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Confira, em português, a íntegra da entrevista de Lula ao Le Monde

Ex-presidente falou na conversa com o repórter do jornal francês Bruno Meyerfeld sobre Bolsonaro ser "o resultado de uma rejeição da polícitica", "não fazer nada", só "destruir" e ainda a respeito da Amazônia, quando defendeu que o Brasil cuide da região, discordando do presidente da França, Emmanuel Macron; leia a íntegra

(Foto: Editora 247)
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Entrevistado por Bruno Meyerfeld, do Le Monde

Traduzido por Sylvie Giraud

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Lula: "Bolsonaro é sobretudo, o resultado de uma rejeição da política"

O ex-presidente brasileiro cumpre, desde abril de 2018, oito anos e dez meses de prisão por corrupção. "Tudo o que eu quero é que reconheçam minha inocência", explica ele em entrevista ao "Le Monde".

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É com o passo firme que Luiz Inácio Lula da Silva aparece em uma sala anônima da sede da polícia federal de Curitiba (Paraná), transformada em sala de imprensa. É aqui, neste prédio sem alma, que o ex-presidente, condenado por corrupção, cumpre, desde abril de 2018, sua sentença de oito anos e dez meses de prisão. Aos 73 anos, o líder da esquerda brasileira não perdeu em nada sua verve. Ele se apresenta, com a barba bem cortada, terno escuro e gravata de cor púrpura ao pescoço. O estilo é presidencial e a simbologia muito clara: Lula ainda está atuante, em plena ação. Ele concedeu ao Le Monde sua primeira entrevista à mídia francesa desde sua prisão.

Após um ano e meio na prisão, o senhor começa a se sentir desencorajado ou cansado?

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Não, me sinto bem, moral e fisicamente. Estou em paz porque sei da razão pela qual estou aqui. Sei que sou inocente e que aqueles que me prenderam são mentirosos. Sou uma pessoa otimista. Minha mãe me transmitiu isso. Então, sim, a prisão é uma prova de fogo. Mas tenho muita energia, estou muito sereno. Tenho certeza de que vou ganhar.

Como está organizado seu dia a dia?

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Assisto filmes, televisão, converso com meus advogados. Ando 9 quilômetros por dia! Espero o tempo passar ... Também leio muito, estudo a história das lutas sociais no Brasil. Fico horrorizado ao ver que todos aqueles que lutaram pelo povo neste país, como Zumbi [escravo insurgente no século XVII], Tiradentes [revolucionário do século XVIII] ou Antonio Conselheiro [pregador do século XIX], foram decapitados, enforcados ou queimados vivos, e constatar que o povo não sabe quem são, como se nunca tivessem existido.

O senhor se identifica com eles?

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Sim. Me considero um pouco como uma versão moderna de todos eles. Mas meu caso tem um formato mais sofisticado. No que me diz respeito, o judiciário não foi usado para fazer justiça, mas política.

A França e o Brasil passaram por uma crise diplomática em torno da questão da preservação da Amazônia, com, ao fundo, insultos lançados pelo presidente Jair Bolsonaro contra Emmanuel Macron. Como o senhor viveu esse episódio?

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Eu sempre tive excelentes relações com todos os presidentes franceses, tanto da esquerda como da direita; com Chirac, Sarkozy e Hollande. Sou solidário com Emmanuel Macron, depois dos insultos que foram endereçados à sua esposa. Foi de uma grosseria, jamais vista e isso não tem nada a ver com o povo brasileiro.

Em sua opinião, quais são as soluções para os incêndios que estão devastando a Amazônia?

O povo deve reagir. Os brasileiros devem se mobilizar e se manifestar em defesa do meio ambiente. Pois nada se pode esperar de Bolsonaro ou de seus ministros nessa questão. Devo aproveitar para lembrar que meu governo, o do Partido dos Trabalhadores, foi o que melhor cuidou da Amazônia. Foi sob meu mandato que foi criado o fundo, financiado pela Alemanha e Noruega, para proteger a floresta. Criei um plano de prevenção que ajudou a reduzir o desmatamento ilegal. Fui também o Presidente que inaugurou 114 áreas naturais protegidas no país. Cuidamos do meio ambiente e cuidamos bem.

No entanto, sob sua presidência (2003-2011) e sob a de Dilma Rousseff (2011-2016), houve muitas críticas feitas por ambientalistas. Particularmente sobre a construção da barragem de Belo Monte, na Amazônia... O PT está verdadeiramente em posição de dar lições sobre a questão da Amazônia?

Olhe, nem Deus escapa às críticas! Para um governo, é ainda mais difícil. Fizemos tudo o que era possível fazer. Belo Monte era uma necessidade para este país. Foi construída com o acordo de todas as comunidades indígenas que moravam lá. O Brasil precisava desenvolver seu potencial hidrelétrico. 80% da energia produzida pelo Brasil é limpa. Nos sentimos orgulhosos disso!

