distritos no Mississippi onde o Klan controlava um bloco de votos muito grande, que podia virar o resultado das eleições. Então, certamente, estes políticos bajulavam o Klan. Houve bastante instâncias destas. No início, você mencionou estas pessoas que poderiam ser indiciadas ou levadas à julgamento por alguns dos crimes e que jamais foram condenados – seja por júris não conclusivos, ou diretamente inocentados. Muito frequentemente, a autoridade pública responsável por elaborar a lista dos jurados, eles próprios eram membros do Klan; então, eles garantiam que houvessem membros do Klan na lista do júri, os quais proveriam o necessário – basta uma pessoa indecisa para criar um júri não-conclusivo.

Chris Hedges: Isto era parte da meta. Eles sempre tentavam colocar uma pessoa do Klan no júri, um Klansman – eles eram homens – no júri e, assim, os membros do Klan jamais seriam condenados.

Curtis Wilkie: Isto ocorreu repetidamente no Mississippi nos anos de 1960, incluindo os julgamentos não só de Sam Bowers. Ele foi levado à julgamento quatro ou cinco vezes antes de ser finalmente condenado a 32 anos de prisão pelo assassinato. Porém, um outro tipo medonho chamado de De La Beckwith, que assassinou Medgar Evers no Mississippi em 1963. Havia muitas instâncias nas quais havia juris não-conclusivos. E estes foram dois dos julgamentos mais significativos de direitos humanos no Mississippi nos anos de 1960. Durante os anos de 1960, todos estes julgamentos acabaram com júris não-conclusivos. Penso que se passaram mais de 30 anos após o assassinato de Medgar Evers até que Beckwith fosse condenado. Penso que foi em 1994.

Chris Hedges: No seu livro há exemplos repetidos de conluios entre aplicadores das leis, autoridades eleitas e o Klan. Os três trabalhadores por direitos humanos – James Chaney, que era negro; Michael Schwerner e Andrew Goodman, ambos judeus, e este é um elemento no livro – que foram assassinados em junho de 1964 na Philadelphia e no Mississippi, foram entregues ao Klan pelas autoridades de cumprimento das leis depois de serem detidos por infrações fajutas de tráfego. Você pode falar sobre estes sistemas entrelaçados de supremacia branca, e como estes funcionam?

Curtis Wilkie: Isso existia no Mississippi naquela época, era mais aceitável no Mississippi nos anos de 1960. Felizmente, muito disso mudou. Ainda temos racismo no Mississippi. Ainda temos tentativas de suprimir os registros de votantes e o exercício de voto dos negros no Mississippi. Mas o clima que tínhamos nos anos de 1960 – que é a época que o livro cobre – isso era uma prática generalizada no estado, e isso infiltrou-se no cumprimento das leis. Isso era operado pelos mais altos níveis. Muito frequentemente, o governador, o vice-governador, os legisladores, todos tinham simpatias pelo Ku Klux Klan. Quando estes três jovens homens desapareceram no condado de Neshoba, em 1964, os nossos senadores federais disseram que tratava-se de uma farsa, que aqueles moços tinham ido para Cuba e provavelmente estavam desfrutando de uma bebida com Fidel Castro, que isso tudo era uma conspiração comunista. Na verdade, eles foram executados e enterrados numa parte abandonada do condado de Nashoba.

Só foi depois que o FBI pagou para algumas pessoas que sabiam disso, que os corpos deles foram descobertos. E eu penso que aquele incidente específico, juntamente com o assassinato de Dahmer – no qual eles acataram a sua casa, onde tinha três crianças e a sua espôsa vivendo lá, e queimando tudo até o chão, e conseguindo matá-lo. Ele permaneceu na casa que estava pegando fogo e houve uma troca de tiros com os atacantes, enquanto a família escapava pelas janelas de trás da casa. O tipo de pessoas que fariam uma coisa dessas… eles eram depravados. Naquela época, estes crimes eram desconsiderados pelas autoridades.

Isto era o tipo de coisa que funcionou durante a batalha para nos “redimirmos”. Esta é uma outra grande palavra que você mencionou. Tudo isto é disfarçado como “ser redentores”, para recuperar o controle do Sul após a Reconstrução. Então, há muito ressentimento envolvido nisso. Aquele ressentimento, em parte, cresce a partir da Reconstrução. Então, há uma longa história aqui. E eu não estaria vivendo no Mississippi hoje se fosse tão ruim, ou prevalente, como era era então. Tristemente, afora as comunidades negras no Sul e um punhado de brancos, isso geralmente era aceito como um fato da vida.

