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Cavalo de Troia à francesa? A iniciativa de Emmanuel Macron de sabotar a reunião do BRICS

Se confirmada, a iniciativa de Macron representará uma das manobras diplomáticas mais inesperadas por parte do Ocidente em relação ao grupo BRICS

Macron discursa ao tomar posse para o segundo mandato (Foto: Reuters/Ag.Brasil)
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Valdir da Silva Bezerra, Sputnik - Alguns relatos da mídia francesa apontam que o presidente Emmanuel Macron gostaria de participar da próxima reunião do BRICS, marcada para agosto na África do Sul.

Se confirmada, a iniciativa de Macron representará uma das manobras diplomáticas mais inesperadas por parte do Ocidente em relação ao grupo BRICS. Nesse caso, estaríamos diante de uma espécie de "Cavalo de Troia" à francesa?

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Primeiro de tudo, em se tratando de BRICS depositar algum tipo de confiança em Emmanuel Macron nesse momento é bastante arriscado. Vale lembrar que, na última reunião do G7 ocorrida no Japão em maio, a França cedeu seu avião presidencial para levar ao evento o presidente ucraniano Vladimir Zelensky.

A ideia era fazer com que a presença de Zelensky no local pudesse de algum modo pressionar Estados neutros como o Brasil e a Índia (dois dos membros do BRICS que também compareceram às reuniões) a tomarem o lado do Ocidente com relação ao conflito na Ucrânia. A França, como membro original do grupo G7, também endossou a declaração final da cúpula, cujo teor mostrou-se claramente antirrusso.

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O BRICS, por sua vez, tem se mostrado firme no sentido de não ceder à pressão Ocidental em sua nova cruzada contra a Rússia, apelando à comunidade internacional para que se criem condições para um acordo de paz no Leste Europeu.

O interesse de Macron em participar de algum modo da reunião do BRICS em agosto, portanto, poderá refletir a mesma linha adotada por Olaf Scholz, de induzir a que países como Brasil, Índia e África de Sul colaborem com o esforço de guerra dos países ocidentais contra a Rússia, o que constitui um verdadeiro absurdo por si só.

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Mas as diferenças entre os interesses da França e do BRICS não terminam por aqui. Os países do BRICS há tempos têm advogado pela necessidade da desdolarização do comércio internacional, ou seja, pelo estabelecimento de trocas bilaterais em suas próprias moedas locais. A França, por sua vez, faz parte da zona do euro, segunda moeda mais influente do sistema atualmente.

Como um dos carros-chefes por trás do projeto de integração europeia, juntamente da Alemanha, é difícil imaginar que os franceses apoiariam iniciativas de comércio internacional que não se baseiem em moedas tradicionais como o dólar e o euro.

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Além do mais, no plano cultural a França é um dos países-núcleo da civilização ocidental, cuja filosofia baseia-se na crença da "universalidade" de seus valores e ideais. Portanto, os franceses acreditam que o individualismo liberal e a economia de livre mercado (preferencialmente desregulada) devem ser a base para o desenvolvimento das nações, sem levar em conta as especificidades locais de cada civilização.

Em verdade, o próprio termo "desenvolvimento" tem sido historicamente usado para implicar um tipo de movimento em direção aos sistemas ocidentais de gestão da economia e de governo e até mesmo em direção a um estilo de vida similar ao dos países assim chamados "avançados".

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Contudo, não há um caminho único para o desenvolvimento, como já foi provado por Estados como Rússia, Índia e China. Não obstante, o BRICS também simboliza uma iniciativa política que visa defender regras mais justas para o desenvolvimento global, de maneira que o poder decisório nas instituições de tomada de decisão (como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional) dominadas pelo Ocidente possa refletir adequadamente a crescente importância dos países emergentes no sistema.

Nesse quesito, qualquer que seja o princípio de justiça distributiva do poder internacional adotado pela França, ele é certamente diferente do conceito adotado pelos países do BRICS. A própria natureza da posição hierárquica da França (como membro do G7 e do Conselho de Segurança da ONU) a impele a defender o "status-quo" em prejuízo das nações menos privilegiadas do mundo.

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Ora, o foco da 15ª Cúpula do BRICS na África do Sul deverá ser justamente sobre questões de reforma da governança global, tocando em pontos como a necessidade de diminuir a sobrerrepresentação ocidental (e sobretudo europeia) em instituições como o Banco Mundial e o FMI, por exemplo.

No mais, é preciso observar que hoje testemunhamos um crescente interesse de diversos Estados – principalmente do Sul Global – por se juntarem ao BRICS, entre eles a Argélia, que vivenciou uma complicada experiência de colonização francesa por mais de um século.

Afinal, como a Argélia e outros países do Mundo Muçulmano (também interessados em participar do BRICS) enxergariam a presença do líder francês na próxima reunião do grupo? Justo a França, que juntamente dos demais países ocidentais, tem se engajado em uma verdadeira política de imperialismo cultural pelo mundo afora.

Outro fator importante a se ter em consideração é que a França não é um país que conduz sua política externa de forma totalmente independente. Se em meados da década de 1960, Charles de Gaulle chegou até mesmo a retirar tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte de seu território por desacordar com as políticas da aliança, a França atual foi um dos países que mais participou de intervenções da OTAN no Norte da África e no Oriente Médio.

Um desses exemplos foi o calamitoso bombardeio da Líbia em 2011 pela Aliança Atlântica, que culminou na queda de Muammar Kadhafi e na derrocada da Líbia para uma condição de caos político e econômico que já dura anos.

Os países do BRICS, por sua vez, são críticos da intervenção desastrosa dos países ocidentais em assuntos domésticos de outros Estados, encobertas por seus discursos pseudo-humanitários.

A diferença, portanto, entre as duas abordagens é como da água para o óleo. Por fim, muito embora Macron possa reconhecer em alguma medida as implicações geopolíticas por trás do fortalecimento do BRICS, seu envolvimento com o grupo visa salvaguardar apenas e simplesmente os interesses do Ocidente no sistema internacional.

Afinal, a França, como membro fundador do G7 e como partícipe ativo da coalização ocidental hoje em confronto aberto com a Rússia, não se vê interessada em estabelecer nem sequer um equilíbrio de poder estável no próprio continente em que se encontra, quanto mais no mundo. Que confiança mereceria Macron em uma situação como essas? A resposta parece um tanto óbvia.

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