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Mídia

A TV-Bandeirantes e o grande comício das “Diretas, Já!” em 84

No dia em que o ex-presidente Lula é impedido de participar do debate entre presidenciáveis, o jornalista e escritor José Augusto Ribeiro relata em artigo o episódio em que a TV Bandeirantes durante o comício das Diretas Já

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Por José Augusto Ribeiro

As TVs estavam informalmente proibidas de transmitir em rede, para fora de São Paulo, o grande comício das "Diretas, Já!" na Praça da Sé, na tarde de 25 de janeiro de 1984. Para a cidade de São Paulo podiam transmitir, porque era feriado local, o dia do aniversário da cidade, o metrô funcionava com as catracas abertas e quem não pudesse assistir pela TV poderia aumentar ainda mais o público do comício, já avaliado em cerca de 300 mil pessoas.

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Na redação da TV-Bandeirantes, naquela tarde, víamos a toda hora, pelo corredor envidraçado. Seu João Saad, presidente e dono da empresa, encaminhar-se para a sala de Sílvia Jafet, a diretora de jornalismo, preocupado e inquieto. Sua irritação era visível e logo soubemos que da boca para a fora voltava-se para outros alvos. Seu João implicava até com alguma coisa na exibição do episódio do dia no seriado Jennie, a Feiticeira.

Ele na verdade estava fora de si com a proibição de transmitirmos ao vivo, em boletins ou no Jornal da Bandeirantes, para todo o Brasil, o que estivesse acontecendo no comício e sobretudo aquele imenso mar de gente, aplaudindo e gritando "Diretas, Já!". Não sei quantas foram as idades e vindas de Seu João, mas em várias delas eu estava na sala de Sílvia, acompanhando a transmissão local e discutindo a montagem do jornal.

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Por volta das 7 da noite, afinal, menos de meia hora antes do Jornal Bandeirantes, Seu João nos reuniu, a Sílvia, Joelmir Betting, o apresentador Ferreira Martins e a mim, para anunciar sua decisão:

- Vamos transmitir ao vivo. Mas tomem cuidado com o que vão dizer.

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Essa recomendação valia para mim, comentarista político do jornal, e também para Sílvia, que teria de decidir sobre cada palavra e cada vírgula dos textos que seriam lidos pelo Ferreira, e para Joelmir, teoricamente o comentarista econômico, mas de cujo talento de repentista sempre se devia esperar alguma coisa de repercussão política.

Seu João já devia saber o que o esperava, nós desconfiávamos. Fomos para o estúdio e no fim do jornal entramos ao vivo da Praça da Sé, exatamente no momento em que, no palanque e naquele mundo de gente, todos se davam as mãos, de braços erguidos, e cantavam o Hino Nacional. Só a Bandeirantes transmitiu esse momento, ao vivo, para todo o país. Eu teria de fazer o comentário final e o que consegui dizer, aturdido por aquela cena, foi de uma banalidade, de uma insignificância que excediam em larga medida a cautela pedida por Seu João:

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- Depois disso, diante do que acabamos de ver, o Brasil nunca mais var ser o mesmo – diagnostiquei, já percebendo que não teria como consertar essa tolice.

Mas o Joelmir, a quem cabia encerrar o jornal, salvou-o. Ele não poderia pedir "Diretas, Já!", mas entrou no clima e desejou:

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- Boa noite, JÁ!

Voltamos juntos à redação e fomos recebidos com aplausos. Os telefones não paravam de tocar, colegas da TV-Globo, que não tinham podido transmitir o comício, pediam que repetíssemos no jornal do fim de noite as cenas que acabávamos de transmitir, porque já insistiam com seus chefes, argumentando que a Bandeirantes rompera a censura e as outras não seriam punidas se também mostrassem cenas gravadas do comício.

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Dias depois Seu João foi chamado a Brasília para uma audiência com Figueiredo, audiência que não pedira. Figueiredo mal o mandou sentar e mostrou um papel pronto para receber sua assinatura:

- Sabe o que é isto, João? É o decreto de concessão do canal da Bandeirantes em Brasilia.

Para uma rede de amplitude nacional, como a Bandeirantes, era impensável não dispor de uma emissora em Brasília. E a Bandeirantes não dispunha e esperava, já por muito tempo, a concessão do canal respectivo.

Figueiredo, enraivecido, prosseguiu:

- Olhe o que eu vou fazer com o seu decreto!

E rasgou e lançou no lixo os retalhos do papel rasgado.

Mas a campanha prosseguiu e logo o governo teve de suspender suas proibições. O contraste entre a presença de tanta gente na Praça da Sé e o silêncio da maioria das TVs só prejudicava o governo. Em pouco tempo, a TV-Globo passou a ser a que maior cobertura dava aos comícios.

Em abril a Emenda Dante de Oliveira, que restabeleceria as eleições diretas, foi arquivada na Câmara dos Deputados, onde a falta de apenas 22 votos impediu que ela alcançasse os dois terços de votos necessários para sua aprovação. Em Janeiro de 85, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf no colégio eleitoral com 300 votos de vantagem (480 a 180) e Figueiredo fez chegar a Seu João sua vontade de assinar o decreto que rasgara um ano antes.

Numa de suas idas a Brasília, Seu João me convidou para almoçar. Eu tratava nesse momento de minha volta à Bandeirantes, aliás sugerida por ele quando conversamos sobre o convite que eu recebera para ser o assessor de imprensa de Tancredo na campanha presidencial.

- Eu já sabia do convite – informou ele ao me receber em sua sala. – O Tancredo me telefonou. Eu disse a ele que você poderia ajudar mais ficando aqui, ele acha que lá você ajuda mais. Então você vai e depois volta...

Nesse almoço Seu João me contou do oferecimento de Figueiredo e pediu:

- Diga ao Tancredo que eu prefiro ter a Bandeirantes de Brasilia concedida por ele, depois que ele assumir.

Dr. Tancredo foi mais prudente – ou profético - e mandou dizer.

- É melhor o João deixar que o Figueiredo assine. Ninguém sabe o dia de amanhã...

Mais de trinta anos depois, a situação é pior que a do crepúsculo da ditadura militar e a Bandeirantes não tem como repetir o que fez em 1984. Ainda bem que, neste crepúsculo da velha mídia monopolista e monologante, já temos a nova mídia alternativa e dialogante. Ela pode ser ainda minoritária, mas o fato é que as coisas estão acontecendo apesar do silêncio da grande mídia, da mesma foram como aconteceram nas lutas de trinta anos atrás.

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