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Mundo

CIA transformou o Afeganistão em um narco-estado falido, diz Alan MacLeod

No último ano, o cultivo de papoulas de ópio afegão cresceu em mais de um terço, enquanto as operações contra-narcóticos caíram num abismo

(Foto: ZOHRA BENSEMRA / REUTERS)
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Artigo de Alan MacLeod* originalmente publicado no Mint Press News em 25/09/22. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

Geopolítica, lucro e papoulas: 

Como a CIA transformou o Afeganistão em um narco-estado falido

A pandemia do COVID-19 tem sido a sentença de morte para tantas indústrias no Afeganistão. Até as organizações de caridade e as agências de ajuda advertiram que o deslocamento econômico poderia provocar a fome generalizada. Mas, há um setor que ainda está efervescente: o comércio ilícito do ópio. No último ano, o cultivo de papoulas de ópio afegão cresceu em mais de um terço, enquanto as operações contra-narcóticos caíram num abismo. Se diz que o país é a fonte de mais de 90% do total do ópio ilícito no mundo, do qual são fabricados a heroína e outros opióides. Há mais terras de cultivo de ópio no Afeganistão do que as que são usadas para a produção de coca em toda a América Latina – sendo que se diz que a criação da droga emprega diretamente cerca de meio milhão de pessoas.

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Isto fica muito longe dos anos de 1970, quando a produção de papoulas era mínima e, na sua maior parte, era usada para consumo dentro do país. Mas isto mudou em 1979, quando a Operação Ciclone da CIA, o amplo financiamento das milícias de Mujahideen afegãos, numa tentativa de sangrar totalmente a então recente invasão soviética. Durante a década seguinte, a CIA trabalhou intimamente com os seus homólogos paquistaneses, o ISI, para injetar US$ 2 bilhões em armamentos e assistência a estes grupos – incluindo o agora infame Osama Bin Laden e outros senhores da guerra conhecidos por tais atrocidades, como jogar ácido no rosto de mulheres que não usam véus.

“Das declarações feitas pelo [então] embaixador dos EUA no Irã, Richard Helms, havia pouca produção de heroína na Ásia Central em meados dos anos de 1970”, disse ao MintPress o Professor Alfred McCoy, autor do livro 'The Politics of Heroin: CIA Complicity in the Global Drug Trade'. Porém, com o início da guerra secreta da CIA, surgiu a produção de ópio ao longo da fronteira Afeganistão-Paquistão e, logo, as refinarias pontilharam a paisagem. Caminhões carregados de armas pagas pelos contribuintes estadunidenses viajavam do Paquistão aos seus vizinhos à oeste, voltando cheios até as bordas com ópio para novas refinarias – com o seu mortífero produto terminando por chegar às ruas do mundo todo. Com o influxo do ópio afegão nos anos de 1980 – alega Jeffrey St. Clair, co-autor do livro 'Whiteout: The CIA, Drugs and the Press' – o vício à heroína mais do que se duplicou nos EUA.

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“A fim de financiar a resistência por um período prolongado, os Mujahideen tiveram que inventar um modo de sustento que fosse além das armas que a CIA estava fornecendo”, disse McCoy, assinalando que as armas fornecidas não conseguiam alimentar as famílias dos combatentes, nem de reembolsá-los pelo trabalho perdido.

“Então, o que os combatentes da resistência fizeram foi apelar ao ópio. O Afeganistão produzia cerca de 100 toneladas de ópio nos anos de 1970. No final daquele período de 10 anos da operação da CIA, em 1989-1990, aquela quantidade mínima de ópio – 100 toneladas por ano – se tornou uma quantidade maior de 2.000 toneladas por ano e já era cerca de 75% do comércio ilícito de ópio no mundo.” 

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A CIA atingiu a sua meta de dar à URSS o seu Vietnã – com os soviéticos fracassando no esmagamento da rebelião dos Mujahideen até que eles [os soviéticos] finalmente se retiraram [do Afeganistão] em 1989. Mas o dinheiro e os armamentos dos EUA também fizeram do Afeganistão um lugar perigosamente instável, cheio de facções em guerra que usaram o ópio para financiar as suas batalhas pela supremacia interna. Em 1999, a produção anual havia atingido 4.600 toneladas. Ao final das contas, os Talibãs emergiram como a força dominante no país e tentaram ganhar legitimidade ao acabar com o comércio de ópio.

