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    Estadão não lê Estadão e critica Dilma

    Enquanto os colunistas Celso Ming e José Paulo Kupfer apontam para a perda da força da inflação, na mesma edição, editorial diz que a presidente Dilma Rousseff faz discurso otimista enquanto Copom aponta o contrário

    Estadão não lê Estadão e critica Dilma
    Gisele Federicce avatar
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    247 - A direção editorial do O Estado de S.Paulo não deve ler o próprio jornal. Na edição deste sábado 20, um editorial critica a presidente Dilma Rousseff por dar "recado otimista" em relação à inflação, nesta semana, enquanto o Copom, do Banco Central, estaria apontando para o outro lado. Em seu discurso ao Conselhão, Dilma garantiu que fecharemos o ano com a inflação dentro da meta.

    Dois colunistas do próprio jornal, porém, apontam outra tese na mesma edição. "A inflação deu sinais fortes de desaceleração", destaca Celso Ming, na primeira linha de seu artigo. Segundo ele, a evolução do IPCA-15, divulgado nesta sexta-feira, "mostrou perda de força nos preços, fator que pode dar algum alento à combalida atividade econômica". O texto de José Paulo Kupfer segue a mesma linha.

    Leia abaixo o artigo de Celso Ming e o editorial do Estadão:

    A inflação perde força - Celso Ming

    A inflação deu sinais fortes de desaceleração. A evolução do Índice de Preços ao Consumidor Amplo do dia 15 (IPCA-15), divulgado ontem, mostrou perda de força nos preços, fator que pode dar algum alento à combalida atividade econômica.

    (Esse IPCA-15 é o mesmo IPCA, com a diferença de que a evolução dos preços em 30 dias não é fechada no final, mas no meio do mês: vai do dia 15 anterior ao dia 15 do mês de referência, aproximadamente.)

    Ainda se nota algum efeito artificial, digamos assim. Um dos itens que mais contribuíram para a redução da inflação foi a retirada dos reajustes nas tarifas dos transportes coletivos nas grandes cidades, atraso que ainda deve provocar certa distorção. Em todo o caso, o recuo no mês foi bastante expressivo, de 0,55%.

    A desaceleração também foi puxada pela redução dos preços dos alimentos (-0,18%, no mês, e +11,6% em 12 meses), em consequência da queda das cotações das commodities.

    Em contraposição, permanece substancial o avanço dos preços no setor de serviços, de 0,69% em junho e de 8,6% em 12 meses. Já nas despesas com habitação, a alta foi de 0,60% em junho, embora em 12 meses tenha sido bem mais baixa (3,1%). A inflação também se mantém espalhada demais, na medida em que o índice de difusão (número de itens da cesta de consumo em alta) continua elevado (55,5%).

    Como o Banco Central deixou claro na Ata do Copom divulgada quinta-feira, as atenções agora se voltam para o efeito sobre a inflação que começa a ser provocado pelo repasse do avanço das cotações do dólar no câmbio interno, de cerca de 10% em dois meses.

    Esse não é o único fator que pressiona em direção ao aumento dos preços. Como também foi enfatizado pela Ata, a inflação está sendo alimentada pela política fiscal (receitas e despesas do governo) insuficientemente austera, que vem exigindo demais da política de juros, e pelo ainda forte aquecimento do mercado de trabalho.

    É cedo para afirmar que a desaceleração levará o Banco Central a reduzir a dose da alta dos juros básicos (Selic). Não dá para dizer que o aperto de 1,25 ponto porcentual desde abril para o atual nível de 8,5% ao ano já esteja contribuindo para o arrefecimento da inflação, porque a política de juros leva de seis a nove meses para produzir efeito. Além disso, é preciso ver o que acontecerá nos próximos meses. O mercado, cujas projeções são aferidas pela Pesquisa Focus, do Banco Central, aponta para uma inflação anual próxima de 5,8% em 2013, nível ainda elevado demais quando confrontado com a meta de 4,5%.