Chris Hedges: Então, há dois heróis no seu livro: Tom Landrum, quem, a um tremendo risco pessoal para si mesmo e a sua família, trabalhou sem remuneração como um informante para o FBI; e o corajoso líder de direitos humanos Vernan Dahmer. Eu pergunto se você poderia falar sobre estes dois homens?

Curtis Wilkie: Certamente. Vernon Dahmer era simplesmente de primeira classe. Ele escreveu – ele era um homem negro que ousou ser um líder no movimento de registrar eleitores na sua região no sul do estado de Mississippi. Ele foi o presidente da célula da NAACP (National Association for the Advancement of Colored People) em Hattiesburg – o que é, pelos padrões de Mississippi, uma cidade bastante grande. E ele assumiu grandes riscos. Ele foi ameaçado durante muitos anos antes que o eliminassem no ataque fatal de janeiro de 1966. Ele sabia que corria riscos por aquilo que estava fazendo. Eu entrevistei a sua viúva antes do julgamento final de Bowers, e ela contou sobre como eles se alternavam para dormir à noite, sempre com armas ao lado da cama deles. Ela podia dormir pelas primeiras 4-5 horas da noite e, depois, ela ficava de prontidão e ele dormia. Esse era o medo que eles tinham; porém, mesmo assim, eles não se deixaram intimidar. Ele era um homem terrivelmente corajoso e era um homem bom, um verdadeiro herói do movimento.

Tom Landrum era um homem branco da mesma região; ele era um conselheiro do tribunal juvenil. Felizmente, havia pessoas brancas que se incomodavam com o que estava ocorrendo, porém, muito frequentemente, eles não sabiam o que fazer para tentar fazer o bem e para combater o Klan. Então, Landrum trabalhou com o FBI como conselheiro do tribunal juvenil. Eles monitoravam os potenciais maus meninos, este tipo de coisa. E o agente local do FBI se deu conta que Tom Landrum estava incomodado com isso. Então eles se aproximaram dele e perguntaram se ele estaria disposto a entrar no Klan e reportar regularmente para eles. Então, Tom Landrum foi para casa – Tom Landrum também tinha uma família numerosa. Ele tinha a esposa e cinco crianças em cada. Ele conversou com a sua esposa e com a sua sogra. Eles fizeram um retiro e rezaram para saber se ele devia aceitar este desafio do FIB. E eles decidiram que esta era uma coisa que ele tinha o dever de fazer, em parte, como um bom cristão. E Tom Landrum o fez, sem remuneração.

Havia muitos informantes pagos pelo FBI naquela época. Tom Landrum recebia pagamento para o combustível gasto, por quilômetro rodado; penso que ele sequer foi reembolsado pelo uniforme do Klan que ele teve que comprar. E ele o fez com grande risco pessoal. Houve um incidente perto de Natchez durante o período em que Landrum estava no Klan, quando se suspeitava que um Klansman era um informante – e este foi assassinado pelos Cavaleiros Brancos. Então, Landrum, assim como Vernon Dahmer, ambos foram pessoas que arriscaram as suas vidas – tendo crianças pequenas nas suas famílias – para tentar fazer o bem. Penso que você tem razão de considerar ambos como heróis. 

Chris Hedges: Eu cheguei na metade do seu livro – que eu penso ser uma boa história sobre o FBI – e isso foi, obviamente, durante a operação COINTELPRO e tudo mais. E daí você chega naquele momento no qual o FBI traz aquele soldado da família de criminosos Colombo, Gregory Scarpa – ele era de New York – para intimidar e espancar membros sequestrados do Klan, para forçá-los a falar. Então, eu gostaria que você falasse sobre esta tática, que é familiar a nós que acompanhamos o FBI, especialmente se você verifica a história da esquerda, ou do movimento Black Power.

Curtis Wilkie: Obviamente, uma coisa que eu não quero fazer é engrandecer totalmente o FBI. Eles ajudaram no Mississippi nos anos de 1960 – e não graças ao seu diretor, J. Edgar Hoover, que basicamente não gostava da ideia do Movimento pelos Direitos Civis e desprezava Martin Luther King Jr., e fez tudo que podia para minar os esforços do Dr. King. E eles se envolveram em diversas atividade ilegais extras no Mississippi e em outros lugares, como ambos sabemos, e como eu tenho certeza que você e eu o fizemos quando os documentos do COINTELPRO foram todos revelados, creio que na década de 1970. Algumas daquelas coisas nas quais o FBI se envolveu foram muito surpreendentes e amedrontadores. No meu livro, há basicamente duas instâncias. 