O senhor apoia a ideia, sugerida por Emmanuel Macron, de uma internacionalização da Amazônia?

Não! A Amazônia é de propriedade do Brasil. Faz parte do patrimônio brasileiro. E é o Brasil que deve cuidar dela. Não há ambiguidade nisso! O que não justifica que você seja ignorante e que a ajuda internacional não seja importante. Mas a Amazônia não pode ser um santuário para a humanidade. Ressalto que 20 milhões de pessoas vivem lá, precisam comer e trabalhar. Também devemos cuidar delas, sem deixar de levar em consideração a preservação do meio ambiente.

Após oito meses de governo, o que lhe inspira a presidência de Jair Bolsonaro?

Bolsonaro não faz nada. Ele destrói. Destrói a educação cortando o financiamento das universidades que não conseguem mais pagar bolsas de estudo. Destrói os direitos dos trabalhadores pelos quais tanto lutamos. Destrói a indústria ao privatizar as empresas brasileiras, particularmente a Petrobras – o que é um crime! É um governo de destruição, sem nenhuma visão de futuro, sem um programa, que não tem competência para exercer o poder. É por isso que Bolsonaro diz tanta bobagem, que insultou a esposa de Macron e Michelle Bachelet, que briga com Maduro ... É uma loucura total. E por trás, ele se submete totalmente a Trump. Eu nunca vi nada igual!

O "antipetismo", ou rejeição do PT, é muito forte dentre uma parte da população no Brasil. Não chegou a hora de fazer autocrítica, ou mesmo de virar uma página, criar um novo partido ou mudar seu nome?

O PT não precisa ser autocrítico. Por que autocrítica? A que respeito? O PT não deve mudar de nome, mas mudar o que está na cabeça das pessoas. A verdade é que eu teria vencido as eleições, mesmo preso, se tivesse sido autorizado pelo juiz a participar! Além disso, Fernando Haddad [candidato do PT na votação de 2018 contra Bolsonaro] ainda assim conquistou 47 milhões de votos. Não é pouco!

O PT é grande, é o partido de esquerda mais extraordinário do mundo. É um partido muito bem organizado. Ele chega em primeiro ou segundo lugar a cada eleição, e isso, há vinte anos. Então, sim, perdemos uma eleição, é verdade. Mas perder é normal em uma democracia. Nem sempre podemos vencer. No Brasil, existem muitos antipetistas, mas há também muitas pessoas que acreditam no partido e outras ainda que precisam ser convencidas.

Não haverá questionamentos de sua parte?

No Brasil, sempre tivemos pessoas com discurso ultrarreacionário vencendo as eleições: isso não é novidade. Bolsonaro é sobretudo o resultado de uma rejeição da política. Nestes momentos da história, onde a política é tão odiada, as pessoas são desencaminhadas pelo primeiro monstro que está por perto. É lamentável, mas aconteceu.

Apesar das revelações do site "The Intercept" sobre os bastidores da "Lava Jato", seus reiterados pedidos de libertação foram rejeitados ou adiados pelos tribunais. O senhor ainda tem esperança de ser libertado?

Há um pacto entre a grande mídia, os promotores e o juiz Sergio Moro [no comando da operação anticorrupção "Lava Jato", e hoje Ministro da Justiça]. Eles espalharam tantas mentiras sobre mim que não têm coragem de desfazer seu julgamento. Ainda este domingo [8 de setembro], a imprensa revelou novas informações, mostrando que Moro havia mentido ao STF. Esse tipo de comportamento, por parte de um juiz, eu não perdoo. Mas tenho certeza de que vou sair daqui, e de que um dia essas pessoas serão responsabilizadas pelo que aconteceu neste país. Continuo confiando na justiça, embora saiba que ela está submetida a várias pressões.

O senhor aceitaria o regime semiaberto? Ou cumprir sua sentença em casa, com uma pulseira eletrônica, como isso deveria lhe ser permitido a partir do final de setembro?

Não peço nenhum favor, nenhuma redução de pena. Somente justiça! Minha casa não é uma prisão. E pulseiras no tornozelo, isso é bom para os pombos-correio! Tudo o que desejo é que reconheçam minha inocência.

A sociedade brasileira está atualmente muito polarizada. O senhor não teme pela sua vida se deixar a prisão?

Uma pessoa como eu, que nasceu onde nasceu, que comeu pão pela primeira vez na vida aos 7 anos de idade, que foi dormir várias vezes sem jantar e que chegou lá onde eu cheguei, essa pessoa não pode ter medo. O Brasil é um país de paz, com um povo apegado à alegria de viver. Aqueles que tentam transformá-lo em uma nação de ódio deveriam ter vergonha!

Quero deixar a prisão e ir falar com o povo, para que volte esse gostinho de ser brasileiro. Sou um homem sem espírito de vingança, sem ódio. O ódio dá azia, dores de cabeça e nos pés! Estou bem, justamente porque me coloquei do lado da verdade. No final, ela sempre triunfa.

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