Na Rede Globo a Bahia é branca
Nas semanas que antecederam a estreia de Segundo Sol, a nova novela principal da casa, por algum despertar ainda inexplicado, o Movimento Negro conseguiu articular uma reação rumorosa à ausência quase completa de personagens e atores negros numa história sobre axé music ambientada na Bahia; é o mesmo que já aconteceu em dezenas de novelas com sotaque baiano ou nordestino, mas desta vez não passou batido
Pedro Alexandre Sanches, Portal Vermelho - Nas semanas que antecederam a estreia de Segundo Sol, a nova novela principal da casa, por algum despertar ainda inexplicado, o Movimento Negro conseguiu articular uma reação rumorosa à ausência quase completa de personagens e atores negros numa história sobre axé music ambientada na Bahia.
É o mesmo que já aconteceu em dezenas de novelas com sotaque baiano ou nordestino, mas desta vez não passou batido.
Chefões globais tiveram de se explicar, e se embananaram. O diretor-geral da casa, Carlos Henrique Schroeder, afirmou em entrevista que a Globo investe, sim, em elencos negros, e citou como exemplo a novela Lado a Lado (2012) – justamente uma história sobre o final da era de escravização oficial no País, como gostariam de demonstrar os antirracistas.
"Isso tem que vir naturalmente", socorreu-o o diretor-geral da nova novela, Dennis Carvalho, o mesmo que em 2015 escalou para a novela Babilônia um elenco com forte presença negra. Babilônia foi amplamente rejeitada pelo público, e o fracasso foi atribuído a um romance com beijo na boca entre as personagens vividas pelas atrizes Fernanda Montenegro e Nathalia Thimberg.
Agora, a axé music embranquecida de Segundo Sol rendeu à Globo a melhor primeira semana de uma novela desde 2014. A história que a antecedeu, O Outro Lado do Paraíso, também contou com altos índices de audiência e de branquitude. Na semana final, uma vilã pálida e loira teve como punição definitiva o encarceramento numa cela em que todas as demais presas eram negras e carrancudas.
Na quarta-feira 16, já com Segundo Sol no ar, a militante negra, cantora e compositora carioca e deputada estadual por São Paulo Leci Brandão promoveu, na Assembleia Legislativa, um debate sobre o voto negro em 2018, e o assunto do racismo global veio à tona."Há muitos anos escrevi um negócio chamado Eu Quero uma Novela Negra no Ar, mas nunca consegui concluir essa música", contou Leci.
Durante o encontro promovido por Leci, a socióloga negra Mariana Anto-niazzi apresenta os resultados da pesquisa Afrodescendentes & Política, realizada pelo Painel BAP. Ela cita que 54% dos brasileiros se autodeclaram pretos ou pardos e que 77% afirmam não se sentir representados pelas marcas e propagandas.
Num recorte de 1.067 eleitores afrodescendentes paulistanos, 35% declararam trabalhar com carteira assinada e 30% disseram não se identificar com nenhum presidenciável. “Essa pesquisa é tão importante que tinha que ser noticiada no horário nobre de uma tevê que tivesse coragem, qualquer uma do quinteto da mídia que manda no País e não tem nada a ver com a gente”, provoca Leci.
“A boa notícia é que estão acontecendo mudanças. A população não está mais se calando. Como uma novela feita na Bahia, onde 75% da população se declara negra ou parda, não tem nem pelo menos um núcleo negro?”, indaga Mariana.
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