    Além disso, a principal tarefa do Banco Central, no momento, é voltar a conduzir as expectativas, prerrogativa prejudicada pela política monetária voluntarista que perdurou de agosto de 2011 a março deste ano. Nesse sentido, o Banco Central não pode correr o risco de aliviar prematuramente sua política, especialmente se o governo também desistir de cumprir sua meta de superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), de 2,3% do PIB.


    O Copom destoa de Dilma - editorial

    A inflação continuará acima da meta em 2013 e o Banco Central (BC) manterá a política de aperto para frear e conduzir a alta de preços ao nível desejado, segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada quinta-feira passada. Oito dias antes o comitê havia elevado os juros básicos de 8% para 8,5% ao ano. Em pontos muito importantes, o texto repete a ata da reunião anterior, mencionando inflação elevada e resistente e apresentando uma longa lista de fatores de risco - incluídas as contas públicas - para justificar a "continuidade do ritmo de ajuste das condições monetárias".

    Na quarta-feira, numa arenga em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, a presidente havia descrito a inflação brasileira como um fenômeno de "caráter cíclico sazonal". É difícil dizer de onde ela tirou essa espantosa confusão entre sazonalidade e processo inflacionário. Mas um ponto é certo: ela se esqueceu de combinar com os dirigentes do BC o recado otimista sobre os preços e sobre a situação das contas fiscais.

    Em seu discurso, a presidente mencionou a inflação nove vezes, num esforço para tranquilizar a opinião pública - ou os formadores de opinião? - e criticar quem fala em descontrole dos preços e das finanças públicas. A ata da reunião do Copom já deveria estar pronta nessa altura.

    Talvez por isso, ou porque nenhuma pessoa responsável pudesse levar a sério a peroração presidencial, a ata descreve o balanço do setor público, nos parágrafos 22 e 30, como "em posição expansionista".

    Pelo menos desde o ano passado os documentos do BC têm apontado os resultados fiscais como componentes importantes do quadro inflacionário. O desajuste das contas públicas favorece o descompasso entre a demanda e a oferta de bens e serviços. Além disso, a gestão das finanças do governo afeta a avaliação econômica e as expectativas em relação aos preços. Os autores das atas têm repetidamente batido nesses pontos.

    Além disso, o documento repete a lista costumeira de fatores inflacionários: a expansão do crédito, a "estreita margem de ociosidade no mercado de trabalho", os aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade e os mecanismos remanescentes de indexação. O texto menciona, também, os efeitos de curto prazo da valorização do dólar.

    Todos esses fatores são bem conhecidos e têm sido apontados no dia a dia por analistas independentes. Não há, na análise formulada pelo pessoal do Copom, nenhum elemento surpreendente ou fora do comum, com exceção, talvez, de um detalhe.

    Ao contrário de altos funcionários do governo e de alguns especialistas do mercado, os economistas do BC parecem imunes ao otimismo gerado, em alguns meios, pelo recuo de alguns indicadores de preços. Esse aparente pessimismo é um bom sinal. A persistente inflação brasileira é um fenômeno bem mais complexo que a oscilação de alguns preços, mesmo alguns muito importantes, como os dos alimentos.

    Embora os autores da ata mencionem alguns preços ou grupos de preços, como as cotações das commodities, a maior parte de sua análise se concentra nos fatores determinantes da demanda, como o crédito, a renda dos consumidores e o resultado das contas públicas. Seu critério, portanto, é exatamente oposto ao da presidente: fatores sazonais podem produzir efeitos de curto ou curtíssimo prazo, mas a inflação depende de outras variáveis.

    A ata do Copom também chama a atenção para a importância das expectativas. O texto menciona "informações recentes" sobre a retomada do investimento e a continuidade do consumo privado, mas acrescenta uma ressalva: para preservar essa tendência positiva, o governo terá de reverter a perda de confiança dos empresários e das famílias. A piora das expectativas tem sido apontada por pesquisas com executivos e consumidores.

    Para mudar esse quadro, a presidente continua apostando numa retórica mal ajambrada e em gestos improvisados, como a proposta de plebiscito e a imposição de serviço obrigatório aos médicos.

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