Uma delas é que eles importaram aquele assassino da Máfia de New York, que já estava trabalhando com o FBI. Ele estava tentando fazer uma batida em New York. Então, eles o convencem a fazer coisas sujas para eles. E havia um dos homens do FBI que foi enviado para o Mississippi que conhecia Scarpa; e mandou um pedido para o FBI de New York: “Vocês podem nos mandar...” Esta parte foi retirada do documento do FBI que eu tenho; porém, trata-se claramente de Gregory Scarpa – ele corresponde ao perfil. E eles o enviaram ao Mississippi, junto com a sua namorada. O FBI pagou a sua passagem aérea e o seu quarto, e ele aparece num negócio de um cara que é um alto membro do Klan; eles basicamente o sequestram, o arrastam para fora do país, e o espancam violentamente e o mandam para um hospital. Eles o intimidaram tanto que ele começou a revelar muitas informações ao FBI.  

A segunda instância no meu livro é sobre um período no qual os Cavaleiros Brancos deixaram os Negros e começaram a atacar os Judeus no Mississippi; começaram a bombardear sinagogas e as casas de proeminentes homens de negócios judeus, bem como dos rabinos. Então, quando os líderes Judeus se encontraram com o FBI, eles perguntaram: “O que nós podemos fazer?” O FBI lhe disse: “Nos dêem dinheiro para este fundo de subornos e nós o usaremos essencialmente para atividades ilegais”. E este fundo de subornos especial, sobre o qual eu escrevi, foi usado em Meridian, Mississippi, para montar uma emboscada para dois Klansmen. Resulta que um daqueles Klansmen era uma jovem mulher que estava pronta para entregar uma bomba na casa de um homem de negócios judeu. E eles tentaram prendê-los? Não, eles os atacaram com uma equipe do SWAT e, penso eu, até alguns membros das forças militares, da polícia local e do FBI e bombardearam aquele carro e mataram a jovem mulher. Esta foi uma coisa má na qual eles se envolveram, porém isto é muito extraordinário. Sem aviso prévio, sem nada. Eles saíram do carro e dezenas de pessoas descarregaram as suas armas neles.

Chris Hedges: Eu quero encerrar esta entrevista, Curtis. Uma das coisas que eu penso ser fascinante no seu livro é o relato feito de dentro do Klan, que nos dá uma visão sobre como estas pessoas pensam e por que eles pensam o que pensam. Eu eu quero que você traga isto para o momento presente, porque nós vemos uma ressurgência deste nacionalismo raivoso e da supremacia branca nestas figuras de culto ao redor de Trump e, obviamente, no ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. E eu quero que você delineie os paralelos entre o que você escreveu e onde estamos atualmente.

Curtis Wilkie: Você pode ver os paralelos, não mais necessariamente com o Ku Klux Klan, mas nestes novos grupos que surgem – sejam os Proud Boys e todos estes nomes estranhos que eles dão aos grupos. Isto geralmente não é o trabalho de um indivíduo – como um assassino de mente fixa -, mas sim de pessoas que se reúnem e se juntam, e compartilham as suas reclamações e ressentimentos, e atacam juntos. Nós certamente o vimos em 6 de janeiro de 2021, porém você já o viu em diversos outros lugares, não só no sul atual, mas em todo o país. É o mesmo tipo de coisa. Eles não funcionam mais como o Ku Klux Klan, mas poderiam bem ser.

Chris Hedges: E você argumentaria que eles são impelidos pelo mesmo desespero econômico?

Curtis Wilkie: Certamente. Isto é uma parte, mas não é a única motivação deles. Certamente, isto é uma parte importante. Algumas destas coisas são simplesmente por ódio. Algumas destas pessoas não têm dinheiro, não gostam de negros e não gostam de liberais, ou “liberais são comunistas”; e eles têm medo que, se não for o comunismo, alguma coisa vai se apoderar dos EUA. É uma coisa louca. E isto é ajudado pelos shows de rádio de direita e, tristemente, por algumas redes de televisão que jogam com esta coisa toda.

Chris Hedges: Ótimo. Este foi Curtis Wilkie, falando sobre o seu livro 'When Evil lived in Laurel: The White Knights and the Murder of Vernon Dahmer'. Quero agradecer ao Real News Network e a sua equipe de produção: Cameron Granadino, Adam Coly, Dwayne Gladden e Kayla Rivera. Vocês podem me achar no blog chrishedges.substack.com.

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