Eles tiveram um notável sucesso nisso. Uma proibição ao cultivo de ópio decretada pelo governo liderado pelos Talibãs no ano de 2000 levou a uma queda quase imediata para apenas 185 toneladas colhidas no ano seguinte – à medida que os camponeses amedrontados preferiram não se arriscar a atrair a atenção deles.

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Os Talibãs haviam esperado que o programa de erradicação teria recebido a aprovação de Washington e seduziria os EUA a prover ajuda humanitária. Infelizmente, no entanto, a história teve outros contornos. Em 11 de setembro de 2001, os EUA vivenciaram um caso massivo de contragolpe, quando as forças de Bin Laden lançaram ataques em Nova York e Washington. Os EUA ignoraram a oferta dos Talibãs de entregá-lo a uma terceira parte, preferindo, ao contrário, invadir o país. Menos de um mês depois que os aviões atingiram o World Trade Center, as tropas dos EUA estavam patrulhando os campos do Afeganistão.

O primeiro verdadeiro narco-estado do mundo

O efeito da ocupação foi a expansão da produção de drogas, até atingir novas proporções sem precedentes; segundo a estimativa do Professor McCoy, o Afeganistão se tornou o primeiro verdadeiro narco-estado do mundo. McCoy assinala que, em 2008, o ópio era responsável por bem mais do que a metade do PIB do país. Em comparação, mesmo nos dias mais obscuros da Colômbia, a cocaína totalizava apenas 3% do seu PIB.

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Atualmente, a ONU estima que cerca de 6.300 toneladas de ópio (e crescendo) são produzidas anualmente, ocupando uma área de mais de 550 mil acres – uma área quase do tamanho do estado de Rhode Island (EUA) – plantados com campos de papoulas.

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Fonte: Dyfed, Loesche| Statista. Afeganistão: Potencial de Produção de Ópio Aumenta Significativamente. Terras cultivadas com papoulas de ópio e o potencial de produção de ópio no Afeganistão. Barras em verde: Campos plantados (em hectares) / Pontos em preto: Potencial de produção (em toneladas métricas)(Photo: Reprodução)

Porém, mesmo enquanto estavam financiando uma campanha de pulverização aérea massiva e mortífera na Colômbia, os EUA se recusaram a replicar a mesma política no Afeganistão. “Nós não podemos estar numa situação na qual nós removemos a única fonte de renda das pessoas que vivem no segundo país mais pobre do mundo, sem sermos capazes de provê-las com uma alternativa”, disse o porta-voz da OTAN, James Appathurai.

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No entanto, nem todos concordaram que um compromisso apaixonado de defender a qualidade de vida dos mais pobres fosse a verdadeira razão para rejeitar esta política. Um dos céticos é um ex-capitão do Corpo de Fuzileiros (Marine Corps) dos EUA Matthew Hoh. Hoh disse ao MintPress que a fumigação aérea não foi feita porque estaria fora do controle das autoridades do governo afegão – as quais estavam profundamente envolvidas no comércio de drogas – eles próprios sendo proprietários de campos de papoulas e de fábricas de produção [de ópio]. “Eles temiam que, se optassem pela erradicação aérea, os pilotos dos EUA erradicariam tudo ao seu bel prazer e muitos dos seus próprios campos de papoulas seriam atingidos”. Em 2009, Hoh pediu demissão do seu posto no Departamento de Estado dos EUA na Província de Zabul (Afeganistão) em protesto contra a continuação da ocupação do Afeganistão pelo governo dos EUA. Ele declarou o seguinte ao MintPress:

“As forças militares da OTAN estavam mais ou menos montando guarda dos campos de papoulas e da produção de ópio, sob o disfarce de estar fazendo ações de contra-insurgência. A lógica deles era 'nós não queremos tirar o sustento das pessoas'. Porém, na verdade, o que nós estávamos fazendo era proteger a riqueza dos nossos amigos que estavam no poder no Afeganistão.”

Segundo Hoh, havia uma desilusão geral entre os soldados, os quais tinham que arriscar as suas vidas diariamente. “O que nós estamos fazendo aqui? Isso é bobagem (bullshit)” - este era um sentimento comum dentre os soldados estadunidenses.O comércio de heroína envolvia praticamente todos os que estavam no poder, incluindo Ahmed Wali - irmão do presidente afegão Hamid Karzai – entre os maiores e mais notórios chefões das drogas no sul do país, um homem amplamente conhecido por ser pago pela CIA.

As tentativas dos EUA de bloquear o comércio de ópio – como a política de pagar milícias domésticas para destruírem campos de papoulas – frequentemente eram tiros que saíram pela culatra, como abster-se de plantar em uma área, coletar grandes quantidades de dinheiro das forças de ocupação e usar aquele dinheiro para plantar em outro lugar; efetivamente, ser pagos tanto para plantar, quanto para não plantar. Pior que isto, os donos da guerra locais e os chefes das drogas destruíam as colheitas dos seus rivais e coletavam dinheiro dos EUA para fazer isto, de modo a enriquecê-los e de ficar em uma posição mais forte do que antes, tendo recebido o beneplácito das forças da OTAN.

Um exemplo notável disso é o homem-forte local Gul Agha Sherzai, que erradicou as colheitas dos seus competidores na Província de Nangarhar (enquanto deixando silenciosamente intocada a sua própria, na Província de Kandahar). Porém, tudo o que os EUA viram foi um político local aparentemente comprometido a eliminar o comércio ilegal de drogas. Assim sendo, eles o inundaram de dinheiro e outros privilégios. “Nós, literalmente, demos a este cara US$ 10 milhões em espécie para liquidar a sua concorrência”, disse Hoh. “Se você fosse escrever o roteiro de um filme sobre isso, eles diriam 'Isto é improvável demais. Ninguém vai acreditar nisso. Nada é tão insano ou tão estúpido’. Mas esta é a maneira como as coisas são”.

McCoy assinalou que os Talibãs estavam dentre os primeiros beneficiários do comércio de drogas e eles usaram isso para aumentar o seu poder e vencer os EUA:

“A expansão da produção de ópio e o fracasso dos EUA em refreá-la, proveram o grosso do financiamento para os Talibãs – que capturaram uma porção significativa, porém desconhecida, dos lucros locais do tráfico de drogas, o que eles usaram para financiar as operações de guerrilha nos últimos 20 anos, tornando-se assim um fator determinante da derrota dos EUA no Afeganistão”.

'A agulha e o dano feito'

Não é particularmente difícil cultivar o ópio. As papoulas de ópio florescem em condições quentes e secas, longe da umidade e do vento. Consequentemente, elas encontraram um lar fértil em boa parte da Ásia central e ocidental. A planta prosperou no Afeganistão, especialmente nas províncias do sul como Helmand, próximo ao ponto tríplice de fronteiras onde o Afeganistão se encontra com o Paquistão e o Irã. Uma grande parte do sistema de irrigação em Helmand foi subscrito pela USAID (United States Agency for International Development) – uma organização que age como a frente pública da CIA. Quando em plena floração, os campos de papoulas são espetaculares, com belas flores com vibrantes cores rosa, vermelha ou branca. Debaixo das flores, se encontra uma grande vagem de sementes. Os camponeses colhem estas vagens, drenando-as de uma seiva que se torna uma resina quando seca. Isto frequentemente é transportado para fora do país através da chamada “Rota Sul”, via o Paquistão ou o Irã. Porém, como ocorre em qualquer encanamento, muito do produto é derramado no caminho, causando uma epidemia de adição em toda a região.

O efeito disso na população afegã não tem sido qualquer coisa a menos do que um desastre. Entre 2005 e 2015, o número de adultos usando drogas pulou de 900 mil para 2,4 milhões – segundo a ONU, que estima que quase um em cada três domicílios são afetados pela adição ao ópio. Conquanto o Afeganistão também produza quantidades copiosas de maconha e metanfetamina, os opióides são as drogas de escolha da maioria, com cerca de 9% da população adulta (e um número crescente de crianças) viciadas neles. Adicionados a isso, houve um pico de casos de HIV, à medida que os usuários compartilham as agulhas – conforme declarou ao MintPress o Professor Julien Mercille, autor do livro “Cruel Harvest: U.S. Intervention in the Afghan Drug Trade”. 

Contribuindo mais ao desespero, foram os 20 anos de guerra e a ocupação dos EUA. O número de afegãos vivendo na pobreza aumentou de 0,1 milhões em 2007 para 19,3 milhões em 2016. Uma pesquisa recente conduzida pelo Gallup revelou que os afegãos são as pessoas mais tristes do mundo, com quase nove em cada dez entrevistados dizendo que estão “sofrendo” e zero por cento da população declarando-se como “prosperando” - nas palavras dos próprios pesquisados. Quando solicitados a classificar as suas vidas em uma escala de dez, os afegãos deram uma média de resposta de 2,7 pontos – um escore recorde mais baixo do que qualquer outro país pesquisado. Pior ainda, quando solicitados a predizer a sua qualidade de vida nos próximos cinco anos, a resposta média foi mais baixa ainda: 2,3 pontos.

Os efeitos da operação da CIA para sangrar os soviéticos até o fim no Afeganistão também produziram uma crise humanitária no vizinho Paquistão. Como McCoy assinalou, no final dos anos de 1970 o Paquistão quase não tinha viciados. Porém, em 1985, as estatísticas do governo paquistanês registraram mais de 1,2 milhões, transformando as duas nações no “epicentro global do comércio de drogas” quase da noite para o dia.

O problema só fez aumentar desde então. Um relatório da ONU de 2013 estimou que quase 7 milhões de paquistaneses usam drogas, com 4,25 milhões precisando de tratamento urgente para problemas de dependência. Quase 2,5 milhões destas pessoas estavam abusando de heroína ou outros opióides. Cerca de 700 pessoas morrem de overdoses a cada dia. Não surpreendemente, a taxa mais alta de dependência ocorre nas províncias da fronteira afegã, onde a heroína é fabricada. O mesmo estudo assinala que 11% das pessoas na província do noroeste de Khyber Pakhtunkhwa usam substâncias ilícitas – basicamente heroína.

Obviamente, a crise das drogas também é uma crise médica, com os sobrecarregados hospitais públicos cheios de pessoas com doenças relacionadas com as drogas. O estigma social da adição separou violentamente famílias, enquanto o dinheiro e o poder que as drogas ilícitas trouxeram transformou muitas cidades em focos de violência.

O Irã tem um número similar de usuários de opióides, geralmente estimados entre dois e três milhões. Nas cidades próximas à fronteira afegã/paquistanesa, um grama de ópio pode ser comprada por trocado – entre 25 e cinquenta centavos. Assim sendo, apesar da penalidades extremamente duras nos livros oficiais pela posse e distribuição de drogas, o país tem a taxa mais alta de adição no mundo.

Num nível micro, a adição rompe as famílias e arruína vidas. No entanto, numa escala internacional a explosão do ópio colocou uma região inteira sob uma tensão significativa. Assim sendo, uma consequência da política dos EUA no Oriente Médio – desde apoiar os jihadistas até ocupar nações – tem sido desencadear uma adição mundial ao ópio que tornou umas poucas pessoas fantasticamente ricas e destruiu as vidas de dezenas de milhões.

Desespero doméstico

A explosão na produção também levou a um desastre mundial. Na década passada, as mortes relacionadas com opioides aumentaram em 71%, segundo as Nações Unidas. Muito do produto cultivado pelos senhores da guerra afegãos acaba chegando nas ruas ocidentais. “Eu não vejo como isso pode ser uma coincidência, que você tenha um crescimento explosivo na produção de papoulas na Afeganistão e depois você tem uma epidemia mundial de opióides” - declarou Hoh, uma conexão que levanta a questão de se os usuários em Berlim, Boston, ou no Brasil devam ser vistos como vítimas da guerra no Afeganistão tanto quanto o são os soldados caídos. Sendo assim, os números seriam assombrosos. Cerca de 841 mil estadunidenses morreram de overdoses de drogas desde o início da guerra no Afeganistão, incluindo mais de 70 mil somente em 2019. A maioria destas mortes envolveram opióides.

Oficialmente, o DEA (Drug Enforcement Agency) alega que essencialmente todos os opióides ilícitos que entram nos EUA são cultivados na América Latina. No entanto, Hoh considera isto pouco convincente. “Quando verifica a própria informação deles e os seus relatórios sobre a extensão de terras usadas para a produção de opióides ilícitos no México e na América do Sul, fica claro que não há produção suficiente no hemisfério ocidental para atender a demanda por opióides ilícitos nos EUA”, disse ele ao MintPress.

Uma história suja

O governo dos EUA tem uma longa história de se envolver diretamente com o comércio mundial de narcóticos. Na Colômbia, eles trabalharam com o presidente Álvaro Uribe numa guerra nacional às drogas, ainda que documentos internos dos EUA o identificaram como um dos traficantes de drogas mais importantes da nação, um empregado do infame Cartel de Medellín e um “íntimo amigo pessoal” do chefão das drogas Pablo Escobar. Os lucros das operações de drogas financiaram as campanhas eleitorais de Uribe em 2002 e 2006.O General Manuel Noriega também foi um aliado-chave dos EUA. Durante muitos anos, o panamenho estava na folha de pagamento da CIA – apesar de Washington saber que ele estava envolvido no tráfico de drogas pelo menos desde 1972. Pouco mudou quando ele se tornou o ditador de facto do Panamá em 1984. Mas o diretor da DEA inicialmente o elogiou pela sua “vigorosa política anti-tráfico de drogas”. No entanto, ao final, os EUA decidiram invadir o país e capturar Noriega, condenando-o a 40 anos numa prisão federal estadunidense por crimes cometidos, na sua maioria, enquanto ele estava sendo pago pela CIA.Ao mesmo tempo em que isto estava ocorrendo, o jornalista investigativo Gary Webb expôs como a CIA ajudar a financiar a sua guerra suja contra o governo esquerdista da Nicarágua através das vendas de crack de cocaína para as comunidades negras em todos os EUA, ligando os exércitos paramilitares de extrema direita com os chefões das drogas nos EUA, como Rick Ross.

Até hoje, o governo dos EUA continua a apoiar o homem-forte hondurenho Juan Orlando Hernández, apesar das conexões comprovadas do presidente com o comércio de drogas. Mais cedo neste ano, um tribunal dos EUA sentenciou o irmão de Hernández, Tony, à prisão perpétua por contrabando internacional de drogas, enquanto o próprio Juan foi considerado como um co-conspirador não indiciado no caso. No entanto, o presidente Hernández provou ser eficaz na supressão da esquerda anti-imperialista dentro do seu país e por concretizar o golpe militar de 2009 apoiado pelos EUA – uma razão pela qual é improvável que ele tenha que enfrentar acusações no futuro próximo

O impacto humanitário da Guerra do Ópio foi assombroso. Até 1880, os britânicos estavam inundando a China com mais de 6.500 toneladas de ópio a cada ano – o equivalente a muitos bilhões de doses –, causando deslocamentos sociais e econômicos massivos, à medida que a China lutava para lidar com uma adição aleijante espalhada por todo o império. Atualmente, muitos chineses ainda se referem àquela era como “o século da humilhação”. Também na Índia e no Paquistão, o efeito não foi menos dramático – à medida que os colonialistas forçaram os camponeses a plantar campos de papoulas não-comestíveis (e, mais tarde, o chá), ao invés de colheitas de comestíveis de subsistência, causando ondas de enormes de fome em uma frequência que jamais havia sido vista antes.

Milhões de perdedores

A história é muito mais cheia de nuances do que o têm algumas teorias de conspiração do tipo “a CIA controla o mundo das drogas”. Não há soldados estadunidenses carregando carretas afegãs com ópio. No entanto, é sabido que muitos comandantes são conhecidos por empoderar os senhores da guerra que o fazem. “Os militares dos EUA e a CIA têm uma grande responsabilidade pela explosão da produção de ópio no Afeganistão”, disse o Professor Mercille, explicando:

“Depois de 11/09/01 [atentados às torres-gêmeas de New York], basicamente eles se aliaram com muitos homens-fortes e lordes da guerra que estavam envolvidos de alguma maneira na produção e no tráfico de drogas. Estes indivíduos estavam atuando como aliados locais dos EUA e da OTAN e, por isso, eram muito protegidos contra retribuições ou prisões por tráfico de drogas, porque eles eram aliados dos EUA.”

Do campo, a guerra no Afeganistão se parecia muito com a guerra às drogas na América Latina e campanhas coloniais prévias na Ásia, com a rápida militarização da área e o empoderamento de elites locais maleáveis – o que começou imediatamente a defraudar os lucros massivos que desaparecem silenciosamente em buracos negros. Neste ínterim, milhões de pessoas pagam o preço, sofrendo dentro de uma zona de morte militarizada e recorrendo às drogas como um mecanismo de enfrentamento. Na história da explosão do ópio há poucos vencedores, mas há milhões de perdedores.

* Alan MacLeod é Escritor Sênior da Equipe do MintPress News. Depois de completar o seu PhD em 2017, ele publicou dois livros: 'Bad News From Venezuela: Twenty Years of Fake News' e 'Propaganda in the Information Age: Still Manufacturing Consent', bem como uma quantidade de artigos acadêmicos. Ele também contribuiu com a FAIR.org, The Guardian, The Greyzone, Jacobin Magazine e CommonDreams